a - Psicotrópico (tóxico)
Psicotrópico é o nome científico dado às drogas que causam dependência psicológica e, às vezes, física. Essas substâncias entram na corrente sangüínea - por via oral, endovenosa (injeção na veia) ou por inalação - e vão até o sistema nervoso central (o cérebro), onde agem, interferindo de forma ainda não totalmente esclarecida no campo de energia emocional e intelectual de um indivíduo.
b - Farmacodependência (toxicomania)
Farmacodependência é "o estado psíquico, e às vezes físico, causado pela ação de um farmaco (droga) em um organismo vivo, o que modifica o comportamento e gera um desejo irreprimível de tomar a droga de forma contínua ou periódica, com o objetivo de experimentar seus efeitos psicológicos, ou para evitar o mal-estar que a ausência da droga produz no organismo".
Se a palavra "tóxico" não deve ser empregada para designar as drogas que causam dependência, também a palavra "toxicomania" (mania de usar tóxicos) não deve ser relacionada com seus usuários. Aliás, é um erro grave taxar as pessoas dependentes de drogas de toxicômanos, viciados ou mesmo farmacodependentes, pois, ao taxá-las assim, desprezamos as "partes" saudáveis de suas personalidades e supervalorizamos as "partes" negativas. Valorizar aspectos positivos da personalidade de uma pessoa dependente de drogas é o primeiro passo para ajudá-la.
c - Dependência psíquica
Dependência psíquica, como vimos, é a relação estreita e dependente que um usuário tem com uma droga psicotrópica em virtude da representação inconsciente e superdimensionada que a droga tem em sua memória.
Nem todas as drogas causam dependência física, mas todas são capazes de provocar, em diversos graus, a dependência psíquica.
Por pelo menos três tipos de motivação ou de reforços psicológicos, as pessoas cedem às drogas. De extrema complexidade, procuraremos, no entanto, simplificar. A dependência é caracterizada por uma representação psicológica inconsciente da droga, que canaliza as energias psíquicas para um desejo forte e, às vezes, incontrolável de usá-la. Tentarei explicar simplificadamente os mecanismos que produzem a dependência psicológica.
- Reforço psicológico positivo: busca-se experimentar drogas com o objetivo de obter prazer. Essa motivação geralmente é apoiada pela curiosidade pessoal dos jovens, pela influência de amigos ou mesmo de algum traficante, pela pressão do grupo etc. O reforço psicológico positivo é a porta de entrada colorida para a dependência psicológica.
- Reforço psicossocial: trata-se do apelo aos efeitos psicológicos da droga para suportar problemas, tensões e dificuldades sociais e pessoais, ou como forma de fugir deles. Muitos usam o álcool etílico como facilitador das relações sociais. Esse tipo de motivação é sustentado pelos conflitos no relacionamento familiar, pelos transtornos psíquicos, pela rejeição social, pelas dificuldades financeiras, etc. Todos nós passamos por problemas e dificuldades na vida, que muitas vezes são difíceis de suportar, mas nada justifica a utilização de drogas como tentativa de amenizar essas tensões. O uso de drogas nesses casos torna-se uma "muleta química", incompatível com o equilíbrio e a maturidade de vida.
- Reforço psicológico negativo: nesse estágio, chegamos à dependência psicológica propriamente dita. Aqui, a pessoa que usa drogas não o fará apenas para buscar algum tipo de prazer ou para suportar seus problemas, mas para aliviar os efeitos psicológicos indesejáveis, decorrentes da abstenção. O indivíduo que, durante semanas ou meses, habituou-se a drogas estimulantes, como a cocaína, o crack, a merla (subproduto da cocaína); aos moderadores de apetite: Hipofagin, Inibex; a fórmulas de moderadores de apetite que contêm substâncias como femproporex, anfrepramona etc.; a calmantes como Lorax, Tensil e outros; ou mesmo à nicotina dos cigarros; à maconha e outras mais, ao parar de usá-las, sentirá insónia, angústia, depressão, ansiedade e irritabilidade. O grau dos sintomas variará de acordo com a intensidade da dependência, do tipo de droga usada, da freqüência do uso e também do tipo de personalidade do dependente. De qualquer maneira, são esses efeitos psicológicos indesejáveis, detonados a partir do fenômeno do gatilho da memória, que caracterizam a dependência psicológica e levam o indivíduo a buscar, às vezes com grande desespero, novas doses para aliviar tais sofrimentos.
Se compreendermos o que é essa dependência, também entenderemos por que tantos jovens aplicam drogas nas veias com seringas contaminadas, indiferentes ao perigo de contrair infecção fatal, e por que muitos deles são capazes de atitudes extremadas para obter uma nova dose da droga.
O crack (cocaína misturada com bicarbonato de sódio) e a merla (pasta base da cocaína) são fumadas. Dessa forma, a cocaína atinge o cerébro mais rapidamente, gerando uma grave dependência psíquica, bem como sérios riscos de produzir uma parada cardiorespiratória por overdose.
d - Dependência física
Dependência física é a capacidade que uma droga tem de passar a fazer parte do metabolismo, da "vida" do organismo, a tal ponto que, na sua falta, o organismo produz reações intensas, reações de sofrimento - a chamada síndrome de retirada ou de abstinência. Essa síndrome pode produzir desde sinais e sintomas leves até morte.
A maioria das drogas causa pouca dependência física, mas o álcool etílico, os barbitúricos (Gardenal, Nembutal, etc.) e os derivados do ópio (heroína, morfina, codeína, etc.) produzem alta dependência. Em alcoólatras crônicos, por exemplo, a falta de álcool provoca tremores nas mãos, ansiedades, alterações cardiovasculares; nos estágios mais avançados, alucinações, ilusões auditivas, visuais ou táteis, febre e colapso cardiovasculatório, por vezes, irreversível.
Os sintomas da privação de barbitúricos são semelhantes aos do álcool, com a agravante de provocar sucessivas crises convulsivas, levando o indivíduo a um grave esgotamento físico que pode ser até fatal. E sem morfina, heroína e outros derivados do ópio, seus cativos são atormentados por sudorese (excesso de suor), insônia, ansiedade, vômitos, diarréia, dores generalizadas, febre e alterações cardiovasculares.
Lembro-me de uma jovem chamada N. J. que esteve sob meus cuidados num hospital em Paris. Ela era dependente de heroína. Em alguns períodos do dia, ela costumava dar-me algumas aulas de francês; em outros, eu tentava ajudá-la a compreender os bastidores de sua mente.
N. era uma jovem inteligente, bonita e dócil, mas sofria intensamente com sua dependência física e psíquica. O que mais me chamava a atenção eram os sintomas da dependência dessa droga, eram as dores generalizadas que ela e outros sentiam após o primeiro dia de interrupção do uso. Eles choravam, angustiavam-se, vomitavam e tinham crises de dores intensas. Essas dores funcionavam como um estímulo desesperador para que usassem uma nova dose da droga para se sentirem aliviados.
N. me dizia com ar angustiante que, se não parasse de usar a droga, ela poria um fim à sua vida, tamanha era a angústia que sentia para conseguir todos os dias uma nova dose para não reproduzir os sintomas de abstinência. Eu procurava abrir as janelas de sua mente e mostrar que ela podia realmente se libertar do cárcere da dependência.
Por causa da síndrome de abstinência, muitos usuários roubavam ou vendiam o próprio corpo na capital francesa para conseguir cerca de cem dólares por dia para comprar heroína. São seres humanos como qualquer um de nós, mas travam diariamente uma luta infernal, inumana, para sobreviver, uma luta com a qual jamais sonharam que um dia viveriam.
Se os iniciantes pudessem ver o futuro, não haveria necessidade de policiamento nem de contenção do tráfico.
O usuário de cocaína tem tendência a ser mais auto-suficiente e mais difícil de ser ajudado do que o usuário de heroína, embora a heroína gere uma dependência mais grave, tanto física como psíquica. O grande problema, como salientei, é que o usuário de cocaína dificilmente reconhece sua dependência nos primeiros meses e anos de uso, pois tem sempre a falsa impressão de que irá parar de usar a droga quando quiser. Mal sabe que possui um "monstro virtual" nas entranhas do seu inconsciente, que costuma acordar nos fins-de-semana ou após um ou mais dias de uso.
Quem usa heroína, por possuir graves sintomas físicos com a abstenção da droga, reconhece com humildade que está doente logo nos primeiros meses e, por isso, procura ajuda com mais facilidade, muitas vezes sem qualquer pressão social ou familiar.
e - Tolerância à droga
E a necessidade de o indivíduo usar doses cada vez maiores da droga para obter os mesmos efeitos que sentia no início. Existem três tipos de tolerância: a comportamental, a farmacodinâmica e a farmacocinética.
A tolerância comportamental é uma adaptação aos efeitos psicológicos da droga; a farmacodinâmica é uma adaptação no lugar específico do cérebro onde as drogas atuam, de forma que a resposta se torna reduzida; e a farmacocinética consiste na destruição mais rápida da droga no sangue, principalmente por causa da ativação de enzimas no fígado.
Os três tipos de tolerância cooperam juntos para que as drogas diminuam seus efeitos, e por isso mesmo os usuários recorrem a doses cada vez mais elevadas, às vezes até letais, como é o caso da cocaína, que, em doses altas, mata por parada respiratória. Todas as drogas, em maior ou menor grau, sofrem certa tolerância no organismo humano.
(Cury, Augusto Jorge - A pior prisão do mundo)