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De tudo e de nada, discorrendo com divagações pessoais ou reflexões de autores consagrados. Este deverá ser considerado um ficheiro divagante, sem preconceitos ou falsos pudores, sobre os assuntos mais variados, desmi(s)tificando verdades ou dogmas.
Da união deles nasceram primeiro seis meninos e seis meninas, os Titãs e as Titânides, todos de natureza divina, como seus pais. Eles também tiveram filhos.
Um deles, Hiperíon, uniu-se à sua irmã Téia, que pôs no mundo Hélio, o Sol, e Selene, a Lua, além de Eo, a Aurora. Outro, Jápeto, casou-se com Clímene, uma filha de Oceano. Ela lhe deu quatro filhos, entre eles Prometeu. O mais moço dos Titãs, Crono, logo, logo ia dar o que falar.
A descendência de Urano e Gaia não parou nesses filhos. Conceberam ainda seres monstruosos como os Ciclopes, que só tinham um olho, bem redondo, no meio da testa, e os Cem-Braços, monstros gigantescos e violentos. Os coitados viviam no Tártaro, uma região escondida nas profundezas da terra. Nenhum deles podia ver a luz do dia, porque seu pai os proibia de sair.
Gaia, a mãe, quis libertá-los. Ela apelou para seus primeiros filhos, os Titãs, mas todos se recusaram a ajudá-la, exceto Crono. Os dois arquitetaram juntos um plano que deveria acabar com o poder tirânico de Urano.
Certa noite, guiado pela mãe, Crono entrou no quarto dos pais. Estava muito escuro lá, mas o luar lhe permitiu ver seu pai, que roncava tranqüilo. Com um golpe de foice, cortou-lhe os testículos. Urano, mutilado, berrou de raiva, enquanto Gaia dava gritos de alegria. Esse atentado punha fim a uma autoridade que ela estava cansada de suportar, e a inútil descendência deles parava aí — ou quase... Algumas gotas de sangue da ferida de Urano caíram na terra e a fecundaram, dando origem a demônios, as Erínias,(1) a outros monstros, os Gigantes, e às ninfas,(2) as Melíades.
(C L A U D E P O U Z A D O U X - CONTOS E LENDAS DA MITOLOGIA GREGA)
NOTAS:
(1) Divindades infernais. Com seu corpo alado, sua cabeleira de serpentes e munidas de tochas e chicotes, atormentam
suas vítimas, levando-as à loucura.
(2) Deusas que vivem nos bosques, nas montanhas, nos rios, no mar.
Platão se serve com frequência de mitos para expor suas ideias. Há quem goste dos deuses e de suas aventuras. Mas, num texto filosófico, não é o que mais importa. Trata-se de artifício didático, como os exemplos dados em aula que ajudam a aproximar a ideia filosófica abstrata do repertório presumido do auditório.
A cena relatada é de um tempo em que homens e animais ainda não tinham dado as caras no mundo. Só havia deuses. Como Epimeteu e Prometeu, dois irmãos, filhos de titãs. E imortais, claro, como todos os deuses. Mas, a despeito de gozarem de tal privilégio, eram divindades secundárias. Dessas que nunca seriam chamadas para decidir ou fazer nada de importante.
Essa dupla vai merecer a atenção de Protágoras, conhecido sofista, num momento em que Zeus já havia vencido os titãs e colocado ordem na casa. Apesar da filiação, os irmãos não foram trancafiados no Tártaro, como seus pais. E é curioso o motivo de sua aparição na cena mitológica.
Zeus tinha instituído o Cosmos. Distribuiu o mundo aos seus parceiros. Passado um primeiro momento de alívio pelo fim da guerra entre a primeira e a segunda geração de deuses, seguiu-se um enorme tédio. Imaginem, depois do caos completo, as coisas todas em seus devidos lugares. Tudo adequadamente disposto. Lógico, cíclico e previsível. Astros em suas órbitas, dias e noites, ventos e marés. Tudo numa regularidade irritante, excluindo rigorosamente toda e qualquer possibilidade de surpresa. Os deuses não suportavam mais tanto marasmo. Era preciso dar um jeito naquilo. Epimeteu e Prometeu foram, então, escalados para fabricar mortais.
