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A Fé morreu, quando todos deixaram de acreditar
 
Essa fé (a de hoje) é uma fé tola, cega, fútil. Ela merece os insultos ateístas a que se propõe. Ela é uma filha da medievidade pagã, ignóbil, fruto da fornicação de sua mãe com todas as práticas mitológicas a que foi penetrada, por puro prazer próprio.
Com essas mitologias sua mãe se deliciou em seu leito erótico, permitindo-se ser possuída de todas as formas, de todos os jeitos, e muito ria e muito se comprazia enquanto gerava essa fé de hoje.
Essa fé vendida aos templos evangélicos, protestantes, pentecostais, neo pentecostais, católicos. Uma luxúria desmedida. Ninguém percebe e se embriaga de sangue todo o dia, o tempo todo.
Dá-se o lixo, comem e se fartam. Dá-se o verme, deleitam-se e se baqueteiam. Pregam vaidades, profetizam mentiras; palavras vãs, fictícias; palavras persuasivas, aquelas desprezadas pelos apóstolos da bíblia. Eles não as usavam. Gabavam-se disso.
Mas hoje? Quem quer a palavra não persuasiva? Quem quer o pão que não perece? Os cultos são desfiles de vaidade; suas apresentações são corridas em busca de glórias e aplausos; seus hinos são de deleites sexuais. De Cristo fazem até símbolo para suas orgias pérfidas.
A lã e o couro são arrancadas e a ovelha, que parece até ser uma jumenta, tem que ser mantida para que volte a dar lã, para que engrosse couro outra vez. Assim mantém essa "fé", a falsa fé, seus frenéticos discípulos que correm atrás do vento. Se lambuzam com seus próprios vômitos. Não parecem ovelhas, mas cães.
Pleiteiam por louros, por coroas, por conquistas, e vendem a mesma ideia aos que os seguem, embora a esses não sobrando nada além do pó da poeira dos que lhes conduzem rumo ao inferno.
Quem atentará para a salvação? Quem estará imune dessa falsa fé vendida à promoção em todos os balcões evangélicos, gospeis, protestantes de hoje?
Que reforma foi feita? Uma construção da desconstrução? Um retorno abismo?
Por que pessoas assistem cultos vendidos, mensagem políticas, propósitos materialistas e mantém suas convenções intocáveis acreditando que elas lhes salvarão? De quê lhes salvarão? Do tormento que inventam em contrapartida ao gozo eterno que julgam um dia galgarem? Eu duvido que cheguem lá. No céu não entra a tolice, a ignorância, a insensatez, não. Não entra. Não entra nada lá que glorifique a futilidade de uma vida cristã superficial, desconectada de Deus e de sua palavra.
Quem disse que é assim como se vê nos cultos? Quem disse que a "alegria" sentida na reunião do movimento fervoroso é diferente da emoção sentida num gol de um time do torcedor fanático?
Quem disse que Deus se manifesta em choros, pulos, gritos e algazarras? Quem disse?
Quem disse que Deus pode ser sentido fisicamente? Quem disse?
Onde é que tem algum lugar tremendo por aí hoje?
Ai de vós, tolos que se julgam crentes, que buscam coisas dessa vida na outra vida, que buscam deleites no Cristo que por ti morreu.
Ai de vós que esperais respostas imediatas naquele que lhe mandou esperar e lhe avisou das aflições. Ai de vós, tolos que se julgam crentes.
Essa fé de fornicação é a filha de Jezabel. Tal mãe, tal é sua filha. Ambas são assenhoradas de promiscuidade e um terror sem igual as espera, bem como todos que com elas deitam para se deleitarem em suas delícias mundanas. Jezabel gerou sete montes de pecados e sobre eles ela se assenta. Sobre cada um desses montes ela se eleva até os céus onde espera o reconhecimento da sua glória. Mas ela será abatida até o mais profundo abismo, e sua morada não mais se verá. Será povoada por espíritos imundos que ali farão coito.
É assim que diz a bíblia. Pena que você não lê.

(Bispo Dozane)
Sarah Greenmore

publicado às 19:18


MITOS DA ECONOMIA DE CARÍCIAS

por Thynus, em 28.03.16

 

Carícias
 
A economia de carícias estrutura-se em uma série de
pensamentos distorcidos. Idéias que aparecem desqualificando
necessidades e desejos.
Mitos que a maioria das pessoas obedecem, sem ter consciência
que é apenas uma simples questão de obediência!
Aqui estão alguns desses mitos:

CARÍCIAS EXISTEM EM QUANTIDADES LIMITADAS, portanto,
economize carícias; somente dê carícias como um investimento,
sabendo que vai haver retorno!
— NÃO DÊ CARÍCIAS! Você pode acostumar mal as pessoas!
— NÃO PEÇA CARÍCIAS! Os outros vão perder o respeito por
você; ou, de que adianta? Ninguém vai compreendê-lo mesmo!
— NÃO ACEITE CARÍCIAS! A ÚNICA MANEIRA DE RECEBER
CARÍCIAS É FAZER COISAS PARA CONSEGUI-LAS. Não havendo troca
você vai acabar devendo favores... e aí as pessoas vão terminar
manipulando-o.
— QUEM ME AMA ADIVINHA O QUE EU ESTOU PRECISANDO!
Afeto pedido não tem o mesmo valor; aliás, acho que não tem
nenhum valor (só vale a carícia espontânea!).
— OS OUTROS SÃO MAIS IMPORTANTES DO QUE EU; pois
então, deverei estar atento para as necessidades dos outros e não as
minhas. Sempre primeiro os outros... senão estarei sendo egoísta, me
sentirei culpado.
— VOCE NÃO DEVE ELOGIAR-SE, afinal, isso é coisa de
gente convencida.
— NEM DEVE ELOGIAR OS OUTROS, pois eles já estão
cansados de saber de próprios méritos.
— NÃO FICA BEM ACEITAR ELOGIOS! Você deve ser modesto
(ou, ao menos, fingir que é!), senão poderão achá-lo convencido.
— NÃO REJEITAR CARICIAS (Mesmo que você não queira!) Se
alguém o ama, você tem que corresponder...!
— HOMEM NÃO PODE SER CUIDADO POR MULHER! Afinal de
contas, você É um homem e mais forte que ela ou não é'?
— HOMEM NÃO PODE SER CUIDADO POR HOMEM, senão
fica parecendo afeminado ou um derrotado!
— TEMOS QUE CRITICAR OS OUTROS PARA QUE ELES
MELHOREM SEMPRE.
— MULHER TEM QUE GANHAR CARÍCIAS PELA BELEZA,
INGENUIDADE, FRAGILIDADE E ESTUPIDEZ! Pois mulher que vence,
ou é vulgar ou lésbica... afinal, isso não é coisa para ela!
— QUANTO MENOS EU PRECISAR DOS OUTROS, MELHOR!
Precisar significa dependência, incompetência.
— VOCE NÃO DEVE DAR CARÍCIAS PARA SI MESMO. Se você
parecer mal cuidado, as pessoas vão ter pena de você e cuidarão de
você; ou: a sua opinião a respeito de si mesmo não vale muito, o
importante é o que os outros pensam.
— SEXO É A ÚNICA FORMA DE TROCAR CARÍCIAS. Se você
estiver sentindo-se só, arrume alguém para você transar.
— AFETO É A UNICA FORMA DE RECEBER CARÍCIAS. Você
tem que cuidar de mim!

Estes são alguns dos mitos que muita gente obedece, embora
cada um tenha o seu preferido.
Alguns dizem que não pensam assim; porém, observando-os,
percebemos claramente que obedecem a fortes crenças.
Percebe-se isso na maneira com que tratam os outros, com
que conversam ou tratam de si mesmos.
Ou até em suas reações a estes temas.

(ROBERTO SHINYASHIKI - A CARÍCIA ESSENCIAL, Uma psicologia do afeto)

publicado às 13:16


O inferno está vazio

por Thynus, em 28.03.16
Em sensu proprio, o dogma torna-se revoltante. Pois, em virtude das penas eternas do inferno, não apenas faz expiar com infindáveis martírios os erros ou até mesmo a falta de fé de uma vida que, na maioria das vezes, não chega aos vinte anos, mas também faz com que essa condenação quase universal constitua na verdade o efeito de um pecado original e, portanto, o resultado inevitável da primeira transgressão do homem. No entanto, de todo modo essa transgressão deveria ter sido prevista por aquele que, em primeiro lugar, não criou os homens melhores do que são, e depois lhes preparou uma armadilha, mesmo sabendo que nela cairiam, uma vez que tudo era obra sua e nada permanecia escondido às suas vistas. Sendo assim, ele teria evocado do nada para a existência um gênero humano fraco e sujeito ao pecado, para depois condená-lo ao martírio infindável. Por fim, há que se acrescentar que Deus, que prescreve a indulgência e o perdão a toda culpa até chegar ao amor pelo inimigo, não manifesta nenhum sentimento semelhante, mas cai em sentimentos opostos; isso porque uma pena, que sucede ao fim das coisas, quando tudo já passou e se concluiu, não pode ter como objetivo nem a melhora, nem a intimidação e, portanto, não passa de uma vingança. Visto por esse ângulo, chega a parecer que, na prática, todo o gênero humano tenha sido destinado e criado expressamente para a tortura e a condenação eternas — a não ser por aquelas poucas exceções que, não se sabe por quê, foram salvas pela escolha divina. Sem levar em conta tais casos, o querido Deus parece ter criado o mundo para que o diabo o carregasse; sendo assim, ele teria feito muito melhor se tivesse deixado de criá-lo.
 
