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De tudo e de nada, discorrendo com divagações pessoais ou reflexões de autores consagrados. Este deverá ser considerado um ficheiro divagante, sem preconceitos ou falsos pudores, sobre os assuntos mais variados, desmi(s)tificando verdades ou dogmas.
Tendo o corpo se tornado microscopicamente pecaminoso, tanto como receptáculo da tentação quanto como provocador dela, ocorrerá com ele o mesmo que assinalamos a respeito dos sete pecados capitais, isto é, a sexualização de todos os pecados reaparece agora como sexualização do corpo inteiro.
Nesta perspectiva, o pecado da palavra, que São Paulo colocara como um pecado específico (podendo ser contra Deus ou contra o próximo, como a blasfêmia ou a calúnia), torna-se também pecado sexual.
A sexualização dos pecados e do corpo significa, simplesmente, a preocupação cristã com todas as formas da concupiscência, visto ser esta a manifestação da fraqueza da carne, e, conseqüentemente, a preocupação está voltada para a percepção, captura e controle de tudo quanto desperte prazer. É pela via da caça ao prazer que os pecados e o corpo vão sendo sexualizados. E é pela via do prazer que a palavra passará a ser um pecado sexual. Faladas, escritas ou simplesmente pensadas em silêncio (isto é, sem comunicação), ouvidas ou lidas, estão submetidas a rigoroso exame. A peculiaridade da palavra, sob o regime da confissão, não se acha apenas no fato de haver um vocabulário sexual que precisa ser usado com moderação e através dos eufemismos, e sim no fato de que toda e qualquer palavra, dependendo de quem a usa, como, quando e por que a usa, estar investida de prazer sexual. Donde, em muitas ordens religiosas, a obrigatoriedade do voto de silêncio. Mas o espantoso da palavra, descoberta que o confessor hábil consegue produzir no penitente, é que a pronunciamos sem saber o que dizemos e que ela nos faz dizer o que não suspeitávamos existir em nós (um dia, isso receberá nome: inconsciente e retorno do reprimido).
A confissão é o corpo e o mundo postos sob suspeita; mas a palavra é ainda acrescida de outro atributo: é reveladora e por isso mesmo perigosa.
Uma síntese da suspeição-revelação e de seu perigo, ligado ao conhecimento e à diminuição da censura, aparece admiravelmente no romance de Umberto Eco, O Nome da Rosa, no qual o crime, a suspeita, o pecado, o poder e a queda estão distribuídos à volta de um centro, um local feito apenas de palavras: a biblioteca. E o livro proibido, aquele que entre todos os da biblioteca ninguém poderá ler, os que o fizeram tendo sido assassinados, é um livro de elogio ao riso à alegria, ao humor e à graça. Nesse romance, as meditações de Santo Agostinho sobre o pecado da curiosidade ligado diretamente ao conhecimento intelectual e inconscientemente ao prazer sexual constitui uma das tramas da narrativa: ler e escrever são janelas e portas preferenciais do Diabo, por isso a biblioteca não tem janelas e sua única porta é guardada a chaves, antecedida por um corredor onde jazem ossadas. E o guardião do livro proibido, que para protegê-lo assassina, é cego.
Porém, o quadro confessional ainda não está completo.
Nas Confissões, perplexo e atormentado, Santo Agostinho escrevia que todos os esforços de controle da vontade, realizados durante a vigília, eram inteiramente perdidos durante o sono: sonhava pecados.
Assim, à lista dos pecados e de suas ocasiões, o confessor acrescentará os sonhos. Quando nosso corpo e nossa alma relaxam para o descanso, melhor oportunidade dão ao demônio para infiltrar-se sem que haja como combatê-lo e vencê-lo. Donde as regras que serão estabelecidas para diminuir o risco de sonhar: as preces antes de adormecer (para as crianças, a invocação do Anjo da Guarda), a frugalidade da refeição vespertina (o que mostra a relação entre gula e sexo), o cuidado com os divertimentos noturnos para que não deixem a alma preparada para a infiltração demoníaca (donde a recomendação da leitura de vidas de santos, dos livros de oração, da Bíblia; a reticência religiosa face aos bailes e festas noturnas; aregulamentação das ocasiões em que a relação sexual conjugal pode acontecer), e o elogio, levado ao máximo no protestantismo, do trabalho, pois ”mente desocupada, oficina do diabo” (o que mostra a relação entre preguiça e sexo).