Uma interrupção rápida aqui para algumas inferências. Primeiro: o motivo inicial da produção de mortais foi o tédio. Isto é, se você, caro leitor, e eu estamos por aqui é porque os deuses estavam aborrecidos com a engenhoca cósmica que eles mesmos inventaram. Somos filhos do enfado divino. Cá entre nós, se não for do divino, pelo menos do tédio de muitos pais mortais, especialmente nos tempos pré-televisivos ou restritos à TV aberta.
Segundo: podemos deduzir deste enfado o que os deuses esperavam de nós, mortais, ao patrocinar e autorizar nossa existência. No mínimo, divertimento ou entretenimento. Bobos da corte olimpiana. E não só para fazer rir. Mas gozar também. Sabe-se que Zeus, deus dos deuses, tinha clara preferência pelas amantes humanas.
Terceiro: na hora de executar a fabricação dos mortais, o que incluía outros animais e plantas, deixaram a tarefa para dois deuses de quinta categoria! Como aqueles jogadores que ficam sempre no banco de reservas. Desprestígio total. Um deles, menos ligeiro das ideias que o outro. Epimeteu quer dizer aquele que pensa depois. E Prometeu, o contrário, aquele que pensa antes. Um lerdinho, outro espertinho.
Bem, o fato é que Epimeteu e Prometeu arregaçaram as mangas. E este último, sempre mais afoito para agir, propôs uma divisão da tarefa. Aquele se incumbiria dos animais. E deixaria os homens para o irmão, Prometeu, o mais antenado, que pensava um pouco mais antes de agir.
Epimeteu recorreu a todos os recursos naturais disponíveis para produzir os animais. E o fez à moda de Zeus. Buscando o equilíbrio, criando uma verdadeira biosfera. De tal modo que todos os animais pudessem dispor de algum recurso para enfrentar as intempéries e predadores. Assim, os mais pesados, os mais velozes, os mais contundentes, os mais ágeis. Uns com couro, outros com carapaça, outros com ferrão, etc. Cada um na sua. Preocupou-se também com o todo. Com a preservação de todas as espécies, do entorno, do meio ambiente. Assim, por exemplo, carnívoros alcançam mais rapidamente a saciedade do que herbívoros. A distribuição dos recursos naturais alinhava naturalmente cada criatura ao cosmos definido por Zeus. Apesar de Epimeteu ser Epimeteu, fez um trabalho de grande inteligência.
A não ser pelo fato de ter deixado seu irmão na mão. Ao conceder aos animais todos os bens naturais, note bem, TODOS, acabou condenando Prometeu a fazer o homem sem nada, praticamente sem recursos. Lembro-me de meu primeiro Chevette S. Nunca soube o que o “S” queria dizer ao certo. Simples, talvez. Standard, dirão os mais entendidos. Ou, “S” de sem nada. Nenhum acessório. Recurso zero. Nem couro, nem barbatana, nem muita força, nem peso, nem faro potente, nem mandíbula, nem nada.
Atente para este “nada”. Vamos precisar dele mais tarde. Em pleno século XX. Na hora em que o existencialismo de Jean-Paul Sartre for explicar o que entende por liberdade em O ser e o nada.
Para compensar tanta carência natural, Prometeu se viu obrigado a roubar, no palácio de Atena, a astúcia. Surrupiou também o fogo em outro lugar. Assim, o homem, zerado de natureza, “nadadizado” de recursos, poderia, produzir com próprio esforço tudo o que precisasse, as ferramentas que lhe fossem necessárias.
