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Os selvagens não sabem o que é cantar.
Eles apenas cantam.
Os selvagens não conhecem o que é aprender.
Eles apenas sabem.
Os selvagens não entendem o que é querer.
Eles apenas podem.
Os selvagens não seguem nenhuma crença.
Eles apenas caminham.
Os selvagens não compreendem nada sobre o universo.
Eles apenas existem.
Nós passamos a vida passando.
Eles passam a vida vivendo.
(Leandro Marshall)
Lembro-me de um filme que vi há muito anos, um filme francês no qual o personagem principal, um perfumista, foge de sua vida em Paris. Ele é um gênio em perfumes e sua mulher, uma chata, cuida da parte comercial. Ele vai para a América Latina e se torna feirante. Resolve romper com o ciclo de desgosto de uma vida que não era a que ele queria viver.
Romper uma vida de desgosto talvez seja o maior dos sonhos, claro, para quem não morre de fome. Nosso selvagem dá sorte e ganha a Catherine Deneuve como nova mulher. Maravilhas do cinema.
O que me marcou naquele filme foi a coragem do protagonista de abandonar uma vida que detestava. Acho que esse é um desafio para qualquer um que queira ter uma vida menos idiota. Para tal, é necessário olhar a vida como ela é ao invés de se enganar e enganar os outros. O nome desse filme é O selvagem.
Outra referência que me marcou sobre o significado de ser selvagem na filosofia foi o personagem “o Selvagem” do grande romance Admirável mundo novo, de Aldous Huxley. O personagem irrompe no admirável mundo científico da felicidade programada. Sua trajetória, infeliz, é aquela da tragédia da liberdade num mundo obcecado pelo progresso científico da vida feliz: é destruído. Este é o mundo em que vivemos: povoado por idiotas que comandam o mundo sob a tutela de sua obsessão pela felicidade científica calculando suas calorias.
Somo Nelson Rodrigues, um filósofo selvagem, a esses dois selvagens para compor minha filosofia selvagem. Só uma filosofia selvagem se dá ao luxo de dizer a vida como ela é.
(Luiz Felipe Pondé - A Filosofia da Adúltera: ensaios selvagens)