A confissão é, poderíamos dizer, uma técnica da fala. O confessor atua num crescendo: indaga inicialmente se houve ato pecaminoso ou intenção pecaminosa; sendo afirmativa a resposta, indaga: houve deleitação?, pois a falta é maior em caso de prazer. Afirmativa a resposta, indaga quais os órgãos que se deleitaram (a falta variando de gravidade conforme os órgãos de prazer), quanto tempo durou a deleitação (a gravidade da falta sendo proporcional ao tempo de prazer), quantos se envolveram nela e onde aconteceu (havendo uma codificação do pecado conforme o número de participantes e os locais). Por fim, o confessor indaga se o penitente está arrependido, pronto para a contrição verdadeira e para não mais pecar. Exige, portanto, que o pecador diga a verdade sobre a sexualidade e que essa verdade, através do ato de contrição ou do arrependimento, atue sobre o comportamento futuro, modificando o ser do penitente. É na exigência da modificação que o controle melhor manifesta o papel da repressão sexual: não se trata apenas de proibir atos, palavras e pensamentos, mas de conseguir que outros venham colocar-se no lugar dos pecaminosos.
Algo também é exigido do próprio confessor, posto que é um ser humano, apesar da graça santificante recebida pelo sacramento da Ordem: não deve pecar ao ouvir a confissão. Esse risco existe se o confessor sentir prazer no que ouve, fantasiar a partir do que escuta, tornar-se cúmplice involuntário do penitente, fazendo-o alongar a fala e detalhar o próprio prazer. O risco da confissão para o confessor foi admiravelmente descrito pelo romancista Eça de Queiroz num romance intitulado O Crime do Padre Amaro.
(Marilena Chaui – “Repressão Sexual”)
Quanto a sexo, a Igreja Católica tem andado, nos últimos tempos, pelas ruas da amargura. Mas isto não é de agora e até faz parte dos anais da história deste país de brandos costumes. Diz-nos Alexandre Herculano, na sua obra História da Origem e Estabelecimento da inquisição em Portugal: "... Os eclesiásticos, por exemplo, da vasta diocese de Braga eram um tipo acabado de dissolução....Os mosteiros ofereciam os mesmos documentos de profunda corrupção, distinguindo-se entre eles o de Longovares, da Ordem de Santo Agostinho, e os de Seiça e Tarouca, da Ordem de Cister, ou antes nenhum dos mosteiros cistercienses se distinguia, porque em todos eles os abusos eram intoleráveis". Assim se referia Alexandre Herculano ao estado moral dos monges em pleno século XVI, mas quanto aos conventos das freiras a situação não era melhor: "Os conventos de freiras não se achavam em melhor estado, sendo o de Chelas, o de Semide e outros teatro de contínuos escândalos. A história de Lorvão e da sua abadessa, D. Filipa de Eça, é um dos quadros mais característicos daquela época ... Das freiras então actuais uma parte nascera no mosteiro; suas mães não só não se envergonhavam de as criar no claustro e para o claustro, mas aí mantinham também seus filhos do sexo masculino".
Os conventos e mosteiros pouco se distinguiam de vulgares bordéis, onde freiras e abadessas recebiam os seus amantes, na maioria padres, aí tinham os filhos e os criavam, como no célebre convento do Lorvão, nas proximidades de Coimbra, cuja abadessa ficou na História por ter sido encontrada em alegre ménage à quatre com uma outra freira, o bispo de Coimbra e a sua amante (é o mesmo Alexandre Herculano que nos elucida).