Poderia também fazer da vida o que bem entendesse. Sem as habilidades garantidas por Epimeteu aos animais, o homem viu-se desobrigado de qualquer alinhamento. Se a vida dependia da sua astúcia, o homem não poderia ser nada antes de usá-la. Em outras palavras, a burrada de Epimeteu nos deixou num mato sem cachorro. Porém, livres para viver do próprio modo. No nosso caso, alinhar-nos com o universo cósmico é uma questão ética. Uma escolha. Contingente. Que exige saberes sobre nós mesmos e sobre o universo. Saberes que nem sempre temos.
Ancestralidade pouco nobre, portanto, esta da liberdade. E, como se não bastasse, os deuses ficaram furiosos. Prometeu foi castigado por Zeus. Amarrado em um Rochedo, sofreu com o ataque das aves de rapina que queriam comer suas vísceras. Crueldade redobrada se considerarmos que se tratava de um deus, que não morria nunca. Prometeu acabou solto pela intervenção do filho de Zeus. Vale a pena a leitura do relato platônico. Sempre tendo em mente a problemática filosófica que lhe confere densidade. Esta reflexão sobre a liberdade acabou tendo sequência no pensamento moderno. Com Jean-Jacques Rousseau.
(Clóvis de Barros Filho e Júlio Pompeu - A filosofia explica as grandes questões da humanidade)
A taxa de homicídios na região metropolitana de São Luís teve alta de 62% desde 2010, após Roseana Sarney voltar ao poder no Maranhão. Anteontem, a governadora atribuiu a violência ao fato de o Estado estar “mais rico”. Apesar do crescimento da economia, porém, o Maranhão segue com o segundo pior PIB per capita e o segundo pior IDH regional do País (veja quadro abaixo).
— Um dos problemas que estão piorando a segurança é que o Estado está mais rico, o que aumenta o número de habitantes — afirmou Roseana depois de reunir-se com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo na quinta-feira (9). A frase foi publicada pelo jornal “O Globo”.
Roseana reassumiu o governo do Maranhão em 17 de abril de 2009, após a Justiça cassar o mandato de Jackson Lago (PDT), acusado de crime eleitoral. Antes, a filha de José Sarney já havia governado o Estado de 1995 a 2002.
Em 2010, primeiro ano completo da governadora de volta ao poder, a região metropolitana de São Luís registrou 499 homicídios, segundo dados da Secretaria de Estado da Segurança Pública. No ano passado, a violência na região fez 807 vítimas.
Para a pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da USP e professora da UFABC (Universidade Federal do ABC) Camila Dias, a relação entre violência e riqueza do Estado feito pela governadora é “absurda” e pode ser considerada um "escárnio” à população maranhense.
— Um Estado dominado há décadas pela mesma família, com problemas gravíssimos, e ela dá uma explicação dessas. É um escárnio àquela população tão empobrecida e tão sofrida. O que produz a violência é a extrema desigualdade. Há uma porção muito pequena de pessoas muito ricas e uma parcela gigantesca de pessoas pobres, sem acesso a direitos, sem acesso a bens básicos para uma vida digna.
O Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil 2013, divulgado pelo Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), aponta que o Maranhão tem o segundo pior IDH do País, atrás apenas de Alagoas. O índice, calculado com base em dados de 2010, leva em conta a expectativa de vida, a escolaridade e a renda da população. A taxa do Maranhão é semelhante à obtida em 2012 pela Síria, país que vive em guerra civil.
Economia comparável ao Reino de Tonga
De acordo com o relatório de contas regionais divulgado pelo IBGE em novembro passado, a economia do Maranhão realmente ganhou relevância desde a primeira ver que Roseana assumiu o governo, em 1995. Na época, o Estado contribuía com 0,9% do PIB nacional. A proporção subiu para 1,3% em 2011.
Desde 1995, Roseana só deixou de ter influência no governo maranhense durante o curto período em que Lago permaneceu no poder. Além dela e do pedetista, o único a governar o Estado foi José Reinaldo Carneiro Tavares, vice que herdou o cargo de Roseana em 2002 e conseguiu se reeleger.
Mas, mesmo com o avanço, o Estado segue entre os mais pobres do País. O PIB per capita do Maranhão só perde para o do Piauí. No ano passado, a revista britânica “The Economist” comparou a taxa do Estado à do Reino de Tonga, pequena ilha da Oceania. Na mesma publicação, Tocantins (estado vizinho ao Maranhão) foi comparado à emergente África do Sul e o Distrito Federal, a Portugal.
A pesquisadora Camila Dias afirma que o crescimento econômico do Maranhão não aconteceu de maneira uniforme, para atingir todas as camadas da sociedade.
— O desenvolvimento econômico de uma região provoca, às vezes, um aumento da violência porque esse desenvolvimento é extremamente desigual. O Maranhão é um Estado que tem os piores índices sociais em relação a quase todos os indicadores de qualidade de vida.
De acordo com o Altas do Desenvolvimento Humano no Brasil 2013, mais da metade da riqueza do Maranhão concentra-se nas mãos dos 10% mais ricos. Os dados, de 2010, apontam que 39% dos moradores do Estado vivem na pobreza. E uma em cada cinco pessoas com 15 anos ou mais não sabem ler e escrever.
Violência cresce mais que população
Diferentemente da afirmação de Roseana, a projeção populacional do IBGE não considera uma aumento vertiginoso do moradores do Maranhão por causa da maior relevância da economia regional. O instituto estima que a população da capital tenha subido de 1.014.837, segundo o Censo 2010, para 1.053.922, em 2013. Uma alta de 2,4%, bem inferior ao avanço de 62% da criminalidade.
Os portugueses com mais habilitações e mais rendimentos são os que dão menos importância à solidariedade, à justiça e aos valores democráticos. Esta é a apenas uma das conclusões do estudo da Universidade Católica Portuguesa e do Instituto Luso-Ilírio para o Desenvolvimento Humano, que vai ser apresentado na quinta-feira em Mafra.
“Quanto mais avançamos nos níveis de instrução, do 1º ciclo até ao ensino superior, a importância da justiça ou da solidariedade vai baixando progressivamente. São os mais instruídos e os mais ricos que desvalorizam a justiça e a solidariedade”, diz Lourenço Xavier de Carvalho, coordenador deste estudo que é também a tese de doutoramento em Ciências da Educação que apresentou na Universidade Católica em 2013.
Quando questionados sobre a importância de ajudar os outros, 86,5% das pessoas com o 1.º ciclo respondem afirmativamente, uma percentagem que baixa para 83,4% quando as pessoas têm o 2.º ciclo, para 73,5% quando têm o 3.º ciclo, que sobe ligeiramente para 76,2% quando possuem o secundário, desce para 59,2% quando têm bacharelato, ficando o valor mais baixo na fatia dos licenciados, mestres ou doutorados, com 53,1%.
A mesma pergunta cruzada com os níveis de rendimento revela que 86,4% das pessoas que ganham até 500 euros considera muito importante ajudar os outros, percentagem que vai baixando à medida que os rendimentos aumentam e que atinge o valor mais pequeno – 46,7% - quando chega ao grupo dos que ganham mais de 4 mil euros por mês.
No que toca, por exemplo, à importância dada a “lutar por uma causa justa” – o indicador usado para aferir a posição da justiça como valor social – conclui-se que os portugueses com mais instrução desvalorizam este aspecto. São as pessoas com o 2.º ciclo que mais valorizam a luta por uma causa justa (86,2%), ficando a fatia mais pequena (56,9%) para quem tem estudos superiores.
O estudo também indica que “as pessoas que têm muito baixos rendimentos, abaixo dos 500 euros, têm níveis de felicidade mais baixos” que “só são iguais aos dos níveis de rendimento mais elevados”: “Quem tem mais de 4 mil euros por mês é tão infeliz como quem tem menos de 500”, nota o investigador.
