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Psicologia dos incendiários

por Thynus, em 30.07.14
A morte nas chamas é a menos solitária das mortes. É, verdadeiramente, uma morte cósmica, onde todo um universo se aniquila com o pensador. A fogueira é um companheiro de evolução.
G. BACHELARD, Psicanálise do fogo
Acidentes ou crimes? Os incêndios florestais foram muito numerosos durante o verão e o outono de 1970, e houve muitas coincidências para que não possa ver-se nisso alguma intenção de causar dano. Por isso o sociólogo Roger Caillois pôde recordar, em um artigo do Express de 31 de agosto de 1970, que em outros tempos houve em Roma outro incêndio e outros incendiários: aquele do qual se acusou aos cristãos, os quais esperavam, conforme suas escrituras secretas, um fogo purificador do homem, ao menos tal como eles imaginavam. Assim é como nos diz isso Roger Callois: «Dos incêndios que devastaram este verão o Var e os Alpes Marítimos, alguns eram criminais. Foram detidos alguns suspeitos. Houve alguns que confessaram, pior ainda, que se vangloriaram de serem os autores dos sinistros. Eram iluminados, que pretendiam obedecer as ordens de Deus. Com uma enorme fogueira purificaram Provença das indecências que a manchavam, das ignomínias que, cada dia mais numerosas e mais escandalosas, ofendiam gravemente à decência, a virtude e ao Céu».
E Roger Callois evoca a este respeito a mesma reação fanática dos cristãos de Roma: «Essas chamas que traduzem a vontade divina, e que consumam a aniquilação da Grande Prostituta, sem dúvida constitui um sacrilégio a combater [...] Além disso, não é inútil observar que os bairros consumidos foram os do Circo e do Palatino, onde se encontravam os templos mais antigos de Roma, o santuário que Sérvio Tulio consagrara à Lua, o de Hércules Redentor, dedicado pelo legendário Evandro, o aliado de Eneas, o de Júpiter Estator, consagrado por Rômulo, o de Vesta, que albergava os Penates do povo romano. Possivelmente não fora mais que uma coincidência, mas proclamava que se golpeava a Roma em seus deuses protetores, cuja impotência ao fim se demonstrou. Tácito proporciona um catálogo de todos os santuários destruídos...».
«Imaginam-se as reações que suscitaram os hippies ou os esquerdistas, durante os ofícios em Madeleine, ou em Notre-Dame, tiveram a ocorrência de romper ou pisotear os objetos de culto?...»
E isto, não obstante, era algo bastante freqüente durante os primeiros séculos. Eusébio da Cesaréia narra umas intervenções de «candidatos à mártires» penetrando em um templo quando um dignatário de Roma se dispunha a oferecer um sacrifício ou uma libação, opondo-se a isso retendo-lhe o braço, ou inclusive derrubando o altar com as brasas já acesas...
Renán, que para fazer-se perdoar seu Jesus, por ser muito heterodoxo para a época, toma a defesa dos cristãos, em seu Antéchrist rechaça com indignação a hipótese de que estes incendiassem a capital do Império romano. Mas os textos que enumera para tentar demonstrar como pôde a opinião pública da época orientar-se tão facilmente contra eles, a seu pesar irão além do que ele tentava estabelecer: «Possivelmente os discursos dos cristãos sobre a grande conflagração final, suas sinistras profecias, sua afeição por repetir que o mundo acabaria logo, e acabaria com fogo, contribuíram a fazer que tomasse por incendiários. Nem sequer é inadmissível que vários fiéis cometessem imprudências, e que se dispôs de pretextos para acusá-los de quererem, ao preludiar as chamas celestiais, justificar a todo custo seus oráculos». E afirma, teimoso, que eles não prenderam o fogo, «mas certamente se alegraram», dado que anunciavam sem cessar, e desejavam, a destruição da sociedade.
Eram, com efeito, como veremos logo, incendiários em potência, fanatizados incessantemente pelos mesmos temas da combustão final, purificadora e de uma vez probatória. Renán os qualifica de «incendiários do desejo». De desejo? Nós diríamos melhor: obcecados pelo incêndio. E aqui temos a prova. Tomemos o Novo Testamento:
«Toda árvore que não dê bom fruto será talhada e arrojada ao fogo...» (Mateus, 3, 10.)
«Queimará a palha em fogo inextinguível...» (Mateus, 3, 12.)
«Quem disser louco a seu próximo será réu do fogo da gehenna.;.» (Mateus, 5, 22.)
«Afastem-se de mim, malditos! Ao fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos...» (Mateus, 25, 41.)
«Quero lhes recordar [...] como Sodoma e Gomorra e as cidades vizinhas, que, de igual modo que elas, entregaram-se à impudicícia e aos vícios contra natureza, foram postas para castigo, sofrendo a pena do fogo eterno...» (Epístola de São Judas, 7.)
«Porque todos têm que ser salgados ao fogo!...» (Marcos, 9, 49.)
«Eu vim jogar fogo na terra, e o que posso desejar a não ser que acenda?...» (Lucas, 12, 49.)
«Sua obra ficará de manifesto, pois em seu dia o fogo o revelará...» (Paulo, I Epístola aos Coríntios, 3, 13.)
«Se uma terra produzir espinhos e abrolhos, é reprovada e está próxima a ser maldita, e seu fim será o fogo...» (Paulo, Epístola aos Hebreus, 6, 8.)
«Enquanto que os céus e a terra atuais estão reservados pela mesma palavra para o fogo, para o dia do julgamento e para a perdição dos homens ímpios...» (Pedro, II Epístola, 3, 7.)
«Tomou o anjo o incensário, encheu-o do fogo do altar e o jogou sobre a terra. E houve trovões, clamores, relâmpagos e tremores...» (Apocalipse, 8, 5.)
«E houve granizo e fogo misturado com sangue, que foi arrojado sobre a terra; e ficou abrasada a terceira parte da terra, e ficou abrasada a terceira parte das árvores, e toda a erva verde ficou abrasada...» (Apocalipse, 8, 7.)
«E os que montavam a cavalo tinham couraças de cor de fogo, e de jacinto e de enxofre [...] E da cabeça dos cavalos saía fogo, fumaça e enxofre...» (Apocalipse, 9, 17.)
«Com as três pragas pereceram a terceira parte dos homens, é ou seja, pelo fogo, e pela fumaça, e pelo enxofre que saía de sua boca...» (Apocalipse , 9, 18.)
«Vivos foram arrojados ambos ao lago de fogo, que arde com enxofre.» (Apocalipse, 19, 20.)
«A morte e o inferno foram jogados no lago de fogo. Esta é a segunda morte, o lago de fogo. E tudo o que não foi achado inscrito no livro da vida, foi arrojado no lago de fogo...» (Apocalipse, 20, 14-15.)
«Os covardes, os infiéis, os abomináveis, os homicidas, os fornicadores, os feiticeiros, os idólatras e todos os embusteiros terão sua parte no lago, que arde com fogo e enxofre, que é a segunda morte...» (Apocalipse, 21, 8.)
«E será atormentado com o fogo e o enxofre diante dos Santos anjos e diante do Cordeiro...» (Apocalipse, 14, 10.)
Encantador! E nós acrescentaremos: «Doce Jesus...».
Esse fogo e esse enxofre, que faz ainda mais dolorosa a queimadura do primeiro, através de todo esse conjunto tirado das escrituras se observa que constitui simplesmente uma obsessão no psiquismo dos cristãos. Falam deles, sonham neles, desejam-nos, são verdadeiros exutórios de seu ódio, que deriva inconscientemente de seu isolamento, inevitável na sociedade de sua época.
São, de fato, autênticos pirômanos, mas pirômanos raciocinados e conscientes.
Aqui cederemos a palavra ao Gastón Bachelard, em sua penetrante Psicanálise do fogo:
«A psiquiatria moderna elucidou a psicologia do incendiário. Demonstrou o caráter sexual de suas tendências. Reciprocamente, tirou à luz o grave traumatismo que pode receber um psiquismo ante a visão de um moinho ou um teto incendiados, de uma grande labareda sobre o céu noturno, na infinidade da planície lavrada.
»Quase sempre, o incêndio nos campos é a enfermidade de um pastor. Como portadores de sinistras tochas, os homens da miséria transmitem de geração em geração o contágio de seus sonhos de isolados. Um incêndio determina um incendiário quase tão fatalmente como um incendiário provoca um incêndio. O fogo se incuba em uma alma com mais segurança que sob as cinzas.
»O incendiário é o mais dissimulado dos criminosos. No asilo de Saint-Ylie, o incendiário mais característico é muito serviçal. Só há uma coisa que pretende não saber fazer: acender uma estufa! Além da psiquiatria, a psicanálise clássica estudou profundamente os sonhos de fogo. Encontram-se entre os mais claros, mais nítidos, cuja interpretação sexual é mais segura. Não insistiremos, pois, sobre este tema.
»De fato, voltando para problema do fogo, a psiquiatria reconheceu a freqüência dos sonhos de fogo nos delírios alcoólicos. Demonstrou que as alucinações liliputienses se achavam sob a dependência da excitação pelo álcool.»
Resumamos, pois, as causas profundas que criam ao pirômano:
a) rechaço sexual, suscitado por um puritanismo ardente, a vergonha da sexualidade, da nudez, e que conduz a uma intoxicação físico-psíquica pela não eliminação espermática. Esse seria o caso dos solitários (pastores, ascetas, etc.), ou dos puritanos; é o caso dos cristãos dos primeiros séculos; observar-se-á, além disso, que a piromania é uma tara essencialmente masculina. Isto explica o seguinte: a mulher, designada esotericamente como Água, tem medo do Fogo. O homem, designado por este elemento, converte-se em possesso senão o eliminar. Bachelard aproximou-se deste mistério;
b) traumatismo psíquico, provocado pela contemplação de um incêndio. Este é o caso do bombeiro pirômano, quão mesmo o do rebelde zelote que viu arder sua casa, seu povo. Também
é o caso do pastor solitário, perdido na contemplação de seu fogo de lenha, ao longo das estações. E também o daquele que permaneceu em um certo infantilismo, e que admira as chamas. A este respeito, o cristão dos primeiros séculos, impregnado pela leitura ou a audição de suas Escrituras «incendiárias», é um pirômano em potência, condicionado por essas entrevistas;
c) Impregnação alcoólica, como era o caso de certos cristãos no curso dos ágapes rituais. Escutemos ao Paulo: «E quando lhes reúnem, não é para comer o jantar do Senhor, porque cada um se adianta a tomar seu próprio jantar, e enquanto a gente passa fome, outro está ébrio». (Paulo, I Epístola aos Coríntios, 11, 20-21.) E Judas, em sua única carta, dirá o mesmo: «Estes são os que mancham seus ágapes, quando com vós banqueteiam sem recato, homens que se apascentam a si mesmos». (Epístola de São Judas, 12.)
Como alguns se mostrarão remissos a admitir que a embriaguez esteve à ordem do dia nos piedosos «ágapes» dos primeiros séculos, limitaremos a lhes assinalar este comunicado da Cidade do Vaticano, com data da segunda-feira 26 de outubro de 1970, e reproduzido ao dia seguinte no periódico France-Soir: «Umas pinturas murais inconvenientes foram descobertas este ano nas catacumbas de Roma. Mostram aos primeiros cristãos bebendo e festejando durante uns funerais. Ao revelar no sábado este descobrimento, o Osservatore Romano, órgão do Vaticano, sublinha que essas pinturas não têm nada em comum com outros afrescos cujo tema é a celebração da missa por cristãos reunidos ao redor de uma mesa. O “inconveniente” para o Osservatore Romano é em especial “a abundância de garrafas em pé ou tombadas” representadas nessas cenas de banquete».
Evidentemente, nós gostaríamos de saber o que evoca o termo «em especial».
Convém observar, por certo, que tampouco Jesus escapou jamais a essa reputação. Lemos, por exemplo, o seguinte nos evangelhos canônicos: «Porque veio João, que não comia nem bebia, e diziam: Está possuído pelo demônio [...] E veio o Filho do Homem, comendo e bebendo, e dizem: É comilão e bebedor de vinho, amigo de publicanos e de pecadores». (Mateus, 11, 18, e Lucas, 7, 33.)
São Jerônimo, em seu Vulgata latina, versão oficial da Igreja católica, emprega o termo potator, que significa «saco de vinho». Mas é evidente que uma reputação, embora ampliada ou exagerada, necessariamente tem um fundo de verdade. Que Jerônimo utilizasse os termos de
comedor e bêbado posto em boca dos adversários de Jesus implica, no melhor dos casos, que comia exageradamente e bebia na mesma proporção. Coisa que não é própria da vida ascética para a que propõe a ele sempre como modelo.
Esta obsessão do fogo impregnará durante séculos às pessoas da Igreja pelos mesmos motivos. E assim o monge Bernard Gui, inquisidor, que viveu do ano 1261 aos 1331, e autor da célebre Pratica officii Inquisitionis herético pravitatis, declara em tal tratado, verdadeiro manual do inquisidor: «A finalidade da Inquisição é a destruição da heresia. A heresia não pode ser destruída sem que os hereges o sejam também, e isso não pode fazer-se mas sim de duas maneiras: mediante sua conversão ou mediante a incineração carnal atrás de seu abandono ao braço secular».
Mas foi sobretudo no século XV, na Espanha, onde o fogo purificador e corretivo recebeu uma aplicação quase litúrgica.
As incinerações dos hereges, dos judeus, dos ocultistas, foram qualificadas de autos de fé. Houve holocaustos destes cada ano, a data fixa. A essas execuções entre as chamas, e de periodicidade anual, as chamou autos de fé particulares. Por exemplo, na sexta-feira de Quaresma que precedia à Sexta-feira Santa celebrava-se com uma execução deste tipo. Aqui não se tratava já, portanto, de uma execução judicial, mas sim de um sacrifício humano, de um holocausto de propiciação.
Houve deste modo autos de fé gerais, com ocasião do advento dos soberanos, de seu matrimônio, do nascimento de cada um de seus filhos. Algumas dessas cerimônias em várias cidades da Espanha ao mesmo tempo podiam permitir a incineração de uma centena de condenados. Em Sevilha estabeleceu-se ao efeito, fora da cidade, um patíbulo permanente, de pedra, sobre o que se erguiam quatro estátuas, em honra aos quatro evangelistas. Essas estátuas estavam ocas, e tinham um nicho em seu interior. Dentro delas se encerrava, devidamente encadeadas, às vítimas, às quais assim se queimavam a fogo lento, amontoando lenha ao redor da estátua oca.
Só na Espanha, a Inquisição fez queimar de 1480 a 1808 a 34.638 pessoas. O número das que morreram antes em sua masmorra, a conseqüência da tortura, ou que conseguiram felizmente evadir-se, e que foram incineradas em efígie, eleva-se a 18.049 pessoas. (Cf. J. Francais, L'Église
et la Sorcellerie.)
Para o resto da Europa é difícil dar uma cifra. Sabemos, não obstante, por Barthélémy de Spins (cf. Quoestio de Strygibus, 1523, e In Ponz inibiu, in de Lamis Apologia, S. d.), que só na província de Lombardia se queimou aproximadamente um milhar de mulheres das que se suspeitava que eram bruxas, cada ano, durante vinte e cinco anos. Isto supõe vinte e cinco mil mulheres em um quarto de século.
Ao enxofre por associa-lo ao fogo, conforme às Sagradas Escrituras, já que se revestia aos condenados com uma camisa lubrificada de enxofre, colocava-lhes uma mitra de pergaminho, também melada de enxofre, e o corpo também era lubrificado previamente com uma pomada de enxofre, sobre a base de banha de porco.
Assim, ao aliar o enxofre com o fogo, os juízes eclesiásticos obedeciam às prescrições do santo livro do Apocalipse, do que se proclamou autor Jesus: «Revelação de Jesus Cristo, que Deus lhe confiou para manifestar a seus servos o que tem que sobrevir breve [...] Bem-aventurado o que lê e os que ouvem as palavras da profecia, e os que observam as coisas nela escritas, porque o tempo está próximo». (Apocalipse, 1, 1 e 3.)
Estas coisas nossos inquisidores as conservavam piedosamente em seu coração. Por isso, quando as chamas das fogueiras alcançavam por fim o corpo do condenado, faziam-no sobre queimaduras já profundas, causadas pela repentina combustão da mitra e da camisa de enxofre, avivando assim as primeiras queimaduras.
Fazendo-o assim, não podia dizer-se que os versículos já citados do Apocalipse não afetassem àqueles aos que foram dirigidos. A profecia era verídica, ao menos no plano terrestre.
De tudo o que precede podemos tirar agora uma conclusão, ou seja, que essa obsessão pelo enxofre e o fogo, esses quadros grandiosos e trágicos, nos quais, como um afresco dantesco, pintava-se a destruição do velho mundo mediante um gigantesco incêndio, tudo isso condicionou criminalmente à fração fanática do cristianismo, e foram, efetivamente, cristãos os que, cheios de ódio, incendiaram Roma.
Há alusões bastante claras para aquele que possua a suficiente intuição e perspicácia para penetrar, como um juiz de instrução, nas intenções que moviam a um escriba.
A confissão inconsciente de Simão-Pedro, supostamente morto em Roma no ano 64, ou mas
bem daquele que, sob seu nome, redigiria mais sua tarde a primeira epístola, temo-la no quarto capítulo desta: «Não sintam saudades desse incêndio que arde em meio de vós, ordenado a sua prova». (I Epístola de são Pedro, 4, 12.)
As versões de Segond, Osterwaid, Synodale, falam de uma fogueira, mas é o mesmo. Mas essa alusão a um perigo pelo fogo, para os cristãos, demonstra que Simão-Pedro não foi o autor dessa Epístola. Porque se morreu em Roma no ano 64, imediatamente depois do incêndio e da primeira perseguição que se abateu sobre a comunidade cristã da cidade, não teve tempo de redigir essa carta, destinada a ser copiada em múltiplos exemplares, já que ia dirigida aos escolhidos estrangeiros da dispersão no Ponto, Galacia, Capadocia, Ásia e Bitinia». (Op. cit., 1, 1.) A polícia romana não teria permitido que saísse.
E não podia falar antes de um perigo pelo fogo, já que ignorava que depois do incêndio Roma castigaria pelo fogo aos cristãos de tal cidade, segundo a lei que castigava aos incendiários.
Em realidade, a epístola foi redigida muito depois da segunda metade do século II, quer dizer depois do ano 150. Esta é também a opinião de Charles Guignebert, que observa que não se trata a não ser de uma simples repetição das teorias de Paulo, o que prova que é posterior à estas.
Mas esta epístola, atribuída falsamente ao Simão-Pedro, não só alude ao perigo de morte por fogo que ameaça aos cristãos, mas também implica para estes uma reputação de incendiários: «Porque nenhum de vós tem que padecer como homicida ou ladrão, ou malfeitor, ou como intrometido no alheio mas se padecer como cristão, não se envergonhe, antes glorifique a Deus neste nome». (I Epístola de são Pedro, 4, 15-16.)
É fácil constatar que, uma vez eliminados os diversos modos de cometer maldades correntes, não fica aos cristãos mais que um só campo onde possam machucar aos pagãos, o de incendiários.
E este epíteto permanecerá tão bem ligado à qualificação de christiani, que muito tempo depois do incêndio do ano 64, continuará qualificando-se à estes de sarmentara, sarmentici, quer dizer, «que cheiram a heresia», e de semaxii: «pilares de fogueiras» (cf. Tertuliano, Apologeticen, 50). Porque se todas as atividades que possam causar dano evocadas na epístola estão proibidas aos cristãos, em troca não os proíbem o incêndio, já que este último está previsto pelas profecias, e fazendo-se incendiário atuará «pela glória de Deus».
Releiamos uma vez mais ao sombrio Tertuliano: «Estamos em todas partes, somos numerosos [...] Se não fôssemos a não ser tão somente um pequeno grupo, uma só noite e algumas tochas nos bastariam!». (Cf. Tertuliano, Apologeticen, XXXVII, 3.)
Por nossa parte, está entendido.

(Robert Ambelain - O Homem que criou Jesus Cristo)

publicado às 14:32


Homossexualidade é antinatura

por Thynus, em 29.07.14
Apesar de me considerar uma miúda bastante destemida, há coisas que me causam algum pavor. Não gosto de nadar em sítios onde não vejo o fundo e sentir a vegetação fazer-me cócegas nas pernas. Nunca se sabe o que habita as profundezas escuras e inóspitas dos mares e rios deste mundo! Os mitos existem e talvez  não sejam infundados. Também tenho horror aos argumentos do tipo “é a natureza”/“é antinatura”, a que segue, regra geral, um olhar de superioridade. Como no dia-a-dia sou confrontada com este medo, gostava de o ultrapassar. O primeiro é mais simples, eu escolho onde vou nadar.
Na verdade eu sei de onde vem o meu medo. O meu medo vem do meu desconhecimento (não confundir com inconseguimento) em relação à natureza. Só sei que nada sei, e no que diz respeito à natureza isso é bem verdade. Há muita coisa na natureza que não compreendo e, portanto, usá-la como explicação para as coisas sociais é-me impossível. Senão vejamos. A Tocha vive em casa dos meus pais há imensos anos, está velha e gorda. Sempre foi esquisita com a comida, aquela cadela! Lembro-me de lhe oferecer pão com manteiga e o que é que ela fazia? Lambia a manteiga e deixava o pão. E o que é que ela adorava? A Tocha sempre correu atrás dos dejetos dos outros cães. A alegria daquela cadela sempre que no passeio de fim de tarde nos cruzávamos com cocó! Não compreendo, mas a natureza é assim. Que o diga George Murray Levick.
“É a natureza!” é a justificação que mais vezes oiço quando as pessoas querem defender a heterossexualidade, elevando a homossexualidade ao estatuto de aberração ou acto nonsense. À falta de mais argumentos, arremessam-me sem dó nem piedade: “isso é antinatura!” Fico desconcertada, o horror invade-me o corpo. Penso na natureza que me rodeia, penso na Tocha e pergunto-me, mas de que natureza estarão estas pessoas a falar!? A Tocha gosta de cheirar e, por que não ser completamente honesta, mordiscar cocó alheio. E os homens e as mulheres não podem amar alguém do seu sexo? Definitivamente, não compreendo a natureza.
O que é “antinatura” é uma gravidez entre pessoas do mesmo sexo, especialmente se forem homens. Mas será que os homossexuais pensam que se insistirem nas relações coitais a cegonha vai trazer-lhes um bebé? Na verdade nunca vi nenhum gay ou lésbica questionar aquelas cronistas que ajudam as pessoas a resolver os seus problemas íntimos: “há meses que tenho sexo anal com o meu companheiro e ainda não engravidei, devo consultar um ginecologista especialista em problemas de fertilidade?” Talvez eles tenham sexo mesmo sabendo que não vão engravidar a seguir.
“Naturais” são os rituais de acasalamento. Alguns animais emitem sons para nós absurdos, outros encenam danças à volta da presa. Estes últimos são mais parecidos connosco, humanos. Eu já fui interpelada por homo/hétero/bissexuais e todos se assemelham na forma como tentam seduzir o objecto de desejo. Apesar de já ter ouvido rumores sobre os homossexuais como horríveis predadores e molestadores, diz-me a experiência que somos todos muito iguais. Tudo tende a ser feito com cuidado para não afugentar aquilo que se quer. De resto, a bestialidade está distribuída em iguais proporções por todos, homo ou hétero.

( Elisabete Rodrigues)

publicado às 03:13


Celibato do Padre

por Thynus, em 29.07.14

Não há História, seja de qualquer dinastia asiática ou européia, por mais devassa que tenha sido, do que a História dos Papas, que ocuparam a famosa cadeira de Pedro.
Mais adiante, numa resenha que faremos, salientaremos somente algumas dúzias de verdadeiros Paxás da Turquia, que fizeram do Vaticano o maior harém conhecido e onde os crimes de defloramentos, de incestos, de pederastia não encontram paridade com os praticados nos maiores lupanares da Roma antiga.
Há mesmo no Vaticano, junto aos aposentos particulares do Papa, uma escadaria subterrânea para acesso de pessoas mais íntimas, que não passam pelas portas protocolares.
Não há quem não conheça a história de Lucrécia Bórgia e da Papisa Joana, que deu à luz em plena procissão. O escândalo foi de tal ordem que a Congregação dos Ritos teve de criar a Cadeira furada, na qual teriam de se sentar futuros papas, para o reconhecimento, em pleno cerimonial da sua máscula personalidade. Dizem mesmo, mas não garantimos, que eram pronunciadas as seguintes palavras, acompanhadas por órgãos e cantochão: "Em quan... ti... da... de... Amém!".
Onze séculos após a morte do pobre Cristo, o escândalo público era de tal ordem, não só internamente, como entre o clero civil, que o papa Hildebrando foi forçado a decretar o Celibato do padre.
Após uma série de peripécias, a Igreja, ora permitindo aos que fossem casados residirem com suas esposas e filhos, de acordo com a recomendação de São Paulo, era proibida a convivência sob o mesmo teto, ora permitindo a concubinagem aos celibatários, ora proibindo, ora substituindo-a pela convivência com dois noviços, ora com um só, ora anulando esse pernicioso costume, nos dá uma idéia do espírito de dissolução que sempre reinou no Vaticano.
O voto de celibato, na opinião de Estanislau Orichorius, cônego na Catedral de Premislaw, citado por M. Gregóire, bispo de Blois, em sua obra Histoire des mariages des prêtres (1826), é idêntico ao voto que ele tivesse feito de tocar o céu com o dedo, pois tal voto não o obriga a coisa alguma.
Valham-nos, ao menos, os Jainas, da Índia, de cuja seita só fazem parte os que triunfam da sensualidade.
Pio II escreveu que, "por invencíveis razões, interditou-se o casamento dos padres; porém, por mais invencíveis razões, era preciso permiti-lo".
Entretanto, ainda em 1859, era hábito no Vaticano castrarem-se jovens seminaristas, ainda não tonsurados para servir nos coros da igreja de São Pedro, a fim de cantar os hinos da dor e da compunção, por ocasião da Semana Santa.
Quem nos poderá garantir que tal costume não continue em vigor, dado o conservadorismo dos regulamentos?
É possível que se tal medida, copiada dos haréns da Turquia, onde se castravam os eunucos, não fosse revogada e prevalecesse como uma das condições da ordenação, o clero católico seria hoje bem reduzido, mas composto de homens comprovadamente inofensivos à moral pública e, quiçá, verdadeiros cristãos.
Isso corroboraria a frase de Bermond Choveronius, cônego de Viviers, em seu livro De publicis concubinariis, página 8: "O mugir dos bois ou o grunhir dos porcos são mais agradáveis a Deus que os cânticos dos padres fornicadores".
Quando o clero for casado, o confessionário só se prestará para guarita de soldados.
Não há religião ou Culto no mundo que use de tal processo para santificar seu clero. Essa formalidade só tem trazido formidáveis escândalos.
Sem recorrermos a milhares de casos, extrairemos um dos processos arquivados na Torre do Tombo, em Lisboa, armário 5°, maço 7°, datado do ano 1478, referente à sentença lavrada contra o padre Fernandes Costa, que extraímos do jornal A Fraternidade da cidade de Coimbra.
Diz este documento:

"Padre Fernandes Costa, prior que foi de Trancoso, da idade de 62 anos, será degradado de suas ordens e arrastado pelas ruas públicas ao rabo de cavalos, esquartejado o seu corpo e posto em quartos e a cabeça e mãos em diferentes distritos, pelo crime de que foi argüido, que ele mesmo não contrariou, sendo acusado de ter dormido com 29 afilhadas, tendo delas 97 filhas e 37 filhos; de cinco irmãs teve 18 filhos e filhas; de nove comadres teve 38 filhas e 18 filhos; de nove amas teve 29 filhas e cinco filhos; de duas escravas teve 21 filhas e sete filhos; dormiu com uma tia chamada Anna da Costa de quem teve três filhos e ... da própria mãe teve dois filhos!!! Total 275 filhos sendo 200 do sexo feminino e 75 do masculino, sendo concebidos de 54 mulheres!
“O rei João II perdoou ao fecundo sotaina e o mandou pôr em liberdade em 17 de março de 1487 e guardar no Real Arquivo da Torre do Tombo esta sentença e mais papéis que formam o processo!"

É impossível que o leitor não tenha corado e sentido seus nervos irritados, íamos continuar com uma lista de escandalosos fatos, ocorridos no nosso país, de autoria de padres inescrupulosos, alguns já falecidos e outros vivos, que não cessavam de pregar a moral; mas que se tranqüilizem; o arrependimento ainda poderá ser útil às suas almas.
As escabrosas questões a respeito de mulheres improdutivas nunca foram abordadas por nenhuma religião do mundo e ainda menos pelo Rabino da Galiléia que se limitou a dizer à mulher adúltera: "Vai e não peques mais". Isto é, não engane mais seu marido.
Mais adiante, porém, voltaremos ao assunto quando tratarmos de Moral Jesuítica.
Contudo, antes de fecharmos este artigo, vamos citar um dos milhares de pequenos casos que se repetem na nossa pátria, mas que a imprensa trata de embaralhar, ou por ignorância, ou por malícia, para encobrir o nome do segundo delinqüente, visto como, em ambas as notícias, trata-se do padre Victor Coelho de Almeida, ora chamado na notícia do A Noite, de dezembro de 192r — Padre Victor Coelho, ora chamado na de O Globo, de 11 de agosto de 1932 (dois anos e meses depois) de Victor de Almeida, ora Victor Coelho; não podendo, porém, ser o mesmo, pois o do A Noite "teve 15 filhos, goza a vida e sem mais explicações, abandona mulher e filhos e recolhe-se ao claustro", a: passo que o de O Globo, três anos depois, "abandona a mulher com uma filha de 15 anos, recolhe-se ao convento, produzindo o suicídio de sua infeliz esposa"!
Disse Jesus que não há pior cego do que aquele que não quer ver. Pior. porém, é aquele que procura tapar o sol com uma peneira para que os outros não possam vê-lo.
É lógico que os que se comprazem nessa prostituição rebatam os honestos colegas que romperam com esse foco de miasmas, dizendo às suas incautas ovelhas: Não os ledes, não os acrediteis, são filhos do diabo, que não puderam resistir à cruz do Cristo e fugiram para o inferno; mas não dizem que aqueles se afastaram envergonhados desse centro de prostituição, ao passo que eles permanecem, hipocritamente, usufruindo os gozos da vida.
E bom chamarmos a atenção desde já do leitor para nossa abstenção em tocar no dogma da "Confissão". São tais os horrores, são tais as infâmias e os crimes cometidos e relatados em centenas de obras, não por hereges, mas por inúmeros padres que, muitos, enojados e apavorados desse antro de perdição de moças virgens e senhoras casadas ou viúvas, despiram as vestes sacerdotais e deram o grito de alarme.
Contudo, vejamos o que diz a tal respeito um dos Sumos Pontífices da Igreja:
Chiniqui, à página 44, relata que o Papa Pio IV, em 1560, ordenou que todas as mulheres solteiras e casadas que tivessem sido seduzidas pelos seus confessores fossem denunciá-los.
Principiou-se por Sevilha. Tornado conhecido o Edito do Papa, o número de mulheres foi tão considerável que, apesar de haver três escrivãs, não puderam concluir o trabalho no prazo determinado. Mais 60 dias foram concedidos; mas tiveram de reconhecer que o número de padres sedutores era tanto que se tornaria impossível castigá-los e a coisa ficou nisso!
Como não ser assim se o padre é forçado a perguntar às penitentes, cautae et poucae!
Estupenda moral! E são esses que pregam contra o divórcio e o casamento civil por desorganizador da família!

 (E. Leterre - A VIDA OCULTA E MÍSTICA DE JESUS)

publicado às 02:15

 De As Religiões Comparadas, editada pela Cruzada Espírita, extrairemos agora uma comunicação feita pelo apóstolo João. Diz ele:
"Se ouvirdes dizer que o Evangelho de Jesus é a guerra e o derramamento de sangue, eu vos digo, em verdade, que esse é o Evangelho dos rancorosos e vingativos, mas não o de Jesus, que amou os homens e lhes pregou a paz. Se vos disserem que o Evangelho é o fausto, as riquezas, as comodidades dos ministros da palavra, eu vos digo, em verdade, que esse é o Evangelho dos mercadores do Templo, mas não o de Jesus que recomendou aos seus discípulos a pobreza de coração e o desprendimento dos bens da Terra. Se vos disserem que o Evangelho é a sua água, as mãos levantadas aos céus, as pancadas no peito, as formas e o culto externo, eu vos digo, em verdade, que esse Evangelho é o dos hipócritas, mas não o de Jesus, que recomendou o amor e a adoração a Deus em espírito e em verdade. Se vos disserem que o Evangelho é a resistência às leis e aos princípios que governam os povos, eu vos digo, em verdade, que esse Evangelho é o dos rebeldes e ambiciosos, mas não o de Jesus, que mandou dar a César o que era de César e a Deus o que era de Deus”.
“Se vos disserem que o Evangelho é a intolerância, o anátema, a perseguição, a violência e o ódio, eu vos digo, em verdade, que esse Evangelho é o da Soberba e da Ira, mas não o de Jesus, que rogava ao Pai de Misericórdia pelos seus mortais inimigos".
 Pergunta o padre E. Loyson (Ni cléricaux, ni athées — pp. 178-182): "Devemos acreditar no Cristianismo, senhores?"
Então interroguemos, não o direito canônico fabricado pelos papas ou fabricado para eles, não os decretos dos inquisidores ou as apologias dos frades, mas Jesus Cristo, nosso único Mestre, o Filho do Deus Vivo!
Que diz ele na sua Igreja?
Ele nos responde claramente: "Não dominadores, mas servidores de seus irmãos; não carrascos, mas mártires; não o fogo, nem o gládio, nem lobos que devoram, mas cordeiros que se deixam devorar!"
Eis o Evangelho, eis a raça e os tempos novos.
 "O mal de que sofrem os católicos é o esquecimento de suas origens."
O mal do Catolicismo são seus dogmas, seu catecismo, sua liturgia, seus ritos, seu comércio e suas pompas carnavalescas, criadas para empolgar a massa ignara.
O dogma não admitindo a lógica nega o direito que assiste ao homem de raciocinar.
Eliminai do pensamento do crente a esperança de um céu e o temor de um inferno e o culto desaparecerá e, conseqüentemente, o padre, pois, onde o negócio não rende, a casa tende a fechar.
O aparato e a indumentária do padre, o órgão e o incenso, são criações do Paganismo para impressionar a vista, o ouvido e o olfato, empolgando desse modo o espírito em um efeito hipnótico.
Suba este mesmo padre ao altar, vestido de paletó ou fraque, sem órgão e sem incenso e digam-nos, em boa consciência, se o efeito é o mesmo. É possível, até, que a dignidade do celebrante venha a acabar, um dia, numa risada irreverente e impiedosa, pelo desalinho da jaqueta ou pela tortura do tacão da bota, e, sobretudo, como é crença geral na camada iletrada, se ele bater no chão com o pé esquerdo, ao dizer missa, como que repelindo o diabo, que o está denunciando por viver amancebado! É a mula-sem-cabeça!

(E. Leterre - A VIDA OCULTA E MÍSTICA DE JESUS)

publicado às 13:35


AMOR E LIBERDADE: ISTO EXISTE?

por Thynus, em 27.07.14
Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir têm sido considerados ícones de um relacionamento perfeito. Embora “casados”, moraram em casas diferentes e se amaram até o fim.
No livro biográfico de Hazel Rowley a realidade era bem outra. É verdade que Simone de Beauvoir e Sartre relacionaram-se intensamente até o fim da vida dele, que faleceu aos 76 anos, seis anos antes dela. Contudo, Sartre nunca fora fiel a ela, nem ao amor que ela nutria por ele, e no fim da vida tinha um rosário de nove mulheres, um caso com outra de 24 anos, fora seu relacionamento conturbado e “fiel” a seu modo com Beauvoir.
Ao se conhecerem, ela com 21 anos, os dois se apaixonaram pela inteligência literária e filosófica um do outro. Fizeram um pacto de que nunca casariam, nem teriam filhos e que seriam fieis um ao outro para sempre. Iniciaram um conceito de “amor essencial”( que seria o amor entre eles dois), e “amor contingente”( todos os outros que eles teriam fora seu próprio relacionamento a dois). Isto é: todo caso de paixão ou sexual que tivessem fora de seu relacionamento seria “contingente”, mas somente o deles seria “essencial” e eles não permitiriam que ninguém atrapalhasse o seu relacionamento. Outro pacto foi de que falariam tudo que acontecesse entre eles e os outros parceiros e parceiras um para o outro. Seriam sinceros e transparentes um com o outro, custasse o que custasse.
Sartre, feio, baixinho, com uma baixa autoestima, desenvolveu o hábito de seduzir através das palavras. Seu relacionamento sexual com Beauvoir duraria somente seis a nos, a partir daí, amava-a através das palavras, e o que tinham em comum era uma profunda amizade e dedicação um ao outro. Simone de Beauvoir também teve inúmeros casos, mas para ela, Sartre era o que ela realmente queria.
O desejo de ser diferente e de ser uma mulher livre na época em que viveu, veja bem que falamos aqui das décadas de 40 e 50, quando o papel social que se esperava de uma mulher era casar bem ( leia-se, com um homem capaz de lhe sustentar financeiramente) e ter filhos. A cada ano Sartre envolvia-se com maior número de mulheres, enquanto Beauvoir tentava manter a sensação de que ela ainda era sua predileta e principal, causando inúmeras vezes problemas para Sartre por ciúmes das mulheres “contingentes”.
O único que ela realmente amara e se apaixonara a ponto de querer se casar e dedicar a ele fora um escritor americano Nelson Algren, que no futuro tornar-se-ia um ferrenho crítico da autobiografia dela ao se ver exposto nela. Para ele, o que acontecia entre os dois nunca deveria ter sido revelado em público. Levaria para sempre esta mágoa da exposição pública do seu relacionamento com Beauvoir.. Ele faleceu aos 72 anos de  enfarto cardíaco. No momento final de decidir entre os Estados Unidos com Algren e magoar Sartre, Simone preferiu voltar para Paris, embora Sartre, por sua vez, estivesse sofrendo por ter acabado um de seus relacionamentos, necessitando de sua “castorzinha”(maneira como a chamava na intimidade) para consolá-lo.
Algumas conclusões pessoais pode-se tirar deste tipo de relacionamento:
Amor essencial” e amor contingente “são conceitos ilusórios. Onde há relacionamento entre duas pessoas, sempre se corre o risco de se envolver mais que contingencialmente. No coração não se manda. A paixão pode acontecer a qualquer momento.
Nas palavras de Simone de Beauvoir: “Julguei que seria resolvido com muita facilidade: é possível conciliar fidelidade e liberdade? E se for, a que preço? (…) Se os dois aliados permitem-se apenas ligações sexuais passageiras, não há dificuldade, mas isso também significa que a liberdade que se permitem não merece o nome que tem. Sartre e eu fomos ambiciosos; foi nosso desejo experimentar amores contingentes. Mas, há uma pergunta que evitamos deliberadamente: como a terceira pessoa se sentiria em relação ao acerto?”( p.352)
Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre várias vezes quiseram romper seu trato. Por duas ou três vezes ele quis propor casamento a outras mulheres, e ela quis casar com o próprio Sartre, somente não teve a coragem de lhe declarar isso. Certa vez ela se perguntou ”será que não teria sido melhor nós dois termos nos casado e termos tido filhos?” Ela também quis casar com Algren, mas seu pacto com Sartre falou mais alto. Os dois realmente mantinham um vínculo muito forte, mas o amor ao conceito de liberdade que eles mesmo se auto-infligiram os prendeu e os impediu de viverem intensamente o amor pleno. Sempre levavam uma vida dividida- quero isso, mas tenho aquilo.
Simone afirma:
“Eu estava querendo iludir quando dizia que éramos uma pessoa só. Entre dois indivíduos, a harmonia nunca é dado: precisa ser conquistada constantemente. “(p.407).
Simone de Beauvoir e Sartre eram o casal protótipo do que o sociólogo Zygmunt Baumman disserta sobre a pós-modernidade. A liberdade individual reinando soberana, o reclamo demasiadamente humano do prazer, de sempre mais prazer e sempre mais aprazível prazer – um reclamo outrora desacreditado como base e condenado como autodestrutivo. “ (p.11)
Segundo Baumman, quando se ganha alguma coisa, em troca perde-se outra coisa. Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre prezavam sua liberdade, mas perderam a segurança de um amor pleno, com suas renúncias, mas com seus ganhos, com alguns dias de monotonia, mas com bom sono, ao saber que quando despertassem teriam um ao lado do outro, em todas as circunstâncias. Mas, segundo Baumman, os homens e as mulheres pós-modernos trocaram um quinhão de duas possibilidades de segurança, por um quinhão de felicidade. Pergunto-me eu: que felicidade?
A certa altura da vida, Beauvoir constata o fato de que dois podem fazer um pacto de terem outras pessoas e até funcionar para eles, mas e para o outro envolvido nesse relacionamento? Certa vez ela questiona Sartre se não estariam brincando com os sentimentos das outras pessoas, embora todas elas fossem adultas.
Um cuidado que se deve tomar ao lidar com qualquer ser humano, é entender que nem todos têm a mesma estrutura mental ou emocional.
Outra conclusão importante: Liberdade a dois existe? Simone e Beauvoir se pergunta: queríamos a liberdade, mas a que preço?
Por mais que queiramos que homem e mulher sejam iguais, precisamos entender que emocionalmente, principalmente no que concerne o amor a mulher é diferente: homem faz sexo, mulher faz amor, homem mente e mulher chora. Até rendeu títulos de livros. O que isso significa?
Para Sartre não importava ter duas, três, nove mulheres. Ele conseguia se dar a cada uma sem o menor constrangimento e sem se sentir dividido, a não ser duas ou três vezes em que o seu ser amado morava longe, tais como a russa, a americana e a japonesa. É fácil amar apaixonadamente de longe, quando se utilizam mais as palavras do que as atitudes ou as ações. Afinal de contas, se nada funcionasse, a Castor estaria lá, como um cão fiel para lhe fazer companhia, ler seus escritos antes de serem publicados. Sem dúvida, eram parceiros de trabalho e de trapalhadas amorosas.
Porém, para Beauvoir, não funcionava do mesmo jeito. Ela sofria quando ele se dedicava muito a outra mulher. Ela sofria quando ele viajava e ficava muito tempo sem lhe dar notícias. Ela sofria toda vez que se via ameaçada de perde-lo para outra mulher. Contudo, sua opção de ser uma mulher independente e racional a impedira de demonstrar ciúme, reclamar ou mesmo lhe propor ficar somente com ela. Seu medo de perdê-lo levou-a a gestos extremos, como o de acobertar casos dele com mulheres casadas, viajando com os dois, pois para a sociedade Sartre estava com Mademoiselle Beauvoir, a sua eterna amante.
Ela se vinculara a ele de tal maneira que não concebia a ideia de vê-lo morrer antes dela: “É terrível não estar presente para consolar uma pessoa pela dor que você lhe causou ao deixá-la . É terrível ela nos deixar e depois não tornar a falar mais conosco. “(p.323).
No fim da vida, já cansada, enfrentando um vazio existencial ela confessa que olhando para trás vira como fora enganada em suas promessas, embora tenha-as vivido. Um relacionamento essencial com liberdade. Que preço os dois pagaram por isso?
Sartre teria sido realmente amado pelas inúmeras mulheres com quem se relacionara? Simone de Beauvoir, aquela a quem ele realmente não se dedicara como prometera, parece ter sido a única mulher que realmente o amou. Entrevistado por um jornalista que lhe questionou como fazia para conviver com tantas mulheres ao mesmo tempo, replicou que lhes mentia, principalmente para Beauvoir.
Amor e liberdade são excludentes. Quando se ama se quer exclusividade. Quando se ama se sente ciúme, porque se teme a iminência da perda. Nenhum amor é tão seguro e certo que não venha a ser abalado e ameaçado.
O amor precisa ser nutrido. Segundo Beauvoir, é senso comum que para o homem o hábito mata o desejo, tentando explicar interiormente porque Sartre não a desejava mais.
Contudo, o amor vai além do desejo sexual, implica em memórias de momentos agradáveis que os dois passam ou passaram juntos, implica em laços interiores construídos ao longo da parceria. Gostos em comum, gargalhadas que conseguem dar juntos, pensamentos parecidos, ideais em comum.
Precisamos nos conscientizar de que quando nos relacionamos sempre aparecerão mulheres mais novas, mais bonitas, mais inteligentes que você. Sempre aparecerão homens mais vigorosos, mais fortes, mais bonitos, mais sedutores e inteligentes que você. O essencial é invisível para os olhos, já dizia Saint – Exupéry . O exterior não conta com o passar do tempo, porque os novos também envelhecerão um dia. O laço de amizade, amor, vínculo positivo que se construiu durante o relacionamento é o que contará naquele seu último suspiro de vida.
Quando Sartre faleceu, havia adotado uma moça bem mais nova para deixar sua herança. Beauvoir deitou-se por duas horas ao lado de seu corpo morto, enquanto Alkemi, a jovem adotada corria para seu apartamento para esvaziá-lo e levar todos os seus escritos, quadros caros (havia dois originais de Picasso), não autorizando muitos biógrafos a publicar certos artigos que seriam de grande interesse literário. Enquanto Beauvoir prezava mais um pouco da companhia do homem que amara intensamente, a outra mulher preocupava-se com o material.
Simone de Beauvoir esteve ao lado de Sartre no seu último suspiro. Cuidou dele na sua enfermidade, sofreu com sua morte. Poderiam ter vivido intensamente um ao lado do outro, mas seus conceitos, sua vontade de viver diferente, os aprisionou!
Quem ama tem sua liberdade individual reduzida, por outro lado, quem não ama plenamente, não vive plenamente.
Quanto a mim, prefiro viver plenamente! E você?

( SILVIA GERUZA RODRIGUES )

publicado às 18:52


Mário Quintana

por Thynus, em 24.07.14
ANDAVA (Mário Quintana) às voltas com a declaração do imposto de renda. Tinha o salário do Correio do Povo e até aí tudo bem. Para complicar, havia direitos autorais vindos de várias fontes. Mais burocracia do que dinheiro, como se sabe. Enfim, andava às voltas com os labirintos da declaração.
              Mas sempre há uma alma caridosa. O colega Sílvio Braga, que se dividia entre a redação do Correio e uma repartição federal, ofereceu-se:
              - Reúne a papelada e me passa, que eu faço tua declaração no computador.
              Prometido e feito. Mário agradeceu pelos préstimos com o verso:
 
Sei que meu cálculo é infiel
Na mais inglória das lutas
Lido com pena e papel
E tu, ó Braga, computas.
(Juarez Fonseca - Ora Bolas!)
20 melhores ideias sobre poemas

 

Mário Quintana(1906-1994). Foi um dos melhores poetas brasileiros. Publicou cerca de trinta livros e algumas de suas poesias foram vertidas para o espanhol, o francês, o inglês e o italiano. E traduziu obras de diversos autores como Guy de Maupassant, André Maurois, Marcel Proust, Voltaire, Honoré de Balzac, Aldous Huxley e Somerset Maugham, entre outros.

 

Era também um poeta-filósofo.



VRB – Mário, você é um dos grandes poetas brasileiros. Pergunto-lhe então: o que a poesia?

Quintana – A Poesia é a invenção da Verdade.
A beleza de um verso não está no que diz, mas no poder encantatório das palavras que diz: um verso é uma fórmula mágica.
A poesia é um sintoma do sobrenatural.
Só a poesia possui as coisas vivas. O resto é necropsia.

VRB – Há leitores que, ao lerem um poema, querem saber a sua interpretação.

Quintana – Mas para que interpretar um poema? Um poema já é uma interpretação.

VRB – Qual a sua opinião sobre a influência de um escritor sobre outro?

Mário Quintana – O que chamam de influência poética é apenas confluência. Já li poetas de renome universal e, mais grave ainda, de renome nacional e que no entanto me deixaram indiferente. De quem é a culpa? De ninguém. É que não eram da minha família.

VRB – A imaginação é uma característica dos romancistas e dos poetas. O que é a imaginação?

Quintana – A imaginação é a memória que enlouqueceu.

VRB – Qual é sua filosofia de vida?

Quintana – A gente deve atravessar a vida como quem está gazeando a escola e não como quem vai para a escola.
Uma vida não basta apenas ser  vivida: também precisa ser sonhada.

VRB – Autores, como Domenico de Masi , fazem apologia do ócio, inclusive como fonte de criatividade.

Quintana – A preguiça é a mãe do progresso. Se o homem não tivesse preguiça de caminhar, não teria inventado a roda.
O que prejudica a minha preguiça prejudica o meu trabalho.

VRB – Temos respostas confiáveis para a Vida? Ou só podemos perguntar?

Quintana – Quase tudo neste mundo são perguntas e as respostas são quase sempre reticências...

VRB – A idéia do destino sempre esteve presente na filosofia, na religião, na literatura. Na sua concepção,  o que é o destino?

Quintana – O Destino é o acaso atacado de mania de grandeza.

VRB – A morte é certa, mas o instante da morte é sempre incerto. E essa incerteza do instante do morrer, você o retrata belamente em uma de suas poesias.

Quintana – Esta vida é uma estranha hospedaria,
                   De onde se parte quase sempre às tontas,
                   Pois nunca as nossas malas estão prontas,
                   E a nossa conta nunca está em dia...

VRB – A sobrevivência da alma após a morte do corpo é uma esperança da grande maioria das pessoas, porque acreditam no que dizem todas as religiões. O que é a alma para você?

Quitana – A alma é essa coisa que nos pergunta se a alma existe.
Meu Deus! Como será uma alma deste mundo?!

VRB – Você tem medo de fantasmas?

Quintana – O fantasma é um exibicionista  póstumo.
Os fantasmas também sofrem de visões: somos nós...

VRB – Karl Marx afirmou que a religião é o ópio do povo. Você concorda?

Quintana – O ópio do povo é o trabalho.

VRB – Há pessoas que se preocupam tanto com o espírito a ponto de desprezar o corpo. Pensam que sabem muito sobre a alma, mas, na sua  maioria, nada sabem sobre o seu organismo.

Quintana – Conhecer o mistério de um corpo é talvez mais importante do que conhecer o mistério de uma alma.

VRB – Você acha que a teologia aproxima o homem de Deus?

Quintana – A teologia é o caminho mais longo para  chegar a Deus.
Mas como livrar Deus dos teogogos?
Deus é impróprio para adultos.

VRB – Você acredita em oração?

Quintana – Rezar é uma falta de fé: Nosso Senhor bem sabe o que está fazendo....

VRB – Há pessoas que mudam de religião porque perderam a fé no que acreditavam. Essa dúvida poderá ser neutralizada pela fé que encontraram noutra religião?

Quintana – Uma das coisas que não consigo absolutamente compreender são os que se convertem a outras religiões. Para que mudar de dúvidas?

VRB – Você se preocupa com o Além e seus mistérios?

Quintana – Por favor, deixa o Outro Mundo em paz! O mistério está aqui.

VRB – Acredita em milagres?

Quintana – O milagre não é dar vida ao corpo extinto,
                   Ou luz ao cego, ou eloqüência ao mudo...
                    Nem mudar água pura em vinho tinto.
                    Milagre é acreditarem nisso tudo.

VRB – O que o amedronta em relação à morte?

Quintana – Falam muito no Sono Eterno. Sempre falaram, aliás... E daí?
Daí, só uma coisa me impressiona, e muito: a ameaça de uma Insônia Eterna.
O pior da morte é essa brusca mudança de hábitos...

VRB – Costuma-se dizer que a morte iguala todas as pessoas.

Quintana – A morte não iguala ninguém: há caveiras que possuem todos os dentes.

VRB – O maior perigo para o idoso é a aposentadoria. Se ela não for bem aproveitada poderá, como conseqüência, acelerar o envelhecimento e antecipar a morte. Como você encara o trabalho na velhice?

Quitana – O trabalho é a farra dos velhos.

VRB – O que é o tempo?

Quintana – O tempo é a insônia da eternidade.

VRB – O tempo sempre foi uma das grandes preocupações do ser humano. Os saudosistas dão um grande valor ao passado e fazem do presente uma janela de onde contemplam tudo o que foi e tudo o que foram.

Quintana – O passado não reconhece o seu lugar: está sempre no presente.

VRB – A maioria dos idosos sempre fala dos bons velhos tempos, por inadaptação aos costumes dos tempos atuais.

Quintana – Mas os tempos são sempre bons, a gente é que não presta mais.

VRB – Cada fase do tempo tem seus próprios sentimentos, e todos eles sempre são vividos no presente.

Quintana – Essas duas tresloucadas, a Saudade e a Esperança, vivem ambas na casa do Presente, quando deviam estar, é lógico, uma na casa do Passado e outra na do Futuro. Quanto ao Presente – ah! – esse nunca está em casa.

VRB – Qual o tipo de saudade mais dolorida?

Quintana – A saudade que dói mais fundo – e irremediavelmente – é a saudade que temos de nós.

VRB – Há filósofos que ensinam que o homem deve superar a si mesmo, exceder os seus limites.

Quintana – Ultrapassar-se? Mas como?! A gente só se ultrapassa, mesmo, quando vai para o outro mundo.

VRB – Consideramo-nos o ápice da escala evolutiva do nosso planeta. Apesar de os macacos estarem muito próximos a nós quanto à genética, há uma diferença qualitativa entre nós e eles. Graças à ciência e à tecnologia essa diferença é cada vez maior dentro de uma perspectiva estritamente operacional. Em compensação, os perigos do nosso progresso podem culminar na destruição da raça humana. O que você pensa a respeito?

Quintana – O que me impressiona, à vista de um macaco, não é que ele tenha sido nosso passado: é este pressentimento de ele venha a ser o nosso futuro.

VRB – Um dos nossos maiores medos é o da  solidão. E ela vem se agravando nas grandes megalópoles. Assim, há pessoas que viajam para fugir da solidão.

Quintana – Viajar é mudar o cenário da solidão.

VRB – Vivemos a experiência das megalópoles. Como você definiria uma cidade assim?

Quintana – Cidade grande: dias sem pássaros, noites sem estrelas.

VRB – A ficção científica alerta para a possibilidade de o homem ser, um dia, superado e dominado pela máquina. É terrível essa visão de um mundo dirigido por robôs.

Quintana – O que há de terrível nos robôs não é como eles se parecem conosco, mas como nós nos parecemos com eles.

VRB – Como você se relaciona com o livro?

Quintana – O livro traz a vantagem de a gente poder estar só e ao mesmo tempo acompanhado.
Há duas espécies de livros: uns que os leitores esgotam, outros que esgotam os leitores.

VRB – Você já alguma vez releu seus livros?

Quintana – Nunca me releio... Tenho um medo enorme de me influenciar. É verdadeiramente catastrófico quando um autor se transforma no seu discípulo.

VRB - Há escritores que procuram ser coerentes em todas as suas obras. Você tem essa preocupação?

Quintana - Um autor que nunca se contradiz deve estar mentindo

VRB – O que é o sonho?

Quintana – Sonhar é acordar-se para dentro.

VRB – Você, alguma vez, já sentiu remorso?

Quintana – Há noites em que não posso dormir de remorsos por tudo o que deixei de cometer...

VRB – Quais as expressões humanas que demonstram autêntica sinceridade.

Quintana – Os sorrisos mais sinceros são os sorrisos dos desdentados.

VRB – Qual a palavra que denomina melhor o agrupamento humano.

Quintana – Nós – o pronome do rebanho.

VRB – Como você entende a criação do mundo?

Quintana – Se antes era o Nada, como poderia haver Alguém para tirar dele o mundo?

(Valter da Rosa Borges)

 


FRASES DE MARIO QUINTANA

* A amizade é um amor que nunca morre.

* Tão bom morrer de amor! e continuar vivendo...

* Há 2 espécies de chatos: os chatos propriamente ditos e ... os amigos, que são os nossos chatos prediletos.

*Bilhete
Se tu me amas, ama-me baixinho
Não o grites de cima dos telhados
Deixa em paz os passarinhos
Deixa em paz a mim!
Se me queres,
enfim,
tem de ser bem devagarinho, Amada,
que a vida é breve, e o amor mais breve ainda...

 * O segredo é não correr atrás das borboletas... É cuidar do jardim para que elas venham até você.

 * O tempo não pára! Só a saudade é que faz as coisas pararem no tempo...

* A preguiça é a mãe do progresso. Se o homem não tivesse preguiça de caminhar, não teria inventado a roda.

* DO AMOROSO ESQUECIMENTO
Eu, agora - que desfecho!
Já nem penso mais em ti...
Mas será que nunca deixo
De lembrar que te esqueci?

 * DAS UTOPIAS
Se as coisas são inatingíveis... ora!
Não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos, se não fora
A presença distante das estrelas!

* AS INDAGAÇÕES
A resposta certa, não importa nada: o essencial é que as perguntas estejam certas.

 * Se me esqueceres, só uma coisa, esquece-me bem devagarinho.

 * DA FELICIDADE
Quantas vezes a gente, em busca da ventura,
Procede tal e qual o avozinho infeliz:
Em vão, por toda parte, os óculos procura
Tendo-os na ponta do nariz!

* A arte de viver é simplesmente a arte de conviver ... simplesmente, disse eu? Mas como é difícil!

 * Há noites que eu não posso dormir de remorso por tudo o que eu deixei de cometer.

 * DA DISCRIÇÃO
Não te abras com teu amigo
Que ele um outro amigo tem.
E o amigo do teu amigo
Possui amigos também...

 * DA OBSERVAÇÃO
Não te irrites, por mais que te fizerem...
Estuda, a frio, o coração alheio.
Farás, assim, do mal que eles te querem,
Teu mais amável e sutil recreio...

 * O passado não reconhece o seu lugar: esta sempre presente.

* O pior dos problemas da gente é que ninguém tem nada com isso.

 * [O Trágico Dilema]
Quando alguém pergunta a um autor o que este quis dizer, é porque um dos dois é burro.

 * POEMINHA DO CONTRA
Todos estes que aí estão
Atravancando o meu caminho,
Eles passarão.
Eu passarinho!

 * Não importa saber se a gente acredita em Deus: o importante é saber se Deus acredita na gente...

 * Os verdadeiros analfabetos são os que aprenderam a ler e não lêem.

 * Um bom poema é aquele que nos dá a impressão de que está lendo a gente ... e não a gente a ele!

* A alma é essa coisa que nos pergunta se a alma existe.

 * Bendito quem inventou o belo truque do calendário, pois o bom da segunda-feira, do dia 1º do mês e de cada ano novo é que nos dão a impressão de que a vida não continua, mas apenas recomeça...

 * E um dia os homens descobrirão que esses discos voadores estavam apenas estudando a vidas dos insetos...

 * Reflexão de Lavoisier ao descobrir que lhe haviam roubado a carteira: nada se perde, tudo muda de dono.

 * Sonhar é acordar-se para dentro.

 * Amor
Quando duas pessoas fazem amor
Não estão apenas fazendo amor
Estão dando corda ao relógio do mundo

* Sempre me senti isolado nessas reuniões sociais: o excesso de gente impede de ver as pessoas...

 * Dizes que a beleza não é nada? Imagina um hipopótamo com alma de anjo... Sim, ele poderá convencer os outros de sua angelitude - mas que trabalheira!

 * DOS MILAGRES
O milagre não é dar vida ao corpo extinto,
Ou luz ao cego, ou eloqüência ao mudo...
Nem mudar água pura em vinho tinto...
Milagre é acreditarem nisso tudo!

 * No fim tu hás de ver que as coisas mais leves são as únicas
que o vento não conseguiu levar:
um estribilho antigo
um carinho no momento preciso
o folhear de um livro de poemas
o cheiro que tinha um dia o próprio vento...

 * Autodidata é um ignorante por conta própria.

* Melancolia
Maneira romântica de ficar triste.

 * Esses que puxam conversa sobre se chove ou não chove - não poderão ir para o Céu! Lá faz sempre bom tempo...

 * Quando eu for, um dia desses,
Poeira ou folha levada
No vento da madrugada,
Serei um pouco do nada
Invisível, delicioso

Que faz com que o teu ar
Pareça mais um olhar,
Suave mistério amoroso,
Cidade de meu andar
(Deste já tão longo andar!)

E talvez de meu repouso...

*  SIMULTANEIDADE
- Eu amo o mundo! Eu detesto o mundo! Eu creio em Deus! Deus é um absurdo! Eu vou me matar! Eu quero viver!
- Você é louco?
- Não, sou poeta.

*  A poesia não se entrega a quem a define.

*  O que me impressiona, à vista de um macaco, não é que ele tenha sido nosso passado: é este pressentimento de que ele venha a ser nosso futuro.
Mas o que quer dizer este poema? - perguntou-me alarmada a boa senhora.
E o que quer dizer uma nuvem? - respondi triunfante.
Uma nuvem - disse ela - umas vezes quer dizer chuva, outras vezes bom tempo...

* Não me ajeito com os padres, os críticos e os canudinhos de refresco: não há nada que substitua o sabor da comunicação direta.

*  Quiseste expor teu coração a nu.
E assim, ouvi-lhe todo o amor alheio.
Ah, pobre amigo, nunca saibas tu
Como é ridículo o amor... alheio!

*  Vale a pena viver - nem que seja para dizer que não vale a pena...

*  Dupla delícia/ O livro traz a vantagem de a gente poder estar só e ao mesmo tempo acompanhado.

*  Se alguém te perguntar o quiseste dizer com um poema, pergunta-lhe o que Deus quis dizer com este mundo...

*  Só se deve beber por gosto: beber por desgosto é uma cretinice.

*  INSCRIÇÃO PARA UM PORTÃO DE CEMITÉRIO
Na mesma pedra se encontram,
Conforme o povo traduz,
Quando se nasce - uma estrela,
Quando se morre - uma cruz.
Mas quantos que aqui repousam
Hão de emendar-nos assim:
"Ponham-me a cruz no princípio...
E a luz da estrela no fim!"

* Qualquer ideia que te agrade,
Por isso mesmo... é tua.
O autor nada mais fez que vestir a verdade
Que dentro em ti se achava inteiramente nua...

*  Esses padres conhecem mais pecados do que a gente...

*  Se eu amo o meu semelhante? Sim. Mas onde encontrar o meu semelhante?

*  A verdadeira arte de viajar...
A gente sempre deve sair à rua como quem foge de casa,
Como se estivessem abertos diante de nós todos os caminhos do mundo.
Não importa que os compromissos, as obrigações, estejam ali...
Chegamos de muito longe, de alma aberta e o coração cantando!

*  OS DEGRAUS
Não desças os degraus do sonho
Para não despertar os monstros.
Não subas aos sótãos - onde
Os deuses, por trás das suas máscaras,
Ocultam o próprio enigma.
Não desças, não subas, fica.
O mistério está é na tua vida!
E é um sonho louco este nosso mundo...

*  Ah, esses moralistas... Não há nada que empeste mais do que um desinfetante!

*  Minha vida é uma colcha de retalhos. Todos da mesma cor.

*  Não tem porque interpretar um poema. O poema já é uma interpretação.

*  Da Perfeição da Vida
Por que prender a vida em conceitos e normas?
O Belo e o Feio... O Bom e o Mau... Dor e Prazer...
Tudo, afinal, são formas
E não degraus do Ser!

*  Do bem e do mal
Todos tem seu encanto: os santos e os corruptos.
Não há coisa na vida inteiramente má.
Tu dizes que a verdade produz frutos...
Já viste as flores que a mentira dá?

*  Quem pretende apenas a glória não a merece.

*  Quando guri, eu tinha de me calar, à mesa: só as pessoas grandes falavam. Agora, depois de adulto, tenho de ficar calado para as crianças falarem.

*  Da calúnia
Sorri com tranquilidade
Quando alguém te calunia.
Quem sabe o que não seria
Se ele dissesse a verdade...

*  O Eterno Espanto
Que haverá com a lua que sempre que a gente a olha é com o súbito espanto da primeira vez?

*  Esquece todos os poemas que fizeste. Que cada poema seja o número um.

*  No céu é sempre domingo. E a gente não tem outra coisa a fazer senão ouvir os chatos. E lá é ainda pior que aqui, pois se trata dos chatos de todas as épocas do mundo.

*  Há uns que morrem antes; outros depois. O que há de mais raro, em tal assunto, é o defunto certo na hora exata.

*  De um autor inglês do saudoso século XIX: O verdadeiro gentleman compra sempre três exemplares de cada livro: um para ler, outro para guardar na estante e o último para dar de presente.

*  INSCRIÇÃO PARA UMA LAREIRA
A vida é um incêndio: nela
dançamos, salamandras mágicas
Que importa restarem cinzas
se a chama foi bela e alta?
Em meio aos toros que desabam,
cantemos a canção das chamas!

Cantemos a canção da vida,
na própria luz consumida...

*  Diálogo Bobo
- Abandonou-te?
- Pior ainda: esqueceu-me...

*  [Do Bem o do Mal]
No fundo, não há bons nem maus. Há apenas os que sentem prazer em fazer o bem e os que sentem prazer em fazer o mal. Tudo é volúpia...

*  O tempo é um ponto de vista. Velho é quem é um dia mais velho que a gente...

*  O ruim dos filmes de Far West é que os tiroteios acordam a gente no melhor do sono.

*  Três amores... Quem me deu
Tão estranha sorte assim?
Três amores, tenho-os eu
E nenhum me tem a mim!

*  A indulgência é a maneira mais polida de desprezar alguém.

*  Mas que susto não irão levar essas velhas carolas se Deus existe mesmo...

*  Quem faz um poema abre uma janela.
Respira, tu que estás numa cela abafada,
esse ar que entra por ela.
Por isso é que os poemas têm ritmo
- para que possas profundamente respirar.
Quem faz um poema salva um afogado.

*  [Inscrição para um portão de cemitério]
A morte não melhora ninguém...

*  LEGÍTIMA APROPRIAÇÃO
Copio e assino essa frase encontrada no velho Schopenhauer: "A soma de barulho que uma pessoa pode suportar está na razão inversa de sua capacidade mental".

*  Se um poeta consegue expressar a sua infelicidade com toda a felicidade, como é que poderá ser infeliz?

*  O mais triste da arquitetura moderna, é a resistência do seu material.

*  O grande consolo das velhas anedotas são os recém-nascidos...

*  Qual Ioga, qual nada! A melhor ginástica respiratória que existe é a leitura, em voz alta, dos Lusíadas.

 

* Tudo o que acontece é natural - inclusive o sobrenatural.

 

*  Sinônimos
Esses que pensam que existem sinônimos, desconfio que não sabem distinguir as diferentes nuanças de uma cor.

 

*  Senhora, eu vos amo tanto / Que até por vosso marido / Me dá um certo quebranto.

 

*  [A Arte de Ler]
O leitor que mais admiro é aquele que não chegou até a presente linha. Neste momento já interrompeu a leitura e está continuando a viagem por conta própria.

 

*  Diálogo Noite Adentro
- Mas há as que nos compreendem...
- Ah, essas são as piores!

 

*  Mau Humor
Os que metem uma bala na cabeça retiram-se deste mundo batendo com a porta.

 

*  Tempo
Coisa que acaba de deixar a querida leitora um pouco mais velha ao chegar ao fim desta linha.

 

*  Nos acontecimentos, sim, é que há destino:
Nos homens, não - espuma de um segundo...
Se Colombo morresse em pequenino,
O Neves descobriria o Novo Mundo.

 

*  O café é tão grave, tão exclusivista, tão definitivo
que não admite acompanhamento sólido. Mas eu o driblo,
saboreando, junto com ele, o cheiro das torradas-na-manteiga
que alguém pediu na mesa próxima.

 

*  Já trazes, ao nascer, a tua filosofia.
As razões? Essas vêm posteriormente,
Tal como escolhes, na chapelaria,
A forma que mais te assente...

 

*  [Busca]
Subnutrido de beleza, meu cachorro-poema vai farejando poesia em tudo, pois nunca se sabe quanto tesouro andará desperdiçado por aí...
Quanto filhotinho de estrela atirado no lixo!

 

*  [A Carta]
Quando completei quinze anos, meu compenetrado padrinho me escreveu uma carta muito, muito séria: tinha até ponto-e-vírgula! Nunca fiquei tão impressionado na minha vida.

 

*  SEMPRE QUE CHOVE
Sempre que chove
Tudo faz tanto tempo...
E qualquer poema que acaso eu escreva
Vem sempre datado de 1779!

 

*  Hoje me acordei pensando em uma pedra numa rua de Calcutá. Numa determinada pedra numa rua de Calcutá. Solta. Sozinha. Quem repara nela? Só eu, que nunca fui lá. Só eu, deste lado do mundo, te mando agora esse pensamento... Minha pedra de Calcutá!

 

*  [Leitura]
Se é proibido escrever nos monumentos, também deveria haver uma lei que proibisse escrever sobre Shakespeare e Camões.

 

*  Ah! Essas Precauções...
Para desespero de seus parentes, o velho rei Mitridates, como todo mundo sabe, conseguiu tornar-se imune a todos os venenos... até que um bom tijolaço na cabeça liquidou o assunto.

 

*  Olho em redor do bar em que escrevo estas linhas.
Aquele homem ali no balcão, caninha após caninha,
nem desconfia que se acha conosco desde o início
das eras. Pensa que está somente afogando problemas
dele, João Silva... Ele está é bebendo a milenar
inquietação do mundo!

 

*  Um poema como um gole d'água bebido no escuro.
Como um pobre animal palpitando ferido.
Como pequenina moeda de prata perdida para sempre na
[floresta noturna.
Um poema sem outra angústia que a sua misteriosa condição
[de poema.
Triste.
Solitário.
Único.
Ferido de mortal beleza.

*  Opinião só não muda quem não tem. 

*  Não deixe de fazer algo que gosta devido à falta de tempo; a única falta que terá, será desse tempo que infelizmente não voltará jamais.

*  O luar, é a luz do Sol que está sonhando. 

*  A noite acendeu as estrelas porque tinha medo da própria escuridão. 

* A mentira é uma verdade que se esqueceu de acontecer. 

* A morte é a libertação total: a morte é quando a gente pode, afinal, estar deitados de sapatos. 

* Despertador é bom para a gente se virar para o outro lado e dormir de novo. 

*  A modéstia é a vaidade escondida atrás da porta.

publicado às 21:55

Todos os seres vivos superiores possuem acentuado sentido lúdico. Basta observa os gatinhos e cachorros de nossas casas. Mas o humor é próprio só dos seres humanos. O humor nunca foi considerado tema “sério” pela reflexão teológica, sabendo-se que ele se encontra presente em todas as pessoas santas e místicas que são os únicos cristãos verdadeiramente sérios. Na filosofia e na pscinálise teve melhor sorte.
Humor não é sinônimo de chiste, pois pode haver chiste sem humor e e humor sem chiste. O chiste é irrepetível. Repetido, perde a graça. A historieta cheia de humor conserva sua permanente graça; e gostamos de ouvi-la repetidas vezes.
O humor só pode ser entendido a partir da profundidade do ser humano. Sua característica é ser um projeto infinito, portador de inesgotáveis desejos, utopias, sonhos e fantasias. Tal dado existencial faz com que haja sempre um descompasso entre o desejo e a realidade, entre o sonhado e sua concretização. Nenhuma instituição, religião, Estado e lei conseguem enquadrar totalmente o ser humano, embora existam exatamente para enquadrá-lo a um certo tipo de ordem. Mas ele desborda estas determinações. Dai a importância da violação do inerdito para a vivência da liberdade e para que surjam coisas novas. Isso na arte, na literatuar e também na religião.
Quando se dá conta desta diferença entre a lei e a realidade – veja-se por exemplo, a exdrúxula moral católica sobre a proibição do uso da camisinha em tempos em que grassa a AIDs – surge o sentido do humor. Dá vontade de rir, pois é tudo tão fora do bom senso, é tanto discurso proferido em pleno deserto que ninguém escuta nem observa que só podemos ter humor. Essas pessoas vivem na lua não na Terra.
No humor se vive o sentimento de alívio do peso das limitações e do prazer de ve-las relativas e sem a importância que elas mesms se dão. Por um momento, a pessoa se sente livre dos super-egos castradores, das injunções impostas pela situação e faz uma experiência de liberdade, como forma de plasmar seu tempo, dar sentido ao que está fazendo e construir algo novo. Por detrás do humor vigora a creatividade, própria do ser humano. Por mais que haja constrangimentos naturais e sociais, sempre há espaço para se criar algo novo. Se não fosse assim não haveria gênios na ciência, na arte e no pensamento. Inicialmente são tidos por “loucos”, excêntricos e anormais. Quando tudo passou, um novo olhar descobre a genialidade de um van Gogh, a criatividade fantástica de Bach, quase desapercebido no seu tempo. De Jesus se diz que “os seus sairam para agarrá-lo, pois diziam “ele está louco”(Mc 3,21). De São Francisco se disse a mesma coisa: ele é um “pazzus” um louco, coisa que ele aceitava como expressão da vontade de Deus. E era uma santo cheio de de humor e alegria a ponto de o chamaram”frade-sempre-alegre”.
Em palavras mais pedestres: o humor é sinal de que nos é impossível definir o ser humano dentro de um quadro estabelecido. Em seu ser mais profundo e verdadeiro é um criador e um livre.
Por isso, pode sorrir e ter humor sobre os sistemas que o querem aprisionar em categorias estabelecidas. E o ridículo que constatamos em senhores sérios (por exemplo, professores, juízes, diretores de escola e até monsenhores) que querem, solenemente e com ares de uma autoride superior, quase divina, fazer dos outros cegos e submissos ou quais ovelhas terem que  obedeçer às suas ordens. Isso também causa humor.
Acertado estava aquele filósofo (Th. Lersch Philosophie des Humors, Munique 1953, 26) que escreveu: “A essência secreta do humor reside na força da atitude religiosa. Pois o humor vê as coisas humanas e divinas na sua insuficiência diante de Deus”. A partir da seriedade de Deus, o ser humano sorri das seriedades humanas com a pretensão de serem absolutamente verdadeiras e sérias. Elas são um nada diante de Deus. E existe ainda toda uma tradição teológica que nos vem dos Padres da Igreja Ortodoxa que falam do Deus ludens, (do Deus lúdico) pois criou o mundo como um jogo para o seu próprio entretenimnento. E o fazia, sabiamente, unindo humor com seriedade.
Quem vive centrado em Deus tem motivos de cultivar o humor. Relativiza as seriedades terrenas, até os própros defeitos e é um livre de preocupações. São Thomas Morus, condenado à guilhotina, cultivou o humor até o fim: pedia aos algozes que lhe cortassem o pescoço mas lhe poupassem a longa barba branca. São Lourenço sorria com humor dos algozes que o assavam na grelha e os incitava a virá-lo do outro lado porque de um lado estava vem cozido ou do Santo Inácio de Antioquia, bispo, ancião e referência de toda a Igreja dos primórdios, que suplicava aos leões que viessem devorá-lo para passar mais rapidamente à felicidade eterna.
Conservar esta serenidade, viver em estado de humor e compreende-lo a partir das insuficiências humanas é uma graça que todos devemos buscar e pedir a Deus.

(Leonardo Boff)

publicado às 00:40

O tema da festa é um fenômeno que tem desafiado grandes nomes do pensamento como R. Caillois, J. Pieper, H. Cox, J. Motmann e o próprio F.Nietzsche. É que a festa revela o que há ainda de mítico em nós no meio da prevalência da fria racionalidade. Quando se realizou a Copa de futebol no Brasil no mes de junho/julho do corrente ano de 2014 irromperam as grandes festas, em todas as classes sociais, verdadeiras celebrações. Mesmo depois da humilhante derrota do Brasil frente à Alemanha, as festas não esmoreceram. Na Costa Rica, mesmo não sendo a campiã do mundo, mas mostraram excelente futebol, até o Presidente saíu à rua para celebrar. Não foi diferente na Colômbia.
A festa faz esquecer os fracssos, suspende o terrível cotidiano e o tempo dos relógios. É como se, por um momento, participássemos da eternidade, pois na festa não percebemos o tempo passar.
A festa, em si, está livre de interesses e finalidades, embora haja festas para negócios onde a festa se transforma em berber, comer e negociar. Mas na festa que é festa, todos estão juntos não para aprenderem ou ensinarem algo uns aos outros, mas para alegrarem-se, para estar aí, um-para-o-outro comendo e bebendo na amizade e na concórdia. A festa reconcilia todas as coisas e nos devolve a saudade do paraíso das delícias, que nunca se perdeu totalmente. Platão sentenciava com razão:”os deuses fizeram as festas para que pudéssem respirar um pouco”. A festa não é um só um dia dos homens mas também “um dia que o Senhor fez” como diz o Salmo 117,24. Efetivamene, se a vida é uma caminhada onerosa, precisamos, às vezes, parar para respirar e, renovados, seguir adiante.
A festa parece um presente que já não depende de nós e que não podemos manipular. Pode-se preparar a festa. Mas a festividade, vale dizer, o espírito da festa, surge de graça. Ninguém a pode prever nem simplemente produzir. Apenas nos podemos prepar interior e exteriormente e acolhê-la.
Pertence à festa mais social (bodas, aniversário) a roupa festiva, a ornamentação, a música e até a dança. Donde brota a alegria da festa? Talvez Nietszche encontrou sua melhor formulação:”para alegrar-se de alguma coisa, precisa-se dizer a todas as coisas: sejam benvindas”. Portanto, para podermos festejar de verdade precisamos afirmar positivamente a totalidade das coisas.:”Se pudermos dizer sim a um único momento então teremos dito sim não só a nós mesmos mas à totalidade da existência” ”(Der Wille zur Macht, livro IV: Zucht und Züchtigung n.102).
Esse sim subjaz às nossas decisões cotidianas, em nosso trabalho, na preocupação pela família, na convivência com os colegas. A festa é o tempo forte no qual o sentido secreto da vida é vivido mesmo inconscientemente. Da festa saimos mais fortes para enfrentar as exigências da vida.
Em grande parte, a grandeza de uma religião, cristã ou não. reside em sua capacidade de celebrar e de festejar seus santos e mestres, os tempos sagrados, as datas fundacionais. Na festa cessam as interrogações do coração e o praticante celebra a alegriade de sua fé em companhia de irmãos e irmãs que com eles partilham das mesmas convicções, ouvem a mesma Palavra sagrada e se sentem próximos de Deus.
Vivendo desta forma, a festa religiosa, percebemos de como é equivocado o discurso que sensacionalisticamente anuncia a morte de Deus. Trata-se de um trágico sintoma de uma sociedade saturada de bens materiais, que assiste lentamente não a morte de Deus, mas a morte do homem que perdeu a capacidade de chorar, de se alegrar pela bondade da vida, pelo nascer do sol e pela carícia entre dois namorados.
Novamente nos socorre  Nietzsche que muito entendeu da verdade essencial do Deus vivo, sepultado sob tantos elementos envelhecidos de nossa cultura religiosa e da rigidez da ortodoxia das igrejas: a perda da jovialidade, isto é, da graça divina (jovialidade vem de Jupter, Jovis). É a consequência fundamental da morte de Deus (Fröhliche Wissenschaft III, aforismo 343 e 125).
Pelo fato de havermos perdido a jovialidade, grande parte de nossa cultura não sabe festejar. Conhece sim a frivolidade, os excessos do comer e beber, os palavrões grosseiros, e as festas montadas como comércio, nas quais há tudo menos alegria e jovialidade.
A festa tem que ser preparada e somente depois celebrada. Sem esta disposição interior corre o risco de perder seu sentido alimentador da vida onerosa que levamos. Hoje em dia vivemos em festas. Mas porque não sabemos nos preparar nem prepará-las. saimos delas vazios ou saturados quando seu sentido era de encher-nos de um sentido maior para levar avante a vida, sempre desafiante e para a maioria, trabalhosa.

(leonardo Boff)

publicado às 14:45

Foi uma idéia construtiva da CBF e do grupo técnico da seleção de futebol brasileira ter convocado uma psicóloga experiente na área, Regina Brandão, para acompanhar os jogadores nos seus jogos. A incorporação do acompanhamento psicológico já existe há anos na seleção alemã. O sentido é evidente: criar uma atmosfera de serenidade interior, celebrar as vitórias de forma controlada e criar as condições de uma boa resiliência nas derrotas, vale dizer, saber dar a volta por cima, aprender dos erros e melhorar o desempenho.
Mas estimo que isso ainda não é suficiente. A psicologia pode ser enriquecida com a mística. Não me venham logo dizer que estou introduzindo religião no futebol. Precisamos antes demais nada desmistificar a mística. Ela tem muitos significados, sendo que dois são principais: o sentido sociológico e o sentido espiritual mas não confessional.
Dou dois exemplos que esclarecem melhor do que muitas palavras. Nos dias 17 e 18 de maio de 1993, frei Betto e eu organizamos uma reflexão aberta sobre mística a espiritualidade. Era durante a semana, de manhã e de tarde. Vieram mais de 500 operários, a maioria metalúrgicos. Queriam saber que diabo é isso de místa e espiritualidade. Foram duas palestras de abertura. O resto, debates, do maior interesse e grande atenção de todos. Tudo foi registrado e saiu em livro já com muitas edições: Mística e Espiritualidade (Vozes 2014).
Outro exemplo: cada grande reunião do Movimento dos Sem Terra, com centenas de pessoas, sempre se inicia com uma “mística”. Que ocorre ai? Teatralizam-se os problemas vividos pelos participantes, criam-se símbolos significativos, entoam-se canções, ouvem-se testemunhos de luta e de vida. Nem sempre se fala de Deus. O que irrompe é um sentido de vida, um reforço na vontade de levar avante os projetos, de resistir, de denunciar e de criar coisas novas. O efeito final é o entusiasmo geral, leveza de espírito, congraçamento de todos. Por estas “celebrações” toca-se a dimensão mais profunda do ser humano, lá onde estão nossos melhores sonhos, nossas utopias, nossa determinação de melhor a vida. Esse é o sentido sociológico de mística. Ele se encontra referido na famosa palestra de Max Weber, um dos fundadores da sociologia, aos estudantes de Munique em 1919 sobre A política como vocação. Para ele, uma política digna desse nome (não o viver da política mas o viver para a política) implica numa mística, caso contrário se atola no pântano dos interesses individuais ou corporativos. Mística para Max Weber significa o conjunto das convicções profundas, as visões grandiosas e as paixões fortes que mobilizam pessoas e movimentos, inspirando práticas capazes de afrontar dificuldades e sustentando a esperança face aos fracassos. A maioria dos movimentos populares vivem desta mística face à dureza das dificuldades.
Pois esse tipo de mística pode e deve ser vivida pelos jogadores de futebol, mormente, os da seleção nas Copas Mundiais ou nos grandes torneios. Vejam que não se trata apenas de psicologia com suas motivações. Trata-se de valores, de sonhos bons, de entusiasmo. A questão é como chegar a isso?
Aqui vem o segundo sentido de mística, o espiritual. Mas precisamos fazer algum esclarecimento: temos um lado exterior, o nosso corpo com o qual entramos em contacto com os outros, a natureza e o universo. O futebol treina todas as virtualidades possíveis do corpo para criar o atleta e o craque. Mas não basta. Temos o nosso interior que é a psiqué habitada por paixões, amores, ódios, arquétipos profundos, a dimensão de luz e a de sombra. Tarefa de cada um é domesticar os demônios, potenciar os anjos bons de tal forma que possa viver em paz consigo mesmo, com os outros e não sermos vítimas dos impulsos e criando vítimas.
Mas temos também o profundo que é nosso lado espiritual. No nosso profundo, encontramos as indagações inescapáveis que nos acompanham ao largo da vida: Quem sou eu? Que faço neste mundo? Que posso esperar para além desta vida? Qual o sentido de jogar na Copa? Como devo me comportar nas vitórias e nas derrotas? Sabemos hoje pelas novas ciências da vida, da Terra e do universo que todas as coisas são interdependentes entre si e se entreajudam para viver. Tem que haver um elo que liga e re-liga todas elas.  Os cosmólogos falam da Energia de Fundo que subjaz a todo o universo e a cada coisa, tambem a cada pessoa. Temos ainda um Eu profundo de onde nos vém   sugestões e projetos que nos mobilizam.
No nivel humano um dos nome desta Energia de Fundo, poderosa e amorosa se chama entusiasmo. Gosto desta palavra porque entusiasmo em grego significa “ter um deus dentro”: aquela Energia que é maior que nós e que nos toma e que nos conduz pela vida afora. Sem entusiasmo nos acercamos do mundo da morte. A moderna ciência do cérebro identificou o que os cientistas chamaram o ponto Deus no cérebro ou a inteligência espiritual. Sempre que se abordam questões fundamentais da vida, se busca uma visão mais global, quando se pergunta pela Energia misteriosa que em tudo penetra e que tudo sustenta, há uma aceleração de uma zona dos neurônios maior que a normal. Somos dotados de um órgão interior pelo qual captamos aquilo que foi chamado de Tao, de Shiva, de Olorum, de Alá, de Javé, de Deus. Não importam os nomes: mas a experiência de uma Totalidade na qual estamos inseridos, um Elo que segura todas as coisas. Ativar o “ponto Deus” nos torna mais sensíveis aos outros, mais cuidadosos, mais amigos, compreensivos, atentos e inventidos em nossas jogadas e em nossas estratégias.
Creio que um jogador faria bem, antes de começar os treinos ou um jogo, retirar-se num canto, concentrar-se e escutar esse Eu profundo donde nascem as boas ideias, os bons sentimentos e se fortalece o “entusiasmo”. E há pessoas como frei Betto, Dom Marcelo Barros e outros que fariam magistralmente esse trabalho. Eles colocariam os jogadores afinados com o “ponto Deus” e dispensariam a magia do “Tois”. Haveria mais concentração, mais calma,mais sentido de grupo, pois o que faz vencer memo é a boa articulação do grupo, como sempre tem insistito Pelé. Isso não garante a vitória mas a torna mais provável e criaria o espaço para que ela irrompa como expressão feliz da Energia de Fundo que está sempre disponível para cada um e que pode sempre ser invocada e interiorizada. Ai o jogador é um perfeito craque no corpo, na psiqué e no espiritual.

Leonardo Boff por mais de 20 anos professor de espiritualidade e autor de Espiritualidade:caminho de transformação,Sextante, Rio 2000.

publicado às 14:44

O jogo para as semi-finais entre Brasil e Alemanha do dia 8 de julho no grande estádio de Belo-Horizonte significou uma justa vitória da seleção alemã e uma arrasadora e vergonhosa derrota brasileira. Milhões estavam nas praças e ruas de todas as cidades. A atmofera de euforia dos brasileiros, a maioria enfeitados de verde-amarelo, as cores nacionais, não toleraria jamais, sequer por imaginação, semelhante humilhação. E ela caiu como um raio em céu azul.
Vejo duas razões básicas que explicam o resultado final de 7×1 gols em favor da Alemanha. Os alemães, bem como outros times europeus, renovaram as estratégias e as formas de jogar futebol. Investiram, a meu ver, em três pontos básicos: cuidadoso preparo físico dos jogadores para ganharem grande resistência e velocidade; em segundo lugar, preparar craques individuais que pudessem jogar em qualquer posição e correr todo o campo e por fim criar um grande sentido de conjunto. Excelentes jogadores que não pretendem mostrar sua performance individual mas sabem se integrar no grupo formando um grupo coeso, tornam-se fortes favoritos em qualquer competição. Não que sejam invencíveis, pois vimos que, jogando com os USA, a seleção alemã teve grande dificuldade em ganhar. Mas as referidas qualidades foram o segredo da vitória alemã sobre o Brasil.
A grande questão foi a seleção brasileira. Criou-se quase como consenso nacional de que somos a pátria do futebol, que somos ganhadores de 5 copas mundiais, que temos o rei Pelé e craques excepcionais como Neymar e outros. Houve por parte da midia corporativa e das agências de apoio, a criação do mito do “Jogador da Copa”, elevado a herói e quase a um semi-deus. Esta atmosfera de euforia que atendia ao marketing das grandes empresas apoiadoras,, acabaram contaminando a mentalidade popular. Poderíamos perder, mas por pouco. Mas, para a grande maioria, a vitória era quase certa, ainda mais que os jogos estavam se realizando no próprio pais.
Essa euforia generalizada não preparou a população para aquilo que é próprio do esporte: a vitória ou a derrota ou o empate. A maioria jamais poderia imaginar, nem por sonho, que poderíamos conhecer uma derrota assim humilhante. A vitória era celebrada por antecipação. Grave equívoco, em grande parte, induzido pela mídia do oba-oba e da euforia, orquestrada por uma famosa rede de TV e seus comentaristas.
Mas houve também um penoso erro por parte da comissão técnica brasileira. Pelo nosso passado glorioso, ela julgou-se mestra a ponto de pretender ensinar aos outros como deve ser o futebol. Ficou sentada sobre as glórias do passado. Não se renovou.
Enquanto isso, em outros lugares, na Europa, especialmente na Alemanha e na Espanha mas também na América Latina como na Colômbia e em Costa Rica se desenvolvia uma nova compreensão do futebol, criaram-se novas táticas e formas de distribuir as posições dos jogadores em campo. Nada disso foi aproveitado pela comissão técnica brasileira, especialmente seu treinador Luis Felipe Scolari (chamado de Felipão). É uma figura paternal, severa e terna ao mesmo tempo, amada pelos jogadoras e, em geral, respeitada pelo público. Mas é teimoso e persistente em suas fórmulas, boas para o passado, mas inadequadas e questionáveis para o presente. Ele não se deu conta de que o mundo do futebol havia se transformado profundamente, embora tenha trabalhado fora do Brasil.
Não conseguiu duas coisas que permitem entender o fracasso fragoroso da seleção brasileira. Scolari não desestimulou o tradicional e exacerbado individualismo dos jogadores. Cada qual quer mostrar sua boa performance, quer dar o seu show particular, até em vista de eventual contratação por grandes times estrangeiros. Em segundo lugar, não conseguiu criar um grupo coeso com espírito de grupo. Os jogos deveriam colocar  o ênfase no grupo e em seguida nas qualidades específicas de cada jogador. Deixou os jogadores dispersos. Criaram vácuos inadmissíveis no meio do campo. Não souberam marcar os principais craques do time adversário.
Os alemães se deram conta desta fraqueza estrutural da seleção brasileira. Souberam explorá-la com habilidade. Nos primeiros minitos marcaram já o primeiro gol aos 29 minutos do primeiro tempo já era 5 a 0.
Tal desastre futebolístico criou uma espécie de pane na seleção brasileira. Ficou totalmente desnorteada. Falatou-lhe a serenidade diante das dificuldades e deixaram-se tomar pela desorientação. O próprio treinador Felipão Scolari não soube fazer as substitiuições necessárias. Estas ocorreram apenas no segundo tempo.
O jogo parecia uma disputa de um time suburbano e popular enfrentando uma seleção de nîvel internacional. Isso não era o futebol que sempre conhecíamos, cujos dirigentes não quiseram aprender nada dos outros, fechados em sua arrogância. Perdemos por arrogantes e ignorantes.
Tivéssemos 11 Neymares em campo sem um grupo coeso e ordenado, o resultado não seria tão diferente. Perdemos porque jogamos mal e jogamos mal porque não soubemos nos apropriar do novo que se ensaiou fora do Brasil. E não formamos um grupo articulado e versátil.
Sinto, pessoalmente, grande pena dos “brasileirinhos”  que com entusiasmo torceram pela seleção, como bem escreveu o jornalista André Trigueiro. A maioria agora se sente órfã. Aqui, nesse país pluridiverso, com uma população hospitaleira e lúdica, para ela quase nada funciona bem nem a saúde, nem a educação, nem o transporte e nem a segurança. Tirando o carnaval, não somos bons em quase nada, dizem. Mas pelo menos somos bons no futebol. Isso dava ao simples povo o sentido de auto-estima. Agora nem mais podemos apelar para o futebol. Por muitos e muitos anos esta terça-feira sinistra de 8 de julho de 2014 com 7 gols a 1 para a Alemanha nos acompanhará como uma sombra funesta. Mas o povo que suportou já tantas adversidades saberá dar a volta por cima. Ele detem uma resiliência histórica como poucos.
Espero apenas uma coisa: que a elite que, na abertura, vergonhasamente vaiou a Presidenta com palavrões indizíveis não volte a envergonhar o Brasil diante do mundo, quando ela entregar a taça ao vencedor. Como tais elites não costumam  frequentar  os estádios e têm pouco compromisso com o Brasil mas muito mais com seus privilégios serão capazes de renovar este  ato despudorado. Elas apenas mostrariam como se comportam diante do povo e do seu próprio país:com soberano desdém, pois sofrem por não viver em Miami ou em Paris e se sentirem condenadas a  viver acumulando aqui no Sul do mundo.
Menção honrora merece a seleção alemã que foi discreta na celebração e não se prevaleceu sobre uma vitória tão deslumbrante. E o povo brasileiro soube  entender esta atitude  e  lhe reconheceu a dignidade na vitória aplaudindo-a, pois se mostrou realmente melhor.

( Leonardo Boff )

publicado às 14:43

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