Mas é alguém, que vem de dentro da própria Igreja Católica, que pretende dar uma explicação para isto. É o teólogo e médico psiquiatra alemão Eugene Drewermann - atacado e marginalizado por razões óbvias - que, numa perspectiva psicanalítica, vê os "desvios sexuais do homem da igreja" como resultado da repressão sobre a consciência e a sexualidade humanas; nas suas palavras: «o menosprezo do ego, a "mortificação" da pulsão sexual e a submissão do indivíduo ao grupo (isto é, hierarquia da Igreja)» - para a Igreja, a sexualidade humana é ainda considerada como uma "sobrevivência pagã", posição reiterada em 1975 pela Sagrada Congregação da Fé quanto a questões de sexo e de castidade.
O mesmo autor reconhece, fruto da sua experiência de psicoterapeuta, que a percentagem de homossexuais dentro da Igreja católica é grande, como consequência principal da sua moral repressiva e da atitude quanto ao celibato, quer entre religiosos de sexo masculino como do sexo feminino, chegando aos 25% os jovens seminaristas que, de forma permanente ou esporádica, se dedicam a práticas homossexuais. Homossexualidade que era considerada pela Igreja como uma das formas mais graves de pecado, os acusados pelo "crime nefando" eram sentenciados à fogueira pela Santa Inquisição - se fosse agora, muito havia que queimar!
E entre os padres que decidem abandonar o caminho do onanismo (prática muito vulgar entre os eclesiásticos) para se ligar a alguma mulher, confrontam-se as mais das vezes com o problema dos filhos não desejados, sendo, por isso, e segundo aquele teólogo alemão, os abortos coisa frequente. Realidade que entra em frontal contradição com as posições oficiais da Igreja quanto ao aborto, ou melhor dizendo, interrupção voluntária da gravidez, mas, ao que parece, esta proibição é só para os outros.
Contudo, a hipocrisia não fica por aqui. Enquanto que a masturbação - considerada pela Teologia católica como "um acto gravemente oposto à ordem", tal como o álcool, outro refúgio bastante solicitado - funciona como droga para vencer o medo e a insegurança, o "concubinato" é tolerado, desde que o sacerdote em causa não persista ou "não dê escândalo" (cânone 1395 do Direito Canónico), isto é, que não haja conhecimento do "pecado", por outras palavras, que fique pelo segredo do confessionário.
A Igreja Católica (continuamos a citar a obra de Drewermann, Funcionários de Deus) «falsifica a neurose em santidade, a doença em eleição divina e a angústia em confiança em Deus», separando, como realidades opostas, o pensamento da sensibilidade, a actividade intelectual da vivência emocional. Filosofia própria de uma religião que «é inimiga da natureza e oposta ao amor» e que tem como objectivo não a sua libertação, mas a subjugação do homem: a sua destruição como indivíduo livre e senhor do seu destino.
Contrariamente ao que pensam alguns renovadores da Igreja católica, temerosos desta não se saber moldar aos novos tempos e por isso apressar o seu desaparecimento, jamais esta Igreja aceitará as palavras de Jesus (de Kazantzakis) para a sua amante, Maria Madalena: "Eu não sabia, minha bem-amada, que o mundo era tão belo e a carne tão santa... Eu não sabia que a alegria do corpo não era pecado."
"Sexo na sacristia, no altar, nos bancos da igreja, com meninas católicas e inocentes, masturbação no confessionário." É assim, baseado em documentos espontâneos everdadeiros que o autor, ex-padre da Igreja Católica Romana, questiona o celibato e as aberrações que afectam a Igreja e a sociedade.
"A perturbação dos padres, pelo fato de conviverem o tempo todo com a sensualidade de suas ovelhas e não poderem toca-las, nem ao menos olha-las os leva para o caminho invariável do homossexualismo como válvula de escape para suas emoções sexuais reprimidas. Todas essas práticas seriam solucionadas à lua do casamento. Por que não integrar os padres casados no ministério sacerdotal e deixar que a influencia deles com a demonstração da formação de família possa influenciar aos demais, conduzindo-os para a vida natural do homem e da mulher? Seria o momento da igreja repensar a obrigatoriedade do celibato, tornando-o optativo.
O autor descreve a posição dos padres, que durante a confissão dos fiéis se excitam com a narrativa dos pecados, ficam com seus membros eretos e muitos até se masturbam durante o ato sagrado da confissão. Outros padres se servem das freiras, que trabalham como suas secretarias em várias paróquias, todas belas e sensuais, jovens em sua maioria, se entregam com volúpia e lascívia perpetrando o jogo proibido do sexo entre os filhos do Senhor.
Vários são os relatos de padres que sucumbem ao homossexualismo, conquistando suas vítimas dentre as crianças que vão até a igreja para aprenderem os primeiros passos do catecismo. A igreja tornou-se um lugar perigoso para as crianças!
Esses e outros casos escabrosos que assombram a igreja são narrados de modo imparcial e ao final sugere-se que o celibato seja expurgado da Santa Madre Igreja Católica.
Relatou, no seu relatório final, a advogada Ursula Raue, encarregada pelas autoridades eclesiásticas de investigar sobre os escândalos vindos à luz desde fevereiro passado. A sra. Raue disse que a sua é apenas uma estimativa prudente do número de vítimas, porque ''não tivemos a pretensão de acreditar em tudo". No relatório fala-se, de fato, de outros 50 casos de abuso, que não diz respeito a jesuítas, mas "outras instituições, em sua maioria católica."
Um dos jesuítas responsáveis de abusos ocorridos no liceu berlinense "Canisius Kolleg", já falecido há algum tempo, foi descrito no relatório como um autêntico “sádico, que batia na bunda nua dos alunos e observava quem tinha uma ereção. " Outro jesuíta, apelidado de "Grabbelanton”, o apalpador, violentou uma menina de 14 anos e abusou de outra menina de 9 anos no interior de um confessionário. Quanto à Ordem dos Jesuítas, são 12 padres acusados de abuso, seis dos quais já morreram, enquanto acusações semelhantes foram feitas a outras 32 pessoas, a maioria professores e educadores nas mesmas instituições eclesiásticas.
Os casos citados no relatório ocorreram nos anos 70 e 80, mas a Sra. Raue está convencida de que os líderes das escolas jesuítas abafaram os casos dos padres pedófilos responsáveis de abusos. "Sabia-se que um apalpava de bom grado e havia um outro apelidado como "babuíno", disse a advogada, segundo a qual "é estranho como a Ordem foi tão descuidada com o exterior relativamente às informações sobre abusos sexuais nas suas instituições. "
O Provincial dos Jesuítas, na Alemanha, Stefan Dartmann, pediu desculpas às vítimas, explicando que "o resultado da investigação da Sra. Raue revelou uma realidade escandalosa, que cobriu de vergonha e desonra a nossa Ordem ". Dartmann não se pronunciou sobre os pedidos de reparação financeira feitos por algumas das vítimas de abuso, dizendo que eles estão aguardando as conclusões da mesa-redonda convocada pelo governo alemão para esclarecer todo o assunto, incluindo os abusos que ocorrem nas escolas seculares.
(IAC) - Berlim, 27 de maio
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Em PADRES, CELIBATO E CONFLITO SOCIAL: UMA HISTORIA DA IGREJA CATOLICA NO BRASIL, Kenneth P. Serbin afirma: O sacramento de penitência e o sexo estiveram no centro dos esforços do Concílio de Trento para reformar o clero... criou o confessionário moderno, que separa o padre do penitente por uma tela... Ironicamnete, a missa, as procissões e outras cerimónias religiosas tornaram-se ocasião para o flerte. O confessionário proporcionava a melhor oportunidade de iniciar uma ligação sexual. Só um padre tinha total acesso ao confessionário. Testemunhas da mencionaram grande variedade de estratégias para marcar encontros. Freiras, prostitutas, escravas, pobres brancas e negras, assim como as donas e donzelas de elite, tinham com padres encontros românticos iniciados no confessionário. Ocasionalmente,padres e mulheres já se entregavam às preliminares ou se mastrubavam no confessionário. Padres ofereciam dinheiro ou absolvição dos pecados a mulheres em troca de sexo. Em outras ocasiões, simulavam praticar magia para encantar mulheres. Alguns faziam comentários sádicos ou persuadiam mulheres a falar sobre suas experiências .
E conclui: "Muitos padres faziam propostas sexuais a mulheres (e ocasionalmente a homens) na intimidade do confessionário. Alguns tinham as suas escravas como amantes .
O confessionário aparece pois como um local possível de sedução. "Mesmo que um penitente denunciasse um padre, a corte eclesiástica geralmente pegava leve com ele. Em Fevereiro de 1535, o,padre da paróquia de Almodóver foi acusado de vários abusos sexuais. Estes incluíam frequentar bordéis e praticar assédios no confessionário. Ele recusou-se a dar absolvição a uma jovem a té que ela fizesse sexo com ele. Seu castigo foi uma multa ridícula e o confirmamento em sua casa durante 30 dias... Com heresias, a coisa era bem diferente. (VIDA SEXUAL DOS PAPAS, por NIGEL CAWTHORNE). Afinal, a omertà da igreja de roma já vem de longe: o importante é salvaguardar a face, escondendo ou negando os crimes de seu clero.
"O sexo tornou-se de fato o ponto principal de um confessionário moderno. Segundo Foucault, o confessionário católico foi sempre um meio de controle da vida sexual dos fiéis. Envolvia muito mais que apenas as indiscrições sexuais, e tanto o padre quanto o penitente interpretavam a confissão de tais pequenos delitos em termos de uma ampla estrutura ética."
Mas o mesmo não acontece com a ?, perguntamo-nos. "A comparação da psicanálise com o confessionário é demasiado forçada para ser convincente. No confessionário assume-se que o indivíduo é prontamente capaz de fornecer a informação requerida. A psicanálise, contudo,supõe que os bloqueios emocionais, derivados do passado, inibam um autoconhecimento e uma autonomia de ação por parte do indivíduo." (A TRANSFORMAÇAO DA INTIMIDADE: SEXUALIDADE, AMOR E EROTISMO NAS SOCIEDADES ...por Anthony Giddens).
"Quem sabe, se dentro do confessionário, o padre não está com o pau na mão? E, depois, tudo em nome do Espírito Santo..." (Bernardo Elias Lahdo)
Quase todos os sacerdotes e religiosos (até há poucos anos) entravam no seminário menor aos 10-11 anos de idade, ou seja, depois do ensino básico. Como se preparavam para uma vida em que teriam de permanecer celibatários, logo nessa idade era negado qualquer impulso sexual, reprimido, racionalizado e, muitas vezes, não recebiam uma educação consentânea ao assunto sexo que era até visto como tabu, cada um se desenrascava por conta própria, uns melhor e outros pior. Não se educava, reprimia-se mesmo porque a sexualidade não podia encontrar espaço para expressão num ambiente fechado feito só para rapazes sem qualquer contato com o sexo oposto. Estes rapazes não tiveram condições de ter um bom desenvolvimento psicossexual como acontecia normalmente com os seus coetâneos. A repressão da sexualidade, a supressão da afetividade, a aridez emocional, a negação e demonização dos impulsos sexuais naturais que fazem as pessoas crescer e amadurecer e contribuir significativamente para a construção da sua identidade em relação ao outro foram substituídas por dados intelectuais, racionais que eram relacionados com conteúdos de fé e ideais de vida demasiado elevados e abstratos para aquela idade, e, deste modo, geradores de sentimento de pecado, identidade sexual não resolvida e agressividade reprimida.
Esses ambientes criaram pessoas afetiva e emocionalmente imaturas que se projetam em forma desviada em meninos e meninas da idade na qual o que seu crescimento foi bloqueado. É verdade que são anagraficamente adultos, mas também é verdade que a sua idade sexual e emocional se manteve fixa na fase da pré-adolescência ou da adolescência.