A explicação para estes dados poderá passar, segundo Lourenço Xavier de Carvalho, pela própria educação e formação que está a ser dada às pessoas: “Está associado a este fenómeno dos elevados rendimentos e dos elevados níveis de instrução serem um pouco contrários àquilo que é a harmonia social e o desenvolvimento pessoal”, explica Lourenço Xavier de Carvalho, insistindo que é preciso mudar o sentido da educação. “Continuamos a educar para o domínio material, para o domínio técnico, queremos formar profissionais competentes, que dominem bem as técnicas de cada área, e os currículos são cada vez mais técnicos. Mas na realidade não é isso que faz as pessoas mais ou menos felizes. É a dimensão humana, relacional, que está cada vez mais afastada dos currículos”, frisa, defendendo que “as prioridades do sistema educativo estão completamente erradas”.
Individualismo crescente
Para este investigador, quanto mais se avança na escala de instrução, mais os currículos são “técnicos” e “desprovidos da dimensão humana”: “As pessoas tornam-se cada vez mais competitivas, cada vez mais insensíveis ao sofrimento dos outros, cada vez se sentem menos responsáveis pelo bem comum. Acabam por ter as ferramentas de decisão, mas não têm as competências pessoais e sociais para serem bons líderes”, sublinha.
A leitura dos dados permite ainda verificar que, nos últimos dez anos, as pessoas tornaram-se mais tolerantes em relação grupos discriminados na sociedade portuguesa, mas ao mesmo tempo mais individualistas. De acordo com o estudo, na última década, os indicadores relativos ao individualismo mostram que cresceu em média 10%. “As pessoas são mais desconfiadas do que eram, acreditam mais naquelas expressões ‘cada um por si’ e ‘olho por olho, dente por dente’.
Rendimentos e estudos à parte, o investigador verificou, porém, que, quando questionada sobre os objectivos de vida, a generalidade das pessoas revela uma aproximação a valores como “a honra, o amar e ser amado e a família”. Para Lourenço Xavier de Carvalho, é o sistema educativo e a competição que estão a afastar as pessoas do que “realmente as faz felizes”.
Neste aspecto, para a generalidade das pessoas - e não especificamente no segmento das mais letradas e ricas - a família surge no topo: “Ter uma família sólida passou a ser o mais importante de todos os objectivos de vida”, diz o investigador, precisando que a família surge como a “instituição de mais confiança para as pessoas” e em relação à qual estão dispostas a fazer mais sacrifícios. Em média, mais de 90% dos inquiridos valoriza a família - percentagem que baixa para cerca de 80% quando os níveis de escolaridade são mais elevados.
Apesar do individualismo crescente, nos últimos dez anos a maioria das pessoas - e mais uma vez, o investigador não está centrado nas variáveis do estudo/rendimento - também se voltaram mais para a espiritualidade num sentido lato, fenómeno ao qual não será alheia a crise: “1999 era o auge da materialidade, do investimento, lembramo-nos da Expo 98 e dos grandes investimentos públicos, atirava-se dinheiro para cima das coisas, dos problemas, para os resolver”, recorda o investigador.
Dez anos depois, as transformações ocorridas levaram muitas pessoas a procurar outras referências: “Em 2009 batemos no fundo, estamos no pico da crise, é muito provável que a movimentação das pessoas para a maior valorização do imaterial tenha a ver com essa experiência de crise, de perceber que, afinal, houve aqui uma ilusão de que o dinheiro, o prestígio, o estatuto, o poder, poderia resolver os problemas todos. E afinal o que resolve os problemas é a proximidade à família, são as relações harmoniosas, amar e ser amado”, nota.
Na quinta-feira, o estudo vai ser debatido no Palácio Nacional de Mafra, numa conferência que vai juntar investigadores e peritos europeus, entre os quais a princesa Laurentien da Holanda, enviada especial da UNESCO em literacia para o desenvolvimento.
(Maria joão Lopes)
Enquanto muitos brasileiros apelam a uma intervenção Federal pela violencia que impera no Estado do Maranhão, a Governadora Roseana Sarney, “alheia” à pobreza que impera naquela região controlada pela familia Sarney, está licitando R$ 1 milhão em produtos de luxo para serem entregues no Palácio dos Leões (sede do governo), no Palácio Henