O medo é uma emoção. Apesar da sua invisibilidade, são elas, as emoções, que governam o mundo, ao lado da fome. Partindo das emoções criamos nossas fantasias e as lançamos ao mundo na forma de comportamentos, conceitos e criações. Baseados nelas criamos outro mundo para nós que, dispensando muitas vezes a realidade biológica, pretende impor-se sobre tudo e todos, parecendo desconhecer limites e, às vezes desprezar o princípio de realidade.
Realmente adoramos pensar em nós mesmos como super alguma coisa, cai bem para a nossa vaidade acreditarmos que somos poderosos e que seremos ainda mais se nos comportarmos desta ou daquela forma.
Há cada vez mais técnicas para desenvolver super habilidades e muitas publicações e linhas de pensamento atuando em sinergismo com essa valorização de nossos poderes. É perfeitamente compreensível que alguém que se sente no fundo frágil e teme o amanhã como tememos, busque meios de superar-se e de negar as condições desfavoráveis da existência. Mais tentador fica se pudermos conseguir isso de uma forma fácil, que não exija muito tempo nem esforço de auto conhecimento e aperfeiçoamento. É bastante útil para lidar com o medo.
Isso serve muito a um tipo de desenvolvimento egoísta que me diz que eu preciso dedicar-me ao desenvolvimento de meus super poderes e então serei um vencedor e quem não chega a isso, o faz por incapacidade e merece realmente ser relegado a um segundo plano.
A cultura atual é marcada pelo egocentrismo, baseado no que, podemos dizer que tem traços claramente infantis. Um desses traços é a prevalência da insegurança, do temor pela vida que nos torna cada dia mais interessados apenas em nós mesmos. Somos uma cultura medrosa e que esconde o seu medo mediante a adoção de imagens de superioridade e força ilimitada. É sabido que a paranóia disfarça seu medo sob uma delirante idéia de poder. Nos nossos delírios, desconhecemos a realidade que já existia muito antes de inventarmos a nossa. Podemos perceber isso na pretensão delirante que desenvolvemos de poder alterar tão substancialmente o meio ambiente e nossa biologia, com a ingênua perspectiva de que a natureza acabaria se rendendo aos nossos desejos. Sonhamos poder prescindir dela, esquecemos até que precisamos respirar.
O mundo que criamos devasta qualquer coisa que se oponha a ele, incluindo nós mesmos. Passamos a fazer um enorme esforço para passar por cima de nossa natureza todos os dias. Existem delírios pessoais e coletivos.
(Manoelita Dias dos Santos - A lógica da emoção)