A pedofilia, pelo menos olhando para as queixas e as pessoas envolvidas no âmbito eclesiástico, é, em grande parte, obra de pessoas com tendências homossexuais e, portanto, envolve mais meninos que meninas. Mas nem por isso é honesto dizer-se que o celibato não tem nada a ver com a maioria dos casos de pedofilia.
Talvez haja muitos padres com tendências homossexuais porque nunca atingiram e passaram a fase de desenvolvimento em que os rapazes aprendem a relacionar-se com o sexo oposto, algo que para o adolescente é um obstáculo que deve superar e aprender a gerir . Abrir-se ao sexo oposto é um dos passos mais importantes da maturação sexual.
No seu livro Padres Amantes, o ex-padre F. Mariano Rodrigues fala que "a perturbação dos padres, pelo fato de conviverem o tempo todo com a sensualidade de suas ovelhas e não poderem toca-las, nem ao menos olha-las os leva para o caminho invariável do homossexualismo como válvula de escape para suas emoções sexuais reprimidas." O mesmo autor descreve a posição dos "padres, que durante a confissão dos fiéis se excitam com a narrativa dos pecados, ficam com seus membros eretos e muitos até se masturbam durante o ato sagrado da confissão. Outros padres se servem das freiras, que trabalham como suas secretarias em várias paróquias, todas belas e sensuais, jovens em sua maioria, se entregam com volúpia e lascívia perpetrando o jogo proibido(e, como tal, apetecido) do sexo entre os filhos do Senhor."
Como sabemos, os seminários bem como a imposição do celibato eclesiástico (tal como os confessionários) são frutos do obscurantismo medieval da Igreja. Não será hora da Igreja romana repensar a sua posição intransigente a respeito da sexualidade, da confissão auricular e da obrigatoriedade do celibato?
"É preciso que se entenda que a "castidade" não é e nem poderia jamais ser objeto de um "voto"; ou o homem é casto, ou o homem não é casto. Não se pode dominar essa prodigiosa força (sexual) através de um simples voto (uma intenção). E necessário que o homem se situe em uma esfera consciencial, muitíssimo elevada, para que possa transcendê-la. Todavia, não seria essa mesma esfera consciencial a que se poderia esperar, normalmente, de um verdadeiro "Representante de Deus"? No entanto, esse não é, em absoluto, o caso desses sacerdotes de "Cristo" que, em realidade, não passam de homens comuns que, conduzidos a essa elevada posição (?), vêem-se forçados a essa, absolutamente, desnecessária repressão sexual representada pela exigência do celibato. Como consequência disso, acabam por cair, invariavelmente, na prática desses desvios, abusos e aberrações" (in Regnum, Carlos Alberto Gonçalves).
O fato de essa energia transcendental advir da primitiva energia sexual é que deu origem à superstição de que o sexo é pecaminoso, tal como apregoa a religião cristã. A abstinência sexual dos iluminados não é professada por questões da moral profana, e sim como um recurso de canalizar energia para se obter um estado superior de consciência, que não é atingido sem se pagar um certo preço. A castidade imposta "de fora para dentro" através de regras morais obtusas, tal como a que se impõe aos padres católicos, não possui a menor utilidade prática nem tem o menor valor espiritual. Como já disse o próprio Paulo de Tarso, "é melhor casar-se do que viver abrasado".
Segundo a Igreja o celibato é o estado de solteiro que implica a abstinência de atividade sexual. Uma autêntica manipulação já que o celibato consiste na proibição para o clero secular de casar-se e não implica de nenhuma forma a obrigação de castidade. Surpreendentemente foi somente incluído no Código de Direito Canónico no ano 1917.
No cristianismo primitivo a idéia mesma de um celibato clerical teria sido considerada absurda tendo em conta que tanto Pedro como Paulo foram homens casados.
A primeira Constituição Apostólica, que data aproximadamente do ano 340, impôs uma dupla disciplina; um homem casado no momento de ordenar-se tinha a obrigação de manter o seu matrimónio, enquanto que um solteiro no mesmo caso aceitaria a obrigação de manter-se celibatário. Na prática o celibato do solteiro era optativo já que a disciplina lhe dava implicitamente a opção de casar-se antes de ordenar-se. A abstinência sexual se converteu em ideal Cristão(?!) e, numa manobra teológica em essência blasfema, a caridade como virtude principal inerente nos Evangelhos, foi substituída pela castidade... No entanto, a disciplina não pegou - e menos ainda a virtude da castidade - nos restantes séculos do primeiro milénio; a imensa maioria do clero continuava casando-se, com excepção dos mais espertos que, aceitando em aparência a disciplina, viviam em concubinato ou, pior, com amantes sucessivas.
A princípios do século V há, repentinamente, uma mudança qualitativo; uma feroz imposição do celibato sacerdotal. Houve razões para isso; por um lado uma razão patrimonial - a Igreja tinha mudado de perseguida e pobre a perseguidora e rica - o medo de que sacerdotes casados deixariam os seus bens paroquiais a suas viúvas e descendência, por outro um movimento ascético e cada vez mais anti-sexual e misógino.
Com a chegada da alta Idade Média os papas "absolutistas" intervieram decididamente no assunto. Usou o poder secular activamente para despejar as esposas dos sacerdotes de suas casas, resultando no suicídio de muitas delas. Disse Gregório: " A Igreja não pode libertar-se das garras da laicidade sem antes libertar os sacerdotes das garras de suas esposas". Com o tempo o celibato se impôs pouco a pouco com efeitos nefastos para a moral sexual. A razão principal para impô-lo tinha sido a consideração de que o matrimónio, a esposa e os filhos, impediriam a plena dedicação, de corpo e alma, do clero à Igreja. Críticos da época disseram coisas como: "a Cúria romana é o melhor exemplo de tudo o que é vicioso e infame no mundo" , "a profissão de sacerdote é o caminho mais curto para o inferno", "Roma não é a Santa Sede mas a Sede Ímpia". Os cardeais foram chamados carnais, as freiras rameiras e nos mosteiros abundavam os gays. Na Idade Média a homossexualidade em certos mosteiros e conventos era habitual; em tempos mais recentes a prática deslocou-se para os seminários e colégios religiosos.
A Igreja logrou finalmente impôr o celibato, depois de tantos séculos, no Concílio de Trento, não obstante a declarada oposição tanto do Imperador Fernando como de muitos outros soberanos. O raciocínio foi o seguinte: como a Igreja é uma instituição absolutista e hierárquica, precisa de operários cegamente entregues à instituição e somente o celibato - sem a distração de problemas familiares - podia garantir tal entrega absoluta; o sacerdócio deixaría de ser a livre entrega a Deus e se converteria num serviço coaccionado ao papado, com o sacerdote como prisioneiro do sistema.
Por outro lado foram acordadas as condições para o recrutamento sacerdotal (idade, ciência adquirida, independência material) alem de estabelecer-se a criação de seminários episcopais para a formação sacerdotal. Como durante a sua estadia no seminário se suprimia a libido com acrescentamentos de preparados de cânfora à comida - como até há pouco se fazia com os recrutas nos exércitos - os seminaristas ordenavam-se sacerdotes sem nenhuma idéia do sexo e menos ainda da privação que significava o celibato.O celibato se impôs mas desde logo a castidade não. Como diz o ditado: " a privação é causa de apetite".
No século XVII havia que inventar o confessionário para assegurar o anonimato das penitentes e para evitar, em caso da confissão de pecados sexuais, a exigência de favores sexuais por parte de confessores chantagistas, um pecado conhecido como "solicitar", muito comum antes, e depois, da existência dos confessionários.
A partir da metade do século XIX a moralidade sexual do clero católico romano tornou-se mais "vitoriana" em todo o Ocidente. Ou seja, continuou mais ou menos como antes mas tornou-se mais subterrânea. Houve mais comportamento puritano para a galeria e mais hipocrisia; muita descrição e encobrimento de crimes sexuais para evitar escândalos que eram muito mal vistos.