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De tudo e de nada, discorrendo com divagações pessoais ou reflexões de autores consagrados. Este deverá ser considerado um ficheiro divagante, sem preconceitos ou falsos pudores, sobre os assuntos mais variados, desmi(s)tificando verdades ou dogmas.
Um movimento conhecido como “nova terceira idade” está dominando a sociedade. O idoso, pela velha norma social, costumava ser passivo e triste, condenado a uma cadeira de balanço; contava–se com seu declínio físico e mental. Hoje, o contrário é verdadeiro.Pessoas mais velhas têm altas expectativas de continuar ativas com vitalidade. Com isso, a definição de velhice mudou. Uma pesquisa perguntou a pessoas nascidas no período após Segunda Guerra quando começava a velhice. A resposta foi, em média, 85 anos. À medida que as expectativas crescem, o cérebro acompanha o ritmo e se adapta à nova terceira idade. A velha teoria de um cérebro imutável e estagnado afirmava que seu envelhecimento era inevitável. Supunha-se que as células do cérebro morriam contínua e irreversivelmente à medida que a pessoa envelhecia.
Agora que sabemos que o cérebro é flexível e dinâmico, a inevitabilidade da perda celular não é mais válida. No processo de envelhecimento – que ocorre cerca de 1 por cento ao ano depois dos 30 –, não há duas pessoas que envelheçam da mesma maneira. Até gêmeos idênticos, nascidos com os mesmos genes, terão diferentes padrões de atividade genética aos 70 anos, e seus corpos podem ser radicalmente diferentes dependendo do estilo de vida escolhido. Essa escolha não aumentou ou diminuiu os genes com que nasceram, mas quase todos os aspectos da vida – dieta, atividades, estresse, relacionamentos, trabalho e o ambiente físico – mudaram a atividade desses genes. Na verdade, nenhum aspecto do envelhecimento é inevitável. Para cada função, mental ou física, podemos encontrar pessoas que melhoram o tempo todo. Existem corretores da bolsa com 90 anos que conduzem complexas transações e possuem uma memória que só melhorou com o tempo.
O problema é que muitos de nós aderimos à norma padronizada. Quando envelhecemos, tendemos a ter preguiça e apatia em relação ao aprendizado.
Qualquer mínima tensão nos perturba, e esse estresse dura muito tempo. O que costumava ser considerado uma “acomodação” natural de pessoas mais velhas, hoje está relacionado à conexão entre mente e cérebro. Às vezes o cérebro é dominante nessa parceria. Suponhamos um restaurante que esteja com dificuldades de disponibilizar mesa para seus clientes. Um jovem que está na fila de espera sente uma certa chateação, que entretanto se dissipa assim que ele se acomoda. Uma pessoa mais velha pode reagir com um ataque de raiva – e continuar chateada mesmo depois de estar na mesa. Essa é a diferença da reação de estresse pela qual o cérebro é responsável. Da mesma forma, quando pessoas idosas ficam sobrecarregadas por um excesso de estímulos sensoriais (o barulho do trânsito, uma loja de departamentos lotada etc.), seu cérebro provavelmente diminuiu a função de captar as ondas de dados do mundo agitado.
Na maior parte do tempo, porém, a mente domina a conexão entre mente e cérebro. À medida que envelhecemos, tendemos a simplificar nossas atividades mentais, muitas vezes como um mecanismo de defesa. Sentimo-nos seguros com o que sabemos e evitamos aprender qualquer coisa nova. Esse comportamento é julgado pelos mais jovens como irritabilidade e teimosia, mas sua verdadeira causa pode estar na dança entre mente e cérebro. Para muitas pessoas mais velhas, mas não para todas, o ritmo da música diminui. O mais importante é não abandonar a pista de dança, o que estaria abrindo caminho para o declínio tanto do cérebro quanto da mente. Em vez de fazer novas sinapses, o cérebro continua funcionando com as que já existem. Nessa espiral descendente de atividade mental, a pessoa idosa acabará tendo menos dendritos e sinapses por neurônio no córtex cerebral.
E quanto à irreversibilidade dos efeitos do envelhecimento? À medida que ficamos mais velhos, muitos de nós sentimos a memória falhando cada vez mais.
Não conseguimos lembrar por que entramos numa sala e brincamos, na defensiva, que isso é coisa de velho. Rudy tinha um gato maravilhoso que o seguia para todo lugar como um cão fiel. Muitas vezes, Rudy levantava de sua poltrona na sala e se dirigia à cozinha com o gato a reboque, e, quando chegavam lá, os dois se olhavam, sem saber por que tinham ido parar ali. Embora possamos dizer que esses lapsos são sinais de perda de memória relacionada ao envelhecimento, eles ocorrem, na verdade, devido à falta de aprendizado – de registrar novas informações no cérebro.
Quando não conseguimos lembrar um fato simples como onde colocamos as chaves, significa que não “aprendemos” ou gravamos o lugar onde as colocamos. Como usuários de nosso cérebro, não registramos ou consolidamos a informação sensorial em uma memória de curto prazo durante o processo de pôr as chaves num determinado lugar. Ninguém pode lembrar algo que nunca aprendeu.
Se nos mantivermos atentos, um cérebro saudável vai continuar a nos servir à medida que envelhecermos. Podemos contar com prontidão e vigor, em vez de medo da deficiência e da senilidade. Em nossa opinião – e Rudy fala com a autoridade de importante pesquisador do Alzheimer –, uma campanha pública que gerasse alarme sobre a senilidade teria um efeito danoso. As expectativas são um gatilho poderoso para o cérebro. Se alguém acha que vai perder a memória e observa cada mínimo lapso com ansiedade, está interferindo no ato natural e espontâneo de lembrar.
Biologicamente, mais de 80 por cento das pessoas acima dos 70 anos não têm perda significativa de memória. Nossas expectativas devem corresponder a essa descoberta, e não a nosso medo oculto e, em grande medida, infundado.
Se alguém se torna apático e aborrecido com a vida, ou simplesmente não sente entusiasmo por suas experiências de cada momento, é porque seu potencial de aprendizado está enfraquecido. Como evidência física disso, um neurologista pode indicar as sinapses que devem ser consolidadas na memória de curto prazo. Mas, na maioria dos casos, um acontecimento mental precedeu a evidência física: jamais aprendemos aquilo que acreditamos ter esquecido.
Nada solidifica a memória como a emoção. Quando somos crianças, aprendemos sem esforço porque temos um entusiasmo natural por aprender. Emoções de alegria e deslumbramento, mas também de horror e medo, intensificam o aprendizado. Isso guarda a memória dentro de nós, às vezes por toda a vida. (Tente lembrar seu primeiro hobby ou seu primeiro beijo. Agora tente lembrar o nome do primeiro deputado em que votou, ou a marca do carro do vizinho quando você tinha 10 anos.
Geralmente, as duas primeiras lembranças vêm facilmente, enquanto as duas últimas, não – a menos que você tivesse uma paixão precoce por política ou carros.) Às vezes, o fator de entusiasmo que ocorre com as crianças também funciona com os adultos. Uma forte emoção é quase sempre uma chave. Todos nós lembramos onde estávamos quando ocorreram os ataques de 11 de setembro, assim como os idosos americanos lembram onde estavam no dia 12 de abril de 1945, quando o presidente Roosevelt morreu de repente enquanto estava de férias em Warm Springs, no estado da Geórgia. Como a memória ainda continua inexplorada, não podemos afirmar, em termos de função cerebral, por que intensas emoções podem gerar lembranças muito detalhadas. Algumas emoções fortes podem ter o efeito contrário: em caso de abuso sexual na infância, por exemplo, o trauma é reprimido e só pode ser recuperado com intensa terapia ou hipnose. Essas questões não serão solucionadas antes que algumas perguntas básicas sejam respondidas: O que é a memória? Como o cérebro armazena as lembranças? Que tipo de sinal físico – se é que existe algum – uma lembrança deixa na célula cerebral?
Até que as respostas surjam, acreditamos que o comportamento e as expectativas sejam a chave. Quando você novamente se apaixona por aprender, como quando era criança, novos dendritos e sinapses se formam, e sua memória pode voltar a ser tão boa como era na sua juventude. Da mesma forma, quando você lembra um acontecimento antigo recuperando-o ativamente (ou seja, quando sua mente vasculha o passado com atenção), você cria novas sinapses, que fortalecem as velhas, aumentando a possibilidade de voltar a lembrar esse fato no futuro. A tarefa é sua, como líder e usuário de seu cérebro. Você não é seu cérebro; é muito mais que isso. No final, esse é o único fato que vale a pena lembrar.
(Deepak Chopra - Super Cérebro)