Há alguns anos, a marca Volvo lançou uma campanha internacional cuja assinatura era design around you. A primeira ideia comercial era que a marca projetaria o carro levando em conta as necessidades de cada consumidor, o que, obviamente, é impossível. Mas a segunda ideia, mais psicológica, e mais importante para entender o lugar das marcas como agentes de sentido no mundo contemporâneo, era a de que você não está só porque a Volvo está ao seu lado na hora de fazer seu carro. Se é uma inverdade que o carro será taylor made, é uma verdade evidente em nosso mundo que estamos cada vez mais sós, mesmo que cercados de amigos no Facebook, de fotos por toda parte e de celulares que falam conosco o tempo todo.
É essa solidão essencial que a marca tem em mente, mesmo que não saiba, quando cria uma assinatura como essa. Somos seres cada vez mais ilhados e com carência, não só de vínculos, mas de desejo de vínculos, o que é muito pior. É uma ironia máxima o fato de a cultura do desejo ser justamente a que matou o desejo. Nesse sentido, a parceria de uma marca é essencial, inclusive porque entrega um “uso de parceria” muito mais seguro do que o “uso” que as pessoas entregam com suas ambivalências e traições. Pode-se confiar muito mais no serviço de assistência técnica e de pós-venda da Volvo, com suas meninas lindas e doces ao portador, do que nas incertezas de uma relação afetiva com pessoas, além do fato óbvio de que um carro de boa marca é muito mais seguro (no caso da Volvo isso ainda é mais evidente) do que o casamento ou ter filhos.
Por isso, aquilo que se chama branding em breve será um ramo da ontologia, ou seja, a disciplina na Filosofia que trata do essencial, e não do acidente. As marcas, portanto, deverão cumprir cada vez mais o papel de dizer o que é essencial como valor (e fazer esse valor valer, uma vez que seus produtos são confiáveis naquilo que ela diz representar) e separar o joio do trigo na vida dos contemporâneos desesperados por sentido que não os prenda em vínculos incertos e dolorosos. Do design around you migraremos logo para meaning around you, e, quando chegarmos lá, teremos adentrado o terreno do pós-humano e do pós-materialismo, tendo em vista que o materialismo representado por produtos do capitalismo estará ensaiando sua nova vida como doador de sentido para o cotidiano, espaço por excelência no qual os sentidos da vida se dissolvem.
(Luiz Felipe de Cerqueira e Silva Pondé - A era do ressentimento)