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UMA FILOSOFIA SELVAGEM

por Thynus, em 04.04.17
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Os selvagens não sabem o que é cantar.
Eles apenas cantam.
Os selvagens não conhecem o que é aprender.
Eles apenas sabem.
Os selvagens não entendem o que é querer.
Eles apenas podem.
Os selvagens não seguem nenhuma crença.
Eles apenas caminham.
Os selvagens não compreendem nada sobre o universo.
Eles apenas existem.
Nós passamos a vida passando.
Eles passam a vida vivendo.
(Leandro Marshall)
 

Lembro-me de um filme que vi há muito anos, um filme francês no qual o personagem principal, um perfumista, foge de sua vida em Paris. Ele é um gênio em perfumes e sua mulher, uma chata, cuida da parte comercial. Ele vai para a América Latina e se torna feirante. Resolve romper com o ciclo de desgosto de uma vida que não era a que ele queria viver.
Romper uma vida de desgosto talvez seja o maior dos sonhos, claro, para quem não morre de fome. Nosso selvagem dá sorte e ganha a Catherine Deneuve como nova mulher. Maravilhas do cinema.
O que me marcou naquele filme foi a coragem do protagonista de abandonar uma vida que detestava. Acho que esse é um desafio para qualquer um que queira ter uma vida menos idiota. Para tal, é necessário olhar a vida como ela é ao invés de se enganar e enganar os outros. O nome desse filme é O selvagem.
Outra referência que me marcou sobre o significado de ser selvagem na filosofia foi o personagem “o Selvagem” do grande romance Admirável mundo novo, de Aldous Huxley. O personagem irrompe no admirável mundo científico da felicidade programada. Sua trajetória, infeliz, é aquela da tragédia da liberdade num mundo obcecado pelo progresso científico da vida feliz: é destruído. Este é o mundo em que vivemos: povoado por idiotas que comandam o mundo sob a tutela de sua obsessão pela felicidade científica calculando suas calorias.
Somo Nelson Rodrigues, um filósofo selvagem, a esses dois selvagens para compor minha filosofia selvagem. Só uma filosofia selvagem se dá ao luxo de dizer a vida como ela é.
 
(Luiz Felipe Pondé - A Filosofia da Adúltera: ensaios selvagens)

publicado às 14:07


QUE A ADÚLTERA REZE POR NÓS

por Thynus, em 04.04.17
Para mim, há uma nítida relação entre a adúltera e o suicida.
Aquela que trai e aquele que se mata estão fazendo um
julgamento do mundo.
(Nelson Rodrigues, em A MENINA SEM ESTRELA)

 
Este livro é escrito sob o espírito da adúltera. A mulher que representa a condição humana como escrava do desejo. Que experimenta o tédio miserável da carne. Que conhece a tristeza da cobiça. Que sente o peso do abandono e da mentira social. Que peca como respira. Que é bela como uma miserável. Que realiza a vocação mais antiga da mulher. Que reconhece o quanto se perde em si mesma e como é autodestrutiva. Mas que, ainda assim, não consegue deixar de abrir as pernas para o homem que não é seu marido, que chupa seu sexo engolindo o desejo líquido que brota dele, traindo a confiança de seu marido infeliz e de seus filhos, e que assim se faz representante de toda a humanidade em sua miséria. Deus ama a adúltera e pede a ela que reze por nós. Nelson sabia disso muito bem.
Eis o que quero dizer: vou me repetir, mas, sem minhas repetições, sou um nada. Claro que estou citando o Nelson. Este livro é um misto de filosofia e jornalismo, e jornalismo é muitas vezes redundância, porque se sabe que o leitor é sempre um coitado, como todos nós, um efêmero. E a filosofia é a arte de tornar a vida um espanto. E o espanto precisa sempre se repetir para fazer efeito.
E mais: volto à adúltera. Não existe mulher mais desgraçada.
 
(Luiz Felipe Pondé - A Filosofia da Adúltera: ensaios selvagens)

publicado às 13:56


Nunca se ri de filósofos vivos

por Thynus, em 03.04.17
 
A política de Aristóteles
Numa toca no chão vivia um homem que levava uma vida quieta e sossegada em uma comunidade que muito prezava as convenções e a decência. Um dia, entretanto, ele deixou sua toca e partiu em uma jornada para o desconhecido. Sua aventura, embora assustadora e, por vezes, dolorosa, modificou-o para sempre. Seus olhos se abriram e sua mente e seu caráter amadureceram. Quando voltou à toca, os vizinhos passaram a considerá-lo “esquisito”, porque não conseguiam aceitar que a vida tem mais a oferecer do que ordem e rotina. Embora tenha perdido sua reputação, ele nunca se arrependeu de ter participado da aventura que lhe permitiu descobrir sua verdadeira natureza e experimentar um mundo novo e instigante.

Se isso lhe parece familiar, não é de surpreender. É a Alegoria da Caverna, de Platão, possivelmente a mais famosa história contada “lá e de volta outra vez”. O conto do filósofo grego não fala de hobbits ou magos, é claro. Trata-se da parábola sobre um homem, encarcerado desde o nascimento numa prisão” subterrânea, que se aventura a sair e descobre que o mundo é muito maior, mais interessante e mais bonito do que ele imaginara. Platão espera que os leitores aprendam algumas lições com essa alegoria: seja aventureiro; saia de sua zona de conforto; aceite suas limitações e esteja aberto a novas ideias e a verdades superiores. Apenas quando enfrentamos os desafios e assumimos riscos podemos crescer e descobrir o que somos capazes de nos tornar. Essas lições são essencialmente as mesmas que J. R. R. Tolkien ensina em O hobbit.

Um dos mais adorados livros infantis de todos os tempos, e o fascinante prelúdio de O Senhor dos anéis, O hobbit levanta diversas questões a serem ponderadas. Será que as aventuras são apenas “coisas desagradáveis e desconfortáveis” que “fazem com que você se atrase para o jantar” ou podem ser estimulantes e ter o potencial de mudar sua vida? Será que a comida, a alegria e as canções devem ser postas acima do ouro? A vida era melhor nos tempos pré-industriais, quando havia “menos barulho e mais verde”? Podemos confiar em quem é “generoso como o verão” para usar tecnologias poderosas com responsabilidade ou essas tecnologias devem ser cuidadosamente reguladas ou destruídas, para que não caiam nas mãos de orcs ou de servos do Necromante? Quais são os deveres de um amigo em relação ao outro? A misericórdia deve ser estendida até mesmo àqueles que merecem morrer? Bilbo podia ter entregado a Pedra Arken? Como o tesouro de Smaug deveria ter sido dividido? Thorin deixou sua “bonita harpa dourada” em Bolsão quando partiu para o desconhecido? Caso tenha deixado, quanto podemos faturar se a vendermos na internet? Dos felizes salões da Última Casa Amiga de Elrond à “viscosa ilha de pedra” de Gollum, grandes questões filosóficas são apresentadas aos antigos fãs e novos leitores.

Tolkien — todos os elogios ao seu vinho e à sua cerveja! — foi professor de Inglês Medieval de Oxford, não um filósofo profissional. Mas como esclarecem livros recentes como The Philosophy of Tolkien, de Peter Kreeft, Defending Middle-earth, de Patrick Curry, e The Lord of the Rings and Philosophy, Tolkien foi um estudioso extremamente culto que refletiu profundamente sobre as Grandes Questões. Conta a lenda que, enquanto corrigia provas em um belo dia de verão, o professor de Oxford deparou-se com uma folha de papel em branco. Depois de se perder em pensamentos por algum tempo, Tolkien supostamente pegou a caneta e escreveu a famosa frase de abertura de O hobbit: “Em uma toca no chão vivia um hobbit.”

Peter Jackson — que os pelos de seus dedos dos pés nunca caiam! — voltou à cadeira de diretor para rodar O hobbit, depois de levar para casa um Oscar pela fantástica direção dos três filmes da série O Senhor dos anéis (2001-2003). Os hobbits podem ser pequenos, mas Jackson e a New Line Cinema estão investindo alto, esticando a história para outra trilogia, trazendo de volta grande parte do elenco de O senhor dos anéis e filmando em 3D. Após uma década incerta e tumultuada, os fãs da Terra-média poderão finalmente assistir ao mais recente episódio de Jackson sobre a maior fantasia épica de nosso tempo.

Nesta obra, nosso alegre grupo de filósofos compartilha o entusiasmo de Tolkien pelas questões filosóficas da “imensa antiguidade”, mas também mantém os “capuzes de festa removíveis” à mão. Acima de tudo, este é um livro escrito por fãs de Tolkien para os fãs de Tolkien. Como outros volumes da coleção Cultura pop, este procura usar a cultura popular como um gancho para ensinar e popularizar as ideias de grandes pensadores. Alguns dos capítulos exploram a filosofia de O hobbit — os principais valores e as conjecturas gerais que fornecem o pano de fundo moral e conceitual da história —, enquanto outros se valem de temas do livro para ilustrar diversos conceitos filosóficos. Nesse sentido, esperamos tanto explorar algumas das questões mais profundas de O hobbit, quanto ensinar filosofias poderosas.

Assim como os hobbits, nossos autores “têm um cabedal de sabedoria e frases sábias que a maioria dos homens nunca ouviu ou esqueceu há muito tempo”. Então, coloque seu melhor Velho Toby no cachimbo e pegue aquela garrafa especial de Velhos Vinhedos que você estava guardando para um momento especial. Será uma aventura e tanto.

(William Irwin - O Hobbit e a Filosofia)

publicado às 01:20

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