 
Sobre o inferno e os seus horrores, escreveu S. Tomás de Aquino, o doutor angélico: "Aos bem-aventurados não se lhes deve tirar nada que pertença à perfeição. Mas cada coisa conhece-se melhor pela sua comparação com a contrária, uma vez que 'os contrários contrapostos entre si brilham mais'. E por isso, a fim de que a bem-aventurança dos santos os satisfaça mais e dêem por ela abundantes graças a Deus, concede-se-lhes que contemplem com toda a nitidez, perfeitamente, as penas dos ímpios." Quando se lê este texto e outros semelhantes, somos assaltados pela pergunta: como é que é possível esta barbaridade sádica? O inferno foi o maior polícia do mundo. Mas, por paradoxal que pareça, há nele também uma das expressões maiores da dignidade humana, na medida em que afirma até ao limite a liberdade e a exigência de justiça.
Na sua dramaticidade, o chamado dogma do inferno, que - note-se - não se encontra no Credo, quer dizer: és livre, não tens a salvação assegurada automaticamente, esta existência terrestre é séria, podes falhar radicalmente o sentido da tua vida. Pergunta-se, porém: será que alguém está de facto condenado no inferno ou virá a sê-lo?
Cada vez mais a teologia faz notar que não há "simetria" entre o céu e o inferno, pois enquanto a salvação é a consumação definitiva da existência humana pela graça de Deus, a condenação seria a consumação definitiva na negatividade operada pelo homem. Ora, o que é que pode querer dizer uma consumação definitiva na própria negatividade, um não a Deus, escolhido livremente, e que Deus levaria a uma espécie de plenitude e definitividade?
Por isso, o inferno só pode querer dizer a própria aniquilação. No caso-limite de haver realmente alguém que se fechasse radical, obstinada e definitivamente a todo o amor a Deus e às criaturas, excluindo Deus, então, não podendo, na morte, ser encontrado por Deus, porque O não aceita, anular-se-ia definitivamente: não participaria na vida eterna, mas também não seria eternamente torturado, pois, pela morte, simplesmente deixaria de existir, desaparecendo no nada.
Por um lado, como é que uma liberdade frágil e limitada no tempo pode merecer um castigo eterno? Por outro, quando se olha para a crueldade bruta da história e todos os infernos que os humanos causaram e causamos a outros humanos, sobretudo quando se trata de vítimas inocentes, entende-se que bem e mal não se identificam e, desde a raiz de nós, exigimos justiça. Mas o juízo final sobre o mundo pertence exclusivamente a Deus, e já foi pronunciado na morte e ressurreição de Jesus Cristo, tendo, por isso, o cristão a esperança fundada de que o juízo sobre cada homem e cada mulher e sobre a história é um juízo de misericórdia infinita. No fim, Deus virá ao nosso encontro para entregar-se plenamente a todos, embora segundo a capacidade de cada um, aquela medida para a qual, de qualquer modo, esta nossa existência histórico-mundana não será indiferente.

(Anselmo Borges - Janelas do (In)Visível)

publicado às 02:31


Poder e Mistério

por Thynus, em 28.03.16
É curioso: quando se fala em tentações, por princípio, o que vem logo à ideia é a tentação da carne, isto é, a tentação da sexualidade...
Ora, sintomaticamente, Jesus também foi tentado, mas nenhuma das tentações se refere ao sexo; as tentações estão todas em conexão com o poder, com o domínio.
Neste contexto, tenha-se presente o velho debate entre Freud e Adler: enquanto, segundo Freud, a pulsão humana fundamental está referida à libido e essencialmente ao prazer sexual, para Adler, essa pulsão tem a ver essencialmente com a auto-afirmação, com a vontade de poder. Ora, neste diferendo, é bem possível que seja Adler quem tem mais razão. Afinal, pensando bem, a própria sexualidade só constitui desvio quando alguém é utilizado como meio de prazer, quando a pessoa é instrumentalizada e coisificada.
A grande tentação da Igreja, ao longo da sua história, foi e é o poder. Talvez isso explique até por que é que, no catálogo dos pecados, o sexo teve não só o predomínio, mas pareceu inclusivamente, a um dado momento, deter a exclusividade do pecaminoso: no fundo, aninhava-se aí o medo de que o prazer subvertesse o poder...
Escreveu, com razão, Miguel Baptista Pereira: "Perdido o sentido do Mistério, (...) instala-se a 'indoutrinação' e a administração definitiva do Absoluto e consagra-se a intangibilidade dos seus burocratas, não fosse dilema humano o serviço do Mistério ou a vontade ilimitada de poder".
A tentação do poder nas igrejas é tanto mais perigosa e deletéria quanto pretendam controlar, aprisionar o Sagrado e o Divino. A Inquisição, que pode sempre continuar sob formas subtis, deriva da pretensão de dominar o Mistério. Quem julga deter o saber todo sobre Deus faz-se fatalmente inquisidor, no dia em que tenha do seu lado o poder político. (Diga-se, entre parêntesis, que foi também isso que aconteceu com os regimes comunistas, por exemplo: pensavam deter a ciência da história e controlavam completamente o poder político.) O pretenso saber total torna-se poder totalitário.
A novidade do Deus cristão é que ele renuncia ao poder. Se Deus viesse em majestade, os seres humanos ficaríamos arrasados, não poderia haver lugar para nós, o nosso destino só poderia ser a escravidão. Deus, porém, esvaziou-se de si mesmo, como diz S. Paulo, e fez-nos livres, para estabelecer connosco uma aliança. Com todas as consequências...
Isto significa que, se Deus não dispõe de nós, muito menos nós podemos dispor de Deus. Deus é Mistério indisponível. Quem julga dispor de Deus, seja de que modo for, não esquece apenas que a fé termina no Mistério e não nas fórmulas do dogma e que de Deus só sabemos o que ele não é. Corre sobretudo o risco de, com toda a desfaçatez, dispor dos homens e das mulheres... De facto, quem julga dispor de Deus por que é que não há-de dispor dos homens e das mulheres?

(Anselmo Borges - Janelas do (In)Visível)

publicado às 02:23


FILOSOFIA DO SÉCULO XX

por Thynus, em 28.03.16
Não teve grandes correntes filosóficas. Foram mantidas as reações ao Idealismo e, também, ao Positivismo. Na religião subsistem as teses de transcendência e imanência de Deus, ao lado de um pessimismo maior em relação a velhas teorias e com alguma ênfase no Existencialismo. Surgiu depois a Filosofia racional, com destaque de Freud, e a Filosofia da Religião. Várias outras correntes foram retomadas neste século: O neotomismo (São Tomaz de Aquino), a filosofia analítica ou empirismo lógico (Hume e Aristóteles), o neomarxismo e o neodarwinismo. O materialismo busca os pré-socráticos. O pensamento sofre uma mudança radical, mas não forma correntes de expressão marcantes, no aguardo de nova era.
 
BERGSON (1859/1940): -Foi original em muitas de suas idéias. Se conhecemos os objetos pelos conceitos, juizos, silogismos, análise e síntese, indução e dedução, temos também o conhecimento intrínsico, concreto e absoluto. O conhecimento por conceitos admite contrastes, enquanto que o conhecimento intuitivo nos mostra a realidade por dentro, como um super-intelecto, mas de forma simples. As teorias científicas. Mas só o conhecimento intuitivo nos traz o conhecimento concreto e metafísico.
 
1 - EXISTENCIALISMO:
Surge como reação ao Idealismo absoluto, mas mantendo a imanência e o pessimismo.
 
KIRKEGAARD (1813/1885): - Falou em buscar a verdade “de cada um” em lugar da verdade universal. Ressaltou a existência humana, como Buda. Tudo o que ocorria no homem (individualismo) se contrapunha à síntese da verdade universal de Hegel, para quem o indivíduo era parte de uma harmonia racional que anulava a própria individualidade de cada um, como característica fundamental. O homem é finito e faz parte de uma realidade infinita. Essa sua finitude é que o coloca diante dos fatos, inclusive aquele que a lógica não explica: a Fé. Oo homem deve raciocinar sózinho se Deus existe. Se quero entender Deus é porque não creio. Se não posso entendê-lo, preciso crer. Provar a existência de Deus pela razão é perder a nossa fé. Devemos simplesmente acreditar, ainda que racionalmente nos pareça absurdo, numa ”verdade”, à qual São Paulo já chamou de “loucura”. NIETZSCHE (1844/1900):- Foi ateista, nihilista e existencialista. Reagiu a Hegel e ao historicismo alemão. Tentou revalorizar tudo, inclusive a moral cristã. Para êle, o cristianismo e a filosofia voltaram para o céu (idéias). Sairam do mundo real, da terra. Pretendeu a educação superior da humanidade.
O homem se emancipa se recusar a Deus, que está morto. O homem é o animal mais forte porque é mais astuto, e o mais doente porque se desviou de seus instintos. Nenhuma religião conteve um dogma ou parábola verdadeiros. Nasceram da inquietação e da necessidade. O cristianismo é incrível debilitamento da vontade, manifesta a sua decadência apoiando-se no ressentimento dos humildes, eleva a ignorância à categoria de virtude, declara pecado a dúvida, defende tudo quanto é fraco ou pálido e corrompe o valor superior da intelectualidade. 
No seu livro “Anticristo” diz: A piedade é doentia, o unico cristão morreu na cruz com o seu evangelho. Se ensinou que o reino de Deus está no coração dos homens, traiu essa intuição ao colocar o nosso reino no além.
A razão e o psíquico estão a serviço da vida biológica. No livro Zaratustra, criou a metáfora do espírito que se transformou em camelo (tú deves), que se transformou no leão (eu quero), que se transformou na criança (eu sou). Essa liberdade traz a aurora de nova humanidade, alicerçada na grandeza do homem. É o nihilismo absoluto da existência humana.
O Nihilismo acabou com a metafísica, a religião e a moral. É a lógica da decadência. Ele foi inimigo da igualdade social, combateu a idéia de Deus e da religião, mas acabou criando, de certa forma, seus substitutos, quando falou em super-homem e “eterno retorno”. Não atacou diretamente a Jesus de Nazaré, mas o colocou contra o cristianismo, criado por Paulo. Negou a certeza da fé e da razão, o que é absurdo. Pelo Nhilismo, tudo é vazio, nada. Tudo o que é, poderia não ser. Mas Nietzsche afirmou que toda a verdade vem da vida. Esta seria, então, a verdade última, o absoluto de sua filosofia.
 
SARTRE (1901: - Foi ateu. Fez uma crítica radical e negativa do mundo humano. Sua maior obra “O ser e o nada” leva a teoria de Heidegger às últimas consequências, ou seja, a insignificância da experiência e ao absurdo da existência. A angústia daquele se transforma em náusea da natureza cuja beleza é ilusória. Nós e o próprio mundo somos absurdos e só um Deus poderia dar sentido a tudo isso, mas Deus não existe. Aceitando então a vida como alguma coisa sem lógica, êle derruba todos os valores sociais, morais e religiosos, às vezes com um cinismo desconcertante. Assim, como todos os modos de vida se equivalem, cada qual deve viver como quiser.
Chamou a isso de humanismo, que não corresponde ao sentido clássico do têrmo, no qual se almeja a realização plena e harmônica da natureza humana com a razão. Nem com o sentido cristão, pelo qual a natureza humana está em Deus. Nem com o sentido moderno da palavra, que celebra no mundo a divindade do homem. O humanismo de Sartre é heróico e trágico do homem sòzinho diante do nada, vivendo dores, angústias e desespêros.
 
2. FILOSOFIA RACIONAL:
Influenciaram-na os Papas Leão XIII e Pio IX. O valor do pensamento se transfere da filosofia para a história e as ciências. A ciência moderna, muito venerada por Kant, veio a ser muito atacada pelos cientistas contemporâneos, ao esboçarem novas concepções. Criticou-se até o conceito abstrato de Newton para o espaço e o tempo, agora substituido pela relatividade de Einstein.
 
NATURALISMO - DARWIN (1809/1882): - Foi contemporâneo de Marx e Freud. O naturalismo tem como realidade a natureza e os fenômenos. O homem é parte da natureza e deve estudar a partir dela e não de especulações racionais. As palavras-chave são: natureza, meio-ambiente, história, evolução e crescimento. Para Freud as ações dos homens vêm dos impulsos ou instintos animais. Darwin mostrou que o homem é produto de uma evolução biológoca. Procurou libertar-se da concepção cristã de criação do homem e dos animais. Cursou teologia mas se interessou mais por aves e insetos. Viajou o mundo e escreveu o seu livro: “A origem das espécies”.
Todas as plantas e animais descendem de formas mais primitivas. Para a Igreja, cada sêr havia sido criado como é, como para Platão e Aristóteles, para quem todas as espécies são imutáveis. Descobriu fosseis e esqueletos de animais. Os geólogos dizem que a terra sofreu várias catástrofes, como o diluvio de Noé, com destruição das vidas e nova criação, mais evoluida. E a terra tem bilhões de anos. Nas ilhas Galápagos, descobriu diferenças nos bicos das mesmas aves, conforme o meio-ambiente em que viviam, comendo comidas diferentes, às quais cada um se adaptou. Buscou um principio universal para a evolução de tudo. O homem tem modificado os animais e as plantas, com enxertos, domesticação, seleção dos mais fortes ou mais úteis, restrição ao crescimento da população etc. E a própria natureza também faz seleção natural das espécies, como as brigas entre os animais etc. Descobriu a seleção natural da luta pela vida. Os indios são mais escuros do que os nórdicos, com mais proteção solar.
As variações entre os individuos da mesma espécie são a matéria prima da evolução e a luta pela sobrevivência é a força responsável pela seleção dos mais fortes, ou que mais se adaptem ao meio. A Igreja reagiu, pois Deus teria feito os sêres como êles são. Mas Darwin afirmou, ainda, que, pela semelhança entre homens e macacos, ambos tiveram ancestrais comuns. O homem teria sido produzido pelas variações casuais, pouco explicadas. Ele pouco entendia de hereditariedade. Na reprodução das células, as duas novas metades podem sofrer alterações, às vezes insignificantes e às vezes importantes, nocivas ou benéficas, para que o homem tenha menos ou mais condições de luta pela sobrevivência.
O meio-ambiente também interfere no desenvolvimento do indivíduo, por adaptações às suas necessidades. Essas adaptações são de lei natural. O combate, p.ex., às ervas daninhas ou às bactérias ou doenças humanas, pode levar à criação de anti-corpos, que modificam o sêr, pelas resistências que criam. E a continuidade pode levar a conclusões perigosas. Por trás de cada planta ou animal existem milhões de anos. Os mais fracos ficaram pelo caminho. Assim, os passáros se separaram dos répteis, êstes dos anfíbios etc. É provavel até que a planta tenha se originado, em princípio, de alguma célula, que também gerou animais. A primeira célula viva pode ter surgido de matéria inorgânica. Plantas e animais possuem metabolismo e se reproduzem de forma autônoma. Tudo é governado pelo ácido desoxirribonucleico, hoje chamado DNA, ou molécula de onde vêm os cromossomos. Imaginou teorias da formação da vida, em bilhões de anos, pelas radiações solares sôbre a matéria inorgânica etc.
 
PSICANÁLISE - FREUD (1856/1939): Era neurologista. Estudou a mente, a psique humana, o inconsciente. Fundador da piscanálise, afirmou que Deus é uma ilusão infantil. Não acreditava na imortalidade e pretendeu substituir a religião pela ciência, por se tratar de neurose. Admirou Darwin, evulocionista e Schopenhauer, pessimista. O homem precisa de felicidade, deseja-a e faz fantasias.
Seria bom se houvesse um Deus criador do mundo, uma providência benevolente, uma ordem moral no universo e uma vida posterior. Por que a humanidade crê em algo que não existe?
Sua terapia tem o objetivo de libertar o homem de suas doenças psíquicas, com origem nas experiências da primeira infância. Se os homens só procurassem realizar seus desejos, se anulariam uns aos outros. E como a natureza é ameaçadora e “mãe”, eles se organizam e se defendem, para auto conservação. É a perpetuação do infantilismo, pois o homem precisa da proteção de “pai”, a quem teme, mas que também o protege, alimentando-o. Busca-o na natureza.
O homem é ser instintivo, inconscientemente. Dominar seus próprios conflitos (por exemplo: impulsos sexuais do subconsciente x probições e censuras conscientes) é tarefa constante. Quando não consegue, surgem as neuroses, os sonhos, as distrações, doenças mentais, criação de atos espirituais (arte, religião, metafisica,).
Freud criou o ego, o supergo e o id. O Ego é a consciência em contacto com a realidade que organiza a defesa, com base na experiência, opera a censura e representa a razão, a sabedoria, a percepção e a memória. O Id, inconsciente e hereditário, se constitui dos impulsos da libido, controla os instintos e se orienta para o prazer. E o Supergo, não hereditário, seria a moral e o conjunto de proibições, conscientes ou não. É consequência das regras impostas por pais ou educadores.
Com a psicanálise criou terapia para repressões da infância, através de análise dos sonhos e regressões, para esclarecer o inconsciente. Neurose é a fuga do adulto ao mundo infantil. Religião é só questão psicologica. É continuação das antigas magias e desembocará na ciência. É fuga da dura realidade da vida, por medo ou desejo de consolo. Cria deuses poderosos de temor e consolação, para banir os males e oferecer um ideal de vida.
Freud, porém, deu origem à religião nos complexos da infância, na busca permanente de pai oculto, como protetor. Substitui a fé em Deus pela fé na psicanálise, que não é convicção universal. Se podemos reprimir a sexualidade, não devemos reprimir a esperança e o sentido da vida. Ele não analisou outros caminhos para ideia de Deus. E o homem não é só psíquico. A psicanálise pode curar sentimento de culpa, mas não a própria culpa.
O homem conflita com o seu meio. Descobriu o universo dos impulsos que regem nossa vida. Não só a razão governa nossas ações. Há impulsos irracionais que determinam pensamentos, sonhos e ações. Trazem instintos e necessidades que se enraizam. O sexual é um deles. Podem vir disfarçados, para governar nossas ações mesmo sem nossa consciência. Muitos distúrbios psíquicos vêm de conflitos na infância. Por isso, buscou remexer na mente, para trazer êsses fatos à tona, bons ou maus, esquecidos. “Id” é o desejo, o sentido de prazer existente em nós. Os bebês não o controlam. São desinibidos com tudo e choram para reclamar. Os adultos vão aprendendo a controlá-los, através de seu ego. O homem pode querer algo que o meio não aceita e, então, procura reprimí-lo para continuar adaptado ao meio. Os pais e o meio repreendem os filhos, com o seu padrão de moral ou costume. E a criança, quando adulta, leva consigo essas censuras, que constituirão seu superego. Eles alertam o homem, a todo instante, como “não fazer isso”, porque, por exemplo, é feio. É um sentimento de culpa e, em grande parte, se relaciona com o sexo, que, no entanto, é coisa natural. Prazer x culpa. Neurose é êsse conflito, quando muito intenso. Por exemplo: A moça, que amava o cunhado, com a morte do marido, desejou-o. Porém, isso era hediondo e ela reprimiu o desejo, jogando-o para o subconsciente. Mais tarde, histérica, já não lembrava mais do fato. Ao lembrá-lo, com ajuda médica, curou-se. A consciência é parte da psique. Abaixo dela fica o subconsciente (ou inconsciente). Assim, tudo o que queremos esquecer (desagradável, repulsivo), jogamos para o porão de nosso subconsciente, e nos livramos disso. Só que êles continuam lá, latentes. A transferência também pode ser inconsciente. Mas, quando há desejo forte, essa luta de “esconder” é estressante, porque o próprio pensamento reprimido reage contra e vai pressionar de dentro para fora do subconsciente. Êste, pois, de certa forma, também guia nossas ações e sentimentos (Eu não tinha a intenção de fazer isso). Às vezes, aplicamos, sem querer, palavras de um pensamento reprimido... e acabamos pedindo desculpas. A essas incursões do subconsciente, no consciente, Freud chamou de “racionalizar”. Também, às vezes, projetamos nos outros o que reprimimos em nós mesmos. Nossa vida está cheia de ações inconscientes. Por isso, para evitar traumas, é bom manter-se quase aberto o caminho de expansão do sub-consciente.
A cura: deitado, falar tudo o que vier à cabeça, sem ordem, mesmo irrelevantes ou penosas. As associações do paciente trazem indícios de seus traumas e das resistências. Nos sonhos, nosso inconsciente tenta se comunicar com o consciente. Os sonhos mostram desejos. No adulto, porém, dada a repressão (mais fraca que quando acordado), êles se disfarçam, sendo necessário interpretá-los. Os mais profundos são os de época mais remota, como da infância. Se no sonho a moça dá ao rapaz dois balões de ar, isto pode significar que êle a quer, com seus dois seios. O embaraço causado pelo desejo, faz com que êle não o admita quando acordado. É o disfarce do desejo.
Freud influenciou muito na pintura do inicio do sec. XX (surrealismo). Para êle, todos somos artistas. Às vezes, quando escrevemos ou desenhamos, parece que aquilo não veio de nós. É a inspiração, ou seja, algo que conseguiu escapar do subconsciente, onde estava latente, de forma expontânea. Aí, o “medium”, no espiritismo, diz que “a mão é de um espírito”. Criatividade seria inter-ação entre razão e imaginação. Quando inspirados, com muitas idéias, se não censurarmos, entra a razão para fazer seleção entre essas idéias. E a inspiração se mescla com a razão e os sentimentos. Daí a arte. Nós só podemos ser mediuns de nosso próprio inconsciente (Freud). Falar pelo morto, psicografar ou falar outra língua é realce do inconsciente, que teve algo no passado. É bom ver essas coincidências com ceticismo. Uma associação de céticos, na Inglaterra, ofereceu bom dinheiro a quem provasse algo de sobrenatural. Ninguém provou. Pode ser que ainda não conheçamos todas as leis da natureza.
Em seu livro: “O futuro de uma ilusão”, publicado em 1927, Freud afirmou que considerava as doutrinas religiosas como “delírios da massa desamparada”.
 
3. FILOSOFIA DA RELIGIÃO:
O pensamento moderno não busca especìficamente a solução de problemas como a vida, a existência de Deus, a imortalidade da alma, a origem da natureza e do homem. Busca-a apenas no espírito humano como realidade contingente. A religião, e sobretudo o cristianismo, não substitui a filosofia, porque seus dogmas são mais intuitivos que racionais. A relação do homem com Deus, é colocada abaixo da razão humana, que se constituirá, no Título III dêste Livro, como um dos meios fundamentais para se alcançar a sabedoria a respeito daqueles mistérios. Se a inteligência é característica exclusiva do sêr humano, só ela pode analisar, coordenar tais conhecimentos e, por fim, demonstrar aqui, em conclusão, a verdade simples que está dentro do mundo.

( Laurindo Toretta - Deus, As Religiões e o Universo)

publicado às 01:51

O maior erro de Deus  

 
O cristão, em especial o cristão sacerdote, é um critério de valores. — — Ainda preciso dizer que em todo o Novo Testamento aparece uma única figura digna de respeito? Pilatos, o governador romano. Levar a sério uma questão entre judeus — ele não se persuade a fazer isso. Um judeu a mais ou a menos — que importa?... O nobre escárnio de um romano, ante o qual se comete um impudente abuso da palavra “verdade”, enriqueceu o Novo Testamento com a única frase que tem valor — que é sua crítica, até mesmo sua aniquilação: “que é a verdade?”... [João, 18, 38]

— Não é isso que nos diferencia, que não encontremos nenhum Deus, seja na história, seja na natureza ou por trás da natureza — mas sim que não experimentemos como “divino” o que foi venerado como Deus, e sim como miserável, como absurdo, como nocivo, não apenas como erro, mas como crime contra a vida... Negamos Deus como Deus... Se esse Deus dos cristãos nos fosse provado, creríamos nele menos ainda. — Numa fórmula: deus, qualem Paulus creavit, dei negatio [Deus, tal como Paulo o criou, é a negação de Deus]. — Uma religião como o cristianismo, que em nenhum ponto tem contato com a realidade, que desmorona tão logo a realidade afirma seu direito num só ponto que seja, deve naturalmente ser inimiga mortal da “sabedoria do mundo”, isto é, da ciência — aprovará todos os meios pelos quais a disciplina do espírito, a integridade e o rigor em ciências do espírito, a nobre liberdade e frieza do espírito puder ser envenenada, caluniada, desacreditada. A “fé” como imperativo é o veto contra a ciência — na prática, a mentira a todo custo... Paulo compreendeu que a mentira — que a “fé” era necessária; mais tarde a Igreja compreendeu Paulo. — O “Deus” que Paulo inventou, um Deus que “arruína” a “sabedoria do mundo” (em sentido estrito, as duas grandes adversárias de toda superstição, a filologia e a medicina), é, na verdade, apenas a resoluta decisão do próprio Paulo: chamar “Deus” sua própria vontade, torah [lei], isso é primordialmente judaico. Paulo quis arruinar a “sabedoria do mundo”: seus inimigos foram os bons filólogos e médicos de formação alexandrina — contra eles fez a guerra. Na verdade, não se é filólogo e médico sem ser também anticristão. Como filólogo, olha-se por trás dos “livros sagrados”; como médico, por trás da degeneração fisiológica do cristão típico. O médico diz “incurável”; o filólogo, “fraude”...

— Foi realmente compreendida a célebre história que se acha no início da Bíblia — a do medo infernal de Deus à ciência?...(Segundo Colli e Montinari, este § 48 se baseia nas páginas 310-36 do livro Prolegômenos à história de Israel, de Julius Wellhausen. Wellhausen (1844-1919) foi teólogo e orientalista de renome, autor de Prolegômenos à história de Israel e Resíduos do paganismo árabe. A publicação integral das anotações de Nietzsche (os chamados “fragmentos póstumos”) documentou essa influência. Os trechos dessas anotações relativos à leitura de Wellhausen foram traduzidos por Sánchez Pascual, nas notas à edição espanhola de O Anticristo (op. cit., pp. 127-30 e 145-6) Não foi compreendida. Esse livro sacerdotal par excellence tem início, como é natural, com a grande dificuldade interior do sacerdote: ele conhece apenas um grande perigo; portanto, “Deus” conhece apenas um grande perigo. — O velho Deus, todo “espírito”, todo sacerdote, todo perfeição, passeia em seu jardim; mas se entedia. Contra o tédio lutam os próprios deuses em vão.(“Contra o tédio lutam os próprios deuses em vão”: paródia de um famoso verso da peça A donzela de Orleans, de Schiller (ato III, cena 6)) Que faz ele? Inventa o homem — o homem distrai... Mas, vejam, também o homem se entedia. A misericórdia divina, em relação ao único problema de todos os paraísos, não tem limites: Deus criou outros animais. Primeiro erro divino: o homem não se distraiu com os outros animais — dominava-os, nem queria ser “animal”. — Por conseguinte, Deus criou a mulher. E, de fato, o tédio acabou então — mas outras coisas também! A mulher foi o segundo erro de Deus. — “A mulher é, por natureza, serpente, Heva”(A identificação de Eva com a serpente é tirada de uma nota na página 324 dos Prolegômenos, de Wellhausen. Mas Walter Kaufmann diz que, embora esta seja uma conhecida etimologia para o nome hebraico Havvah, nenhum dos termos dessa língua para “serpente” se parece com o nome. E uma nota da edição do Pontifício Instituto Bíblico (Ed.Paulinas, s. d. diz: “Eva: em hebraico vem de uma raiz que significa vida, viver” (nota a Gênesis, 3, 20)) — isso todo sacerdote sabe; “da mulher vem toda calamidade do mundo” — isso também sabe todo sacerdote. “Por conseguinte, dela também vem a ciência”... Foi somente pela mulher que o homem aprendeu a fruir da árvore do conhecimento. — Que acontecera? O velho Deus foi tomado de um medo infernal. O próprio homem se tornara seu maior erro, ele criara para si um rival, a ciência torna igual a Deus — acabam-se os sacerdotes e deuses, se o homem se torna científico! — Moral: a ciência é a coisa proibida em si — somente ela é proibida. A ciência é o primeiro pecado, o gérmen de todos os pecados, o pecado original. Apenas isso é moral. — “Não conhecerás”: — o resto resulta disso. — O medo infernal de Deus não o impediu de ser sagaz. Como defenderse da ciência? Este foi por muito tempo o seu grande problema. Resposta: fora do paraíso com o homem! A felicidade, a ociosidade leva a ter pensamentos — todo pensamento é um mau pensamento... O homem não deve pensar. — E o “sacerdote em si” inventa a penúria, a morte, a gravidez com perigo de morte, todo tipo de miséria, velhice, fadiga, sobretudo a doença — todos meios na luta contra a ciência! A penúria não permite ao homem pensar... E, no entanto, coisa horrível! A obra do conhecimento se ergue, tomando de assalto os céus, insinuando o fim dos deuses — que fazer? — O velho Deus inventa a guerra, separa os povos, faz com que os homens se aniquilem mutuamente (— os sacerdotes sempre necessitaram da guerra...). A guerra — entre outras coisas, uma grande perturbadora da ciência! — Incrível! O conhecimento, a emancipação do sacerdote, cresce apesar das guerras. — E o velho Deus toma uma decisão final: “o homem tornou-se científico — não adianta, é preciso afogá-lo!”...

— Já me compreenderam. O início da Bíblia contém toda a psicologia do sacerdote. — O sacerdote conhece apenas um grande perigo: a ciência — a sadia noção de causa e efeito. Mas a ciência prospera, em geral, apenas em circunstâncias felizes — é preciso ter tempo, ter espírito de sobra, a fim de “conhecer”... “Por conseguinte, é preciso tornar o homem infeliz” — esta foi, em todos os tempos, a lógica do sacerdote. — Já se percebe o que, conforme essa lógica, veio então ao mundo: — o “pecado”... A noção de culpa e castigo, toda a “ordem moral do mundo” foi fundada contra a ciência — contra o desligamento do homem em relação ao sacerdote... O homem não deve olhar para fora, deve olhar para dentro de si; não deve olhar para dentro das coisas de forma sagaz e cautelosa, como quem aprende, não deve absolutamente olhar: deve sofrer... Fora com os médicos! Um Salvador é necessário. — As noções de culpa e de castigo, incluindo a doutrina da “graça”, da “redenção”, do “perdão” — mentiras ao fim e ao cabo, sem nenhuma realidade psicológica —, foram inventadas para destruir o sentido causal do homem: são um atentado contra a noção de causa e efeito! — Não um atentado com o punho, com a faca, com honestidade no ódio e no amor! Mas a partir dos mais covardes, mais astutos, mais baixos instintos! Um atentado de sacerdote! Um atentado de parasita! Um vampirismo de pálidos, subterrâneos sanguessugas!... Quando as conseqüências naturais de um ato já não são “naturais”, mas tidas como causadas por fantasmas conceituais da superstição, por “Deus”, por “espíritos”, por “almas”, como conseqüências apenas “morais”, como prêmio, castigo, sinal, meio de educação, então o pressuposto para o conhecimento foi destruído — então foi cometido o maior crime contra a humanidade. — O pecado, diga-se mais uma vez, essa forma de autoviolação humana par excellence, foi inventado para tornar impossível a ciência, a cultura, toda elevação e nobreza do homem; o sacerdote domina mediante a invenção do pecado. —

— Neste ponto não me dispenso de oferecer uma psicologia da “fé”, dos “crentes”, em benefício justamente dos “crentes”. Se ainda hoje não faltam os que não sabem o quanto é indecente ser “crente” — ou um sinal de décadence, de alquebrada vontade de vida —, já amanhã eles saberão. Minha voz alcança também os duros de ouvido. — Se não entendi mal, parece que entre os cristãos há um critério de verdade que se chama “a prova da força”. “A fé torna bem-aventurado: logo, é verdade.” — Pode-se objetar, antes de tudo, que precisamente o tornar bem-aventurado não é provado, mas apenas prometido: a bem-aventurança é ligada à condição de “crer” — a pessoa deverá ser bem-aventurada porque crê... Mas que efetivamente ocorra o que o sacerdote promete ao crente para o “além”, que é inacessível a todo teste: como se prova isso? — Então a suposta “prova da força” é, no fundo, apenas mais uma fé de que não faltará o efeito que a pessoa se promete a partir da fé. Expresso numa fórmula: “eu creio que a fé torna bem-aventurado; — portanto, ela é verdadeira”. — Mas com isso já estamos no final. Esse “portanto” seria o próprio absurdo como critério de verdade. — Digamos, porém, com alguma indulgência, que a bem-aventurança através da fé seja provada — não apenas desejada, não somente prometida pela boca um tanto suspeita de um sacerdote: poderia a bem-aventurança — tecnicamente falando, o prazer — ser jamais uma prova da verdade? Tão pouco, que quase se tem a prova contrária, em todo caso, a suprema suspeita em relação a “verdade”, quando sentimentos de prazer intervêm na questão sobre “o que é verdadeiro”. A prova do “prazer” é uma prova de prazer — nada mais; onde, por tudo neste mundo, seria coisa assente que juízos verdadeiros agradam mais do que falsos e, conforme uma harmonia preestabelecida, necessariamente trazem consigo sentimentos agradáveis? — A experiência de todos os espíritos rigorosos, de índole profunda, ensina justamente o contrário.
Cada palmo de verdade teve de ser obtido com luta, por ela foi preciso abandonar quase tudo a que se apega o coração, o amor, a confiança na vida. Isso requer grandeza de alma: o serviço da verdade é o mais duro serviço. — Que significa, afinal, ter retidão em coisas do espírito? Ser rigoroso com seu coração, desprezar os “belos sentimentos”, fazer de cada Sim e Não uma questão de consciência! — — — A fé torna bem-aventurado: portanto, mente...

Que a fé torne bem-aventurado em certas circunstâncias, que a bemaventurança ainda não torne uma idéia fixa numa idéia verdadeira, que a fé não desloque montanhas, mas talvez coloque montanhas onde elas não existem: acerca disso uma rápida volta num manicômio esclarece a contento. Não um sacerdote, certamente: pois ele nega por instinto que doença seja doença, que hospício seja hospício. O cristianismo necessita da doença, mais ou menos como a cultura grega necessita de uma abundância de saúde — tornar doente é a genuína intenção oculta de todo o sistema de procedimentos de salvação da Igreja. E a Igreja mesma — não é o hospício católico(“católico”: no sentido primário (grego) de “universal”) como ideal derradeiro? — A própria Terra como hospício? — O homem religioso, tal como a Igreja o quer, é um típico décadent; o momento em que uma crise religiosa toma um povo é sempre marcado por epidemias nervosas; o “mundo interior” do homem religioso assemelha-se totalmente ao “mundo interior” dos superexcitados e esgotados; os estados “supremos”, que o cristianismo ergueu sobre a humanidade como valor entre todos os valores, são formas epileptóides — a Igreja canonizou apenas malucos ou grandes embusteiros in majorem dei honorem [para maior honra de Deus]... Uma vez me permiti designar todo o training [treinamento] cristão de penitência e salvação (que hoje é estudado da melhor maneira na Inglaterra) como uma folie circulaire [loucura circular](“folie circulaire”: expressão tirada de Dégénérescence et criminalité, de Charles Feré (Paris, 1888); cf. a seguinte anotação de Nietzsche, da primavera de 1888: “A monomania religiosa aparece habitualmente na forma da folie circulaire, com dois estados contraditórios, o da depressão e o da tonicidade” (vol. 13 de Colli e Montinari, p. 358). A expressão também é usada em Genealogia da moral, III) metodicamente produzida, claro que num solo já preparado para ela, ou seja, inteiramente mórbido. Ninguém é livre para tornar-se cristão: não se é “convertido” ao cristianismo — é preciso ser doente o bastante para isso... Nós, outros, que temos a coragem para a saúde e também para o desprezo, como poderíamos nós desprezar uma religião que ensina a desprezar o corpo! Que não quer desfazer-se da superstição da alma! Que faz da nutrição insuficiente um “mérito”! Que vê e combate na saúde uma espécie de inimigo, demônio, tentação! Que se convenceu de que é possível levar uma “alma perfeita” num corpo cadavérico, e para isso teve necessidade de aprontar um novo conceito de “perfeição”, um ente pálido, doentio, idiota-entusiasta chamado “santidade” — santidade, apenas uma série de sintomas do corpo empobrecido, enervado, incuravelmente corrompido!... O movimento cristão, enquanto movimento europeu, é desde o início um movimento geral dos elementos de refugo e dejeto de todo tipo: — esses querem chegar ao poder com o cristianismo. Ele não expressa o declínio de uma raça, é um agregado de formas de décadence de toda parte que se aglomeram e se buscam. Não foi, como se acredita, a corrupção da própria Antiguidade, da Antiguidade nobre, que o cristianismo possibilitou: não podemos desmentir com dureza bastante o douto idiotismo que ainda hoje sustenta algo assim. No tempo em que as camadas chandalas doentes, estragadas, cristianizavam-se em todo o império, o tipo oposto, a nobreza, estava presente em sua mais bela e madura forma. O grande número tornou-se senhor; o democratismo dos instintos cristãos venceu... O cristianismo não era “nacional”, não era determinado pela raça — dirigia-se a toda espécie de deserdados da vida, tinha seus aliados em toda parte. O cristianismo tem por base a rancune [o rancor] dos doentes, o instinto voltado contra os sadios, contra a saúde. Tudo que vingou, tudo de orgulhoso, de atrevido, a beleza sobretudo, faz-lhe mal aos olhos e ouvidos. Mais uma vez recordo as inestimáveis palavras de Paulo. “Deus escolheu as coisas fracas deste mundo, as coisas loucas deste mundo, as coisas vis e desprezíveis deste mundo”: eis a fórmula, in hoc signo(“in hoc signo”: citação parcial da frase In hoc signo vinces (“Com este sinal vencerás”), que teria surgido no ar, embaixo de uma cruz, ao imperador Constantino, e o teria levado a vencer uma batalha decisiva em 312 d. C.; Constantino foi o primeiro imperador romano a converter-se ao cristianismo; cf. Aurora, § 96.) venceu a décadence. — Deus na cruz — não se compreende ainda o terrível pensamento oculto por trás desse símbolo? — Tudo o que sofre, tudo o que está na cruz é divino... Todos nós estamos na cruz, portanto somos divinos... Somente nós somos divinos... O cristianismo foi uma vitória, uma mentalidade mais nobre sucumbiu a ele — o cristianismo foi, até agora, o grande infortúnio da humanidade. — —

O cristianismo também se acha em oposição a toda boa constituição intelectual — pode usar apenas a razão doente como razão cristã, toma o partido de tudo idiota, pronuncia a maldição contra o “espírito”, contra a superbia [soberba] do intelecto são. Como a doença é da essência do cristianismo, também o típico estado cristão, a “fé”, tem de ser uma forma de doença, todos os caminhos retos, honestos, científicos para o conhecimento têm de ser rejeitados como caminhos proibidos pela Igreja. A dúvida já é um pecado... A completa falta de asseio psicológico no sacerdote — que já se revela no olhar — é uma conseqüência da décadence —, deve-se observar nas mulheres histéricas, e também nas crianças de compleição raquítica, com que regularidade o fingimento por instinto, o prazer de mentir por mentir, a incapacidade de olhares e passos retos é expressão de décadence. “Fé” significa não querer saber o que é verdadeiro. O pietista, o sacerdote de ambos os sexos, é falso porque é doente: seu instinto exige que em nenhum ponto a verdade obtenha seu direito. “O que faz doente é bom; o que vem da plenitude, da abundância, do poder, é mau”: eis o modo de sentir do crente. Não ter escolha senão a mentira — nisso percebo quem é predestinado a teólogo. — Uma outra marca do teólogo é sua inaptidão para a filologia. Por filologia entendase aqui, em sentido bastante geral, a arte de ler bem — ser capaz de ler fatos sem falseá-los com interpretação, sem perder a cautela, paciência, a finura, no anseio de compreensão. Filologia como ephexis [indecisão] na interpretação: seja com livros, notícias de jornal, destinos ou dados meteorológicos — sem falar da “salvação da alma”... A maneira como um teólogo, não importa se em Roma ou Berlim, interpreta uma “palavra da Escritura” ou uma experiência, uma vitória do exército nacional, por exemplo, sob a elevada iluminação dos salmos de Davi, é sempre tão ousada que faz um filólogo subir pelas paredes. E o que deve ele fazer quando pietistas e outros ruminantes da Suábia convertem o miserável cotidiano e enfumaçado aposento de sua vida, com o dedo de Deus, num milagre de “graça”, de “providência”, de “experiências de salvação”? Um modestíssimo dispêndio de espírito, para não dizer de decência, levaria tais intérpretes a convencer-se da perfeita puerilidade e indignidade desse abuso do dedo divino. Mesmo com um mínimo de religiosidade no peito, um Deus que no instante certo cura um resfriado, ou que nos faz subir na carruagem quando começa uma tempestade, deveria nos parecer tão absurdo que teria de ser eliminado, ainda que existisse. Um Deus como doméstico, como carteiro, como calendarista(“calendarista”: Kalendermann — o sentido não é claro; a palavra alemã não se encontra em dicionários, e aqui nos limitamos a uma versão mais ou menos literal. Os demais tradutores oferecem: calendario, venditore d’almanacchi, faiseur d’almanachs, almanacmaker, calendar man, kalenderkenner (conhecedor de calendário)) — no fundo, uma palavra para designar o mais estúpido tipo de acaso... A “providência divina”, na qual um em cada três homens da “Alemanha douta” ainda hoje acredita, seria uma objeção a Deus, como não poderia ser imaginada mais forte. E, em todo caso, é uma objeção aos alemães!...
 
(Friedrich Nietzsche - O Anticristo — Maldição ao cristianismo e Ditirambos de Dionisio)

publicado às 08:06

— O destino do evangelho foi decidido com a morte — foi pendurado na “cruz”... Somente a morte, essa morte inesperada, ignóbil, somente a cruz, geralmente reservada para a canaille [canalha] — somente esse horrível paradoxo pôs os discípulos ante o verdadeiro enigma: “quem foi esse? o que foi isso?”. — O sentimento abalado e profundamente ofendido, a suspeita de que tal morte poderia ser a refutação de sua causa, a terrível interrogação “por que justamente assim?” — é um estado que se compreende muito bem. Tudo aí tinha de ser necessário, ter sentido, razão, suprema razão; o amor de um discípulo não conhece acaso. Apenas então o abismo se abriu: “quem o matou? quem era seu inimigo natural?” — essa questão irrompeu como um raio. Resposta: o judaísmo dominante, sua classe mais alta. Nesse instante sentiram-se em revolta contra a ordem, entenderam Jesus, em retrospecto, como em revolta contra a ordem. Até ali faltava, em seu quadro, esse traço guerreiro, essa característica de dizer o Não, fazer o Não; mais até, ele era o contrário disso. Evidentemente, a pequena comunidade não compreendeu o principal, o que havia de exemplar nessa forma de morrer, a liberdade, a superioridade sobre todo sentimento de ressentiment [ressentimento]: — sinal de como o entendia pouco! Jesus não podia querer outra coisa, com sua morte, senão dar publicamente a mais forte demonstração, a prova de sua doutrina... Mas seus discípulos estavam longe de perdoar essa morte — o que teria sido evangélico no mais alto sentido; ou mesmo de oferecerse para uma morte igual, com meiga e suave tranqüilidade no coração... Precisamente o sentimento mais “inevangélico”, a vingança, tornou a prevalecer. A questão não podia findar com essa morte: necessitava-se de “reparação”, “julgamento” (— e o que pode ser menos evangélico do que “reparação”, “castigo”, “levar a julgamento”!). Mais uma vez a expectativa popular de um Messias apareceu em primeiro plano; enxergou-se um momento histórico: o “reino de Deus” vai julgar seus inimigos... Mas com isso está tudo mal compreendido: o “reino de Deus” como ato final, como promessa! Mas o evangelho fora justamente a presença, a realização, a realidade desse “reino de Deus”... Pela primeira vez carregava-se todo o desprezo e amargor contra fariseus e teólogos para o tipo do mestre — tornando-o assim um fariseu e teólogo! Por outro lado, a frenética veneração dessas almas totalmente saídas dos eixos não mais tolerou a evangélica identificação de cada um como filho de Deus, que Jesus havia ensinado: sua vingança foi exaltar extravagantemente Jesus, destacá-lo de si: assim como os judeus de outrora, por vingança contra os inimigos, haviam separado de si e erguido às alturas o seu Deus. O único Deus e o único filho de Deus: ambos produtos do ressentiment...
 
— A partir de então houve um problema absurdo: “como podia Deus permitir isso?”. A perturbada razão da pequena comunidade deu-lhe uma resposta assustadoramente absurda: Deus deu seu filho em sacrifício para o perdão dos pecados. De uma só vez acabou-se o evangelho! O sacrifício expiatório, e em sua forma mais bárbara e repugnante, o sacrifício do inocente pelos pecados dos culpados! Que pavoroso paganismo! — Jesus havia abolido o próprio conceito de “culpa” — ele negou todo abismo entre Deus e homem, ele viveu essa unidade de Deus e homem como sua “boa nova”... E não como prerrogativa! — A partir de então entra no tipo do Redentor, passo a passo, a doutrina do julgamento e do retorno, a doutrina da morte como uma morte sacrificial, a doutrina da ressurreição, com a qual é escamoteado o conceito de “beatitude”, a única realidade do evangelho — em prol de um estado posterior à morte!... Com a insolência rabínica que sempre o caracteriza, Paulo racionalizou esta concepção, esta obscenidade de concepção, da seguinte forma: “se Cristo não ressuscitou de entre os mortos, é vã a nossa fé” [1Coríntios, 15, 14]. — E de uma só vez o evangelho se tornou a mais desprezível das promessas não realizáveis, a desavergonhada doutrina da imortalidade pessoal... O próprio Paulo ainda a ensinava como recompensa!...
 
Vê-se o que terminou com a morte na cruz: uma nova base, inteiramente original, para um movimento de paz budista, para uma real, não simplesmente prometida, felicidade na Terra. Pois é esta — como já destaquei — a diferença fundamental entre as duas religiões de décadence: o budismo não promete, mas cumpre, o cristianismo promete tudo, mas nada cumpre. — A “boa nova” foi imediatamente seguida pela pior de todas: a de Paulo. Em Paulo se incorpora o tipo contrário ao “portador da boa nova”, o gênio em matéria de ódio, na visão do ódio, na implacável lógica do ódio. O que não sacrificou ao ódio esse “disangelista”! Antes de tudo o Redentor: ele o pregou à sua cruz. A vida, o exemplo, a doutrina, a morte, o sentido e o direito de todo o evangelho — nada mais restou, quando esse falsário inspirado pelo ódio percebeu o que apenas ele podia necessitar. Não a realidade, não a verdade histórica!... E mais uma vez o instinto sacerdotal do judeu perpetrou o mesmo enorme crime contra a história — simplesmente riscou o ontem, o anteontem do cristianismo, inventando para si uma história do cristianismo inicial. Mais ainda: falseou a história de Israel mais uma vez, para que ela aparecesse como pré-história do seu ato: todos os profetas falaram do seu “Redentor”... Depois a Igreja falseou até a história da humanidade, tornando-a pré-história do cristianismo... O tipo do Redentor, a doutrina, a prática, a morte, o sentido da morte, até mesmo o após a morte — nada permaneceu intacto, nada permaneceu próximo da realidade. Paulo simplesmente deslocou o centro de gravidade de toda aquela existência para trás dessa existência — na mentira do Jesus “ressuscitado”. No fundo, ele não tinha necessidade da vida do Redentor — precisava da morte na cruz e alguma coisa mais... Ver como honesto um Paulo que tinha seu lar no principal centro do iluminismo estóico, quando ele faz de uma alucinação a prova de que o Redentor ainda vive, ou mesmo dar crédito ao relato de que teve essa alucinação, seria uma autêntica niaiserie [tolice] por parte de um psicólogo: Paulo quis os fins, portanto quis também os meios... O que ele mesmo não acreditava, acreditavam os idiotas aos quais lançou a sua doutrina. — Sua necessidade era o poder; com Paulo o sacerdote quis novamente chegar ao poder — ele tinha utilidade apenas para conceitos, doutrinas, símbolos com que são tiranizadas as massas, são formados os rebanhos. Qual a única coisa que Maomé tomaria depois ao cristianismo? A invenção de Paulo, seu meio para a tirania sacerdotal, para a formação de rebanho: a fé na imortalidade — ou seja, a doutrina do “Juízo”...

(Friedrich Nietzsche - O Anticristo — Maldição ao cristianismo e Ditirambos de Dionisio)


E daí se fosse blasfêmia a transexual na cruz?

publicado às 23:55

Não se acha, em toda a psicologia do “evangelho”, o conceito de culpa e castigo; nem o conceito de recompensa. O “pecado”, qualquer relação distanciada entre Deus e homem, está abolido — justamente isso é a “boa nova”. A beatitude não é prometida, não é ligada a condições: é a única realidade — o resto é signo para dela falar... A conseqüência de tal estado projeta-se numa nova prática, aquela propriamente evangélica. Não é uma “fé” que distingue o cristão: o cristão age, ele diferencia-se por agir diferentemente; por não oferecer resistência, em palavras ou no coração, àquele que é mau para com ele; por não fazer diferença entre forasteiros e nativos, entre judeus e não-judeus (“o próximo”, na verdade o correligionário, o judeu); por não encolerizar-se com ninguém, não menosprezar ninguém; por não se deixar ver nem invocar nos tribunais (“não jurar” [Mateus, 5, 34]); por não separar-se de sua mulher em nenhuma circunstância, mesmo havendo provas da infidelidade da mulher. — Tudo um princípio, no fundo; tudo conseqüência de um instinto. — A vida do Redentor não foi senão essa prática — sua morte também não foi senão isso... Ele não tinha mais necessidade de nenhuma fórmula, de nenhum rito para o trato com Deus — nem mesmo oração. Acertou contas com toda a doutrina judaica de penitência e reconciliação; sabe que apenas com a prática da vida alguém pode sentir-se “divino”, “bemaventurado”, “evangélico”, a qualquer momento um “filho de Deus”. Não a “penitência”, não a “oração pelo perdão” é um caminho para Deus: somente a prática evangélica conduz a Deus, ela justamente é Deus. — O que foi liquidado com o evangelho foi o judaísmo dos conceitos “pecado”, “perdão dos pecados”, “fé”, “redenção pela fé” — toda a doutrina eclesiástica judia foi negada na “boa nova”. O profundo instinto para como alguém deve viver a fim de sentir-se “no céu”, sentir-se “eterno”, enquanto, conduzindo-se de qualquer outro modo, não se sente absolutamente “no céu”: apenas esta é a realidade psicológica da “redenção”. — Uma nova conduta, não uma nova fé... 

(Friedrich Nietzsche - O Anticristo — Maldição ao cristianismo e Ditirambos de Dionisio)

publicado às 23:46


O que me importa é o tipo psicológico do Redentor. Afinal, ele pode estar contido nos evangelhos apesar dos evangelhos, ainda que mutilado ou carregado de traços alheios: como o de Francisco de Assis está conservado em suas lendas, apesar de suas lendas. Não a verdade quanto ao que fez, o que disse, como realmente morreu; mas a questão de o seu tipo ser concebível, de haver sido “transmitido”. As tentativas que conheço de extrair dos evangelhos até a história de uma “alma” me parecem provas de uma execrável leviandade psicológica. O senhor Renan, esse bufão in psychologicis [em coisas psicológicas], utilizou em sua explicação do tipo Jesus os dois conceitos mais inadequados que pode haver nesse caso: o de gênio e o de herói (“héros”). Se existe algo não evangélico, é o conceito de herói. Justamente o contrário de todo pelejar, de todo sentir-se-em-luta, tornou-se aí instinto: a incapacidade de resistência torna-se aí moral (“não resista ao mal” [Mateus, 5, 39], a frase mais profunda dos evangelhos, sua chave, em certo sentido), a beatitude na paz, na brandura, no não poder ser inimigo. Que significa “boa nova”? A vida verdadeira, a vida eterna foi encontrada — não é prometida, está aqui, está em vocês: como vida no amor, no amor sem subtração nem exclusão, sem distância. Cada um é filho de Deus — Jesus não reivindica nada apenas para si —, como filho de Deus cada um é igual ao outro... Fazer de Jesus um herói! — E que mal-entendido é sobretudo a palavra “gênio”! Nada de nosso conceito de “gênio”, um conceito de nossa cultura, tem algum sentido no mundo em que vive Jesus. Falando com o rigor do fisiólogo, caberia uma outra palavra aqui — a palavra “idiota”. Conhecemos um estado de doentia excitabilidade do tato, no qual se recua, tremendo, ante qualquer contato, qualquer apreensão de um objeto sólido. Traduza-se um tal habitus psicológico em sua lógica derradeira — como ódio instintivo a toda realidade, como refúgio no “inapreensível”, no “incompreensível”, como aversão a toda fórmula, todo conceito de tempo e lugar, ao que é sólido, costume, instituição, Igreja, como estar em casa num mundo que já não é tocado por espécie nenhuma de realidade, um mundo apenas “interior”, “verdadeiro”, “eterno”... “O reino de Deus está em vós”...  

 

(Friedrich Nietzsche - O Anticristo — Maldição ao cristianismo e Ditirambos de Dionisio)

publicado às 23:45


A ÉTICA COLETIVIZADA

por Thynus, em 24.03.16
Certas perguntas, ouvidas com frequência, não representam dúvidas filosóficas, mas confissões psicológicas. isto é particularmente verdade no campo da ética. E especialmente em discussões de ética que se deve revisar as próprias premissas (ou lembrá-las), e mais: deve-se aprender a revisar as premissas dos adversários.
Por exemplo, os objetivistas seguidamente ouvirão uma pergunta como esta: “O que será feito pelos pobres ou deficientes numa sociedade livre?” A premissa altruísta-coletivista, implícita nesta pergunta, é que os homens são “protetores de seus irmãos”, e que o infortúnio de alguns é uma hipoteca que recai sobre os outros, O questionador está ignorando ou fugindo das premissas básicas da ética Objetivista e tentando mudar a discussão para sua própria base coletivista. Observe que ele não pergunta: “Deve algo ser feito?”, mas: “O que será feito”, como se a premissa coletivista tivesse sido tacitamente aceita e tudo o que restasse fosse uma discussão dos meios para implementá-la.
Uma vez, quando Barbara Branden foi questionada por um estudante: “O que acontecerá aos pobres numa sociedade objetivista?” — ela respondeu: “Se você quiser ajudá-los, ninguém vai impedi-lo”.
Esta é a essência de toda a questão e um exemplo perfeito de como alguém recusa-se a aceitar as premissas de um adversário como a base da discussão.
Apenas os homens individualmente possuem o direito de decidir quando, ou se desejam ajudar os outros; a sociedade — como um sistema politico organizado — não possui nenhum direito no assunto.
Sobre a pergunta de quando e sob quais condições é moralmente adequado a um indivíduo ajudar aos outros, recomendo o discurso de Galt em A Revolta de Atlas. O que nos interessa aqui é a premissa coletivista de considerar esta questão como política, como um problema ou um dever da “sociedade com um todo”.
Já que a natureza não garante segurança automática, sucesso e sobrevivência para qualquer ser humano, somente a presunção ditatorial e o canibalismo moral do código altruísta-coletivista que permitem ao homem supor (ou fantasiar) que ele pode, por alguma razão, garantir esta segurança a alguns homens às custas de outros.
Se um homem reflete sobre o que a “sociedade” deve fazer pelo pobre, aceita com isso a premissa coletivista de que as vidas dos homens pertencem à sociedade, e que ele, como um membro desta, possui o direito de dispor deles, fixar seus objetivos ou planejar a “distribuição” de seus esforços.
Esta é a confissão psicológica inferida em tais perguntas e em muitas questões do mesmo tipo. Na melhor das hipóteses, revela o caos psico-epistemológico de um homem; revela uma falácia que pode ser chamada de “a falácia da abstração congelada” e que consiste em substituir uma determinada ideia concreta por uma ciasse abstrata mais ampla à qual pertença — neste caso, substituindo uma ética específica (altruísmo) pela abstração mais ampla da ética. Desse modo, um homem pode rejeitar a teoria do altruísmo e afirmar que aceitou um código racional — mas, ao não obter a integração das suas ideias, continua irrefletidamente tratando as questões éticas nos termos estabelecidos pelo altruísmo.
Com maior frequência, entretanto, esta confissão psicológica revela um mal mais profundo: quão extensamente o altruísmo corrói a capacidade dos homens de compreenderem o conceito de direitos ou o valor da vida de um indivíduo; revela uma mente da qual se apagou a realidade de um ser humano.
A humildade e a presunção são sempre dois lados da mesma premissa e sempre dividem a tarefa de completar o espaço deixado pela autoestima numa mentalidade coletivizada. Um homem que está disposto a servir como meio para os fins dos outros, necessariamente considerará estes como meio para seus fins. Quanto mais neurótico ou consciencioso for, na prática do altruísmo (e estes dois aspectos de sua psicologia atuarão reciprocamente para reforçar um ao outro), mais ele tentará planejar esquemas “para o bem do gênero humano ou da sociedade” “ou do público ou de gerações futuras” — ou de qualquer coisa, exceto seres humanos reais.
Daí o apavorante atrevimento com o qual os homens propõem, discutem e aceitam projetos humanitários que devem ser impostos por meios políticos, isto é, pela força sobre um número ilimitado de seres humanos. Se, de acordo com as caricaturas coletivistas, os ricos gananciosos se entregam disso juntamente ao luxo material — sob a premissa de “não se importar com o quanto custa” — então o progresso social trazido pelas mentalidades coletivizadas de hoje consiste em satisfazer um planejamento político altruísta sob a premissa de “não se importar com quantas vidas humanas custa”.
A marca característica dessas mentalidades é a defesa de algum objetivo público em grandiosa escala, sem considerar contexto, custos ou meios. Fora de contexto, este objetivo pode geralmente ser considerado desejável; deve ser público porque os custos não serão cobertos com recursos legítimos, mas sim com recursos expropriados, e um denso e asfixiante nevoeiro deve encobrir a questão dos meios — porque estes são vidas humanas.
“Medicare [Programa governamental de assistência médica especial para idosos. (N. T.)] ” é um exemplo desse projeto. “Não é desejável que os idosos devam ter assistência médica em momentos de doença?”, seus defensores clamam. Considerado fora de contexto, a resposta seria: sim, é desejável. Quem teria uma razão para dizer não? E é neste ponto que os processos mentais de um cérebro coletivizado são interrompidos; o resto é nevoeiro. Somente o desejo permanece em sua visão — é o bem, não é? — não é para mim mesmo, é para os outros, é para o público, para um público desamparado, doente,., O nevoeiro esconde fatos, como a escravização e, portanto, a destruição da ciência médica, a arregimentação e a desintegração de todos os consultórios médicos, o sacrifício da integridade profissional, da liberdade, das carreiras,  das ambições, das conquistas, da felicidade, das vidas dos próprios homens que devem prover este objetivo desejável — os médicos.
Após séculos de civilização, a maioria dos homens — com exceção dos criminosos — aprendeu que a atitude mental acima não se aplica a suas vidas privadas, nem na prática, nem moralmente, e não deve ser empregada na conquista dos objetivos particulares. Não haveria controvérsia a respeito do caráter moral de um jovem criminoso que declarara: “Não é desejável ter um iate, morar numa cobertura e beber champanha?” — e teimosamente recusa-se a considerar o fato de que ele roubou um banco e matou dois guardas para alcançar este objetivo “desejável”.
Não há diferença moral entre estes dois exemplos; o número de beneficiários não muda a natureza da ação, simplesmente aumenta o número de vítimas. Na verdade, o criminoso particular possui uma pequena vantagem moral: não tem o poder de devastar uma nação inteira, e suas vítimas não estão legalmente desarmadas.
A ética coletivizada do altruísmo afastou da marcha da civilização a visão que os homens têm de sua existência pública ou política, mantendo esta área como um reservatório, um santuário de vida ]selvagem, dominado pela selvageria pré-histórica. Embora os homens compreendam alguma fraca manifestação de respeito por direitos individuais em suas relações particulares uns com os outros, esta manifestação desaparece quando se voltam para questões publicas — e o que salta para a arena política é um homem das cavernas, que não pode conceber por qualquer razão o porquê da tribo não poder bater no crânio de qualquer indivíduo no caso de assim o desejar.
A característica que distingue esta mentalidade tribal é: o axiomático, a quase “instintiva” visão da vida humana como o alimento, combustível ou meio para qualquer projeto público.
Os exemplos desses projetos são inumeráveis: “Não é desejável acabar com as favelas?” (desconsiderando o contexto do que acontece àqueles na faixa de renda seguinte) — “Não é desejável ter cidades lindas e planejadas, todas num estilo harmonioso?” (desconsiderando o contexto da escolha de quem deve forçar estilos aos construtores de casas) — “Não é desejável ter um publico educado?” (desconsiderando o contexto de quem educará, o que será ensinado, e o que acontecerá aos dissidentes) — “Não é desejável liberar os artistas, os escritores, os compositores do fardo dos problemas financeiros e deixá-los livres para criarem?” (desconsiderando o contexto de perguntas como: quais artistas, escritores e compositores? — escolhidos por quem? — às custas de quem? — à custa dos artistas, escritores e compositores que não possuem influência política e cujos rendimentos miseravelmente precários serão taxados para “liberar” esta elite privilegiada?) — “A ciência não é desejável? Não é desejável para um homem conquistar o espaço?”.
E aqui chegamos à essência da irrealidade — a selvagem, cega, assustadora e sangrenta irrealidade — que motiva uma alma coletivizada.
A pergunta não-respondida e irrespondível sobre todos os seus objetivos “desejáveis” é: para quem? Desejos e objetivos pressupõem beneficiários. A ciência é desejável? Para quem? Não aos servos soviéticos que morrem de epidemia, sujeira, fome, terror e diante de pelotões de fuzilamento — enquanto alguns jovens brilhantes acenam a eles de cápsulas espaciais circulando sob seus chiqueiros humanos. E não ao pai americano que morreu de insuficiência cardíaca ocasionada por excesso de trabalho, lutando para enviar seu filho à faculdade — ou ao garoto que não pôde sustentar a faculdade — ou ao casal morto no desastre de um automóvel porque não pôde adquirir um carro novo — ou à mãe que perdeu seu filho porque não teve os recursos para mandá-lo ao melhor hospital — não para estas pessoas que pagam impostos para o sustento de nossa ciência subsidiada e projetos de pesquisa pública.
A ciência é um valor apenas porque desenvolve, enriquece e protege a vida do homem. Nada é um valor fora deste contexto, E a “vida do homem” significa as vidas únicas, específicas e insubstituíveis de cada homem individualmente.
A descoberta de novo conhecimento é um valor para os homens apenas quando e se eles são livres para usar e desfrutar os benefícios do previamente conhecido. Novas descobertas são um valor em potencial para todos os homens, mas não ao preço de sacrificar todos os seus valores reais. Um progresso estendido ao infinito que não traz benefício à ninguém, é uma coisa absurdamente monstruosa. E também o é a "conquista do espaço' ’ por alguns homens, quando e se for executada expropriando o trabalho de outros que são deixados sem meios para adquirir um par de sapatos.
O progresso pode advir apenas daquilo que sobra dos homens, isto é: do trabalho daqueles homens cuja habilidade produz mais do que o seu consumo pessoal requer, aqueles que são intelectual e financeiramente capazes de aventurar-se na busca do novo, O capitalismo é o único sistema onde homens são livres para agir, e onde o progresso é acompanhado, não por privações forçadas, mas por um aumento constante no nível geral de prosperidade, de consumo e de prazer da vida.
É apenas para a irrealidade congelada dentro de um cérebro coletivizado que as vidas humanas são intercambiáveis — e apenas este cérebro pode contemplar como “moral” ou “desejável” o sacrifício de gerações de homens vivos para os supostos benefícios que a ciência pública ou indústria pública ou acordos públicos trarão aos que estão por nascer.
A Rússia Soviética é a mais clara, mas não a única ilustração das conquistas da mentalidade coletivizada. Duas gerações de russos viveram, trabalharam e morreram na miséria, esperando pela abundância prometida por seus dirigentes, que suplicaram paciência e austeridade, enquanto construíam uma “industrialização” pública e matavam a esperança pública em prestações de cinco anos. No princípio, as pessoas morriam de fome esperando geradores elétricos e tratores; e hoje continuam morrendo de fome, enquanto esperam pela energia atômica e as viagens interplanetárias.
Esta espera não tem fim — os aproveitadores que ainda não nasceram desta chacina de sacrifício em massa, nunca nascerão — os animais de sacrifício simplesmente alimentarão novas hordas de animais de sacrifício — como a história de todos os tiranos tem demonstrado — enquanto os olhos desfocados de um cérebro coletivizado se fixarão, inalteráveis, e falarão de uma visão a serviço do gênero humano, misturando intercambiavelmente os defuntos do presente com os fantasmas do futuro, mas sem enxergar homens.
Assim é o status da realidade na alma de qualquer Milquetoast [Milquetoant: Caspar Milquetoast, personagem de quadrinhos criado pelo cartunista americano H, T, Webster; uma pessoa tímida, dócil e humilde, (N.T.)] que olha com inveja para as conquistas de industriais e sonhos de parques públicos lindos, os quais poderia criar se apenas as vidas, esforços e recursos de todos virassem em sua direção.
Todos os projetos públicos são mausoléus, nem sempre em formato, mas sempre em custos.
A próxima vez que você encontrar um destes sonhadores “com espírito público”, o qual lhe contará rancorosamente que “alguns objetivos muito desejáveis não podem ser atingidos sem a participação de todos”, diga-lhe que, se ele não puder obter a participação voluntária de todos, seus objetivos ainda serão excelentes, mas inatingíveis — e que as vidas dos homens não estão ã sua disposição.
E, se você desejar, dê-lhe o seguinte exemplo dos ideais que defende, Do ponto de vista médico, é possível retirar as córneas dos olhos de um homem imediatamente após sua morte e transplantá-las para os olhos de um outro, vivo, que é cego, restaurando assim a visão deste (em certos tipos de cegueira). Agora, de acordo com a ética coletivizada, isto traz um problema social. Deveríamos esperar até a morte de um homem para retirar seus olhos, quando outros homens precisam deles?
Deveríamos considerar os olhos de todos como propriedade pública e planejar “um método justo de distribuição”? Você defenderia a retirada de um olho de um homem vivo e dá-lo-ia a um cego, para então “igualá-los”? Não? Então não lute mais por questões sobre “projetos públicos” em uma sociedade livre. Você sabe a resposta. O princípio é o mesmo.


(Janeiro de 1963)
(Ayn Rand - A Virtude do Egoísmo - a verdadeira ética do homem: o egoísmo nacional)

publicado às 21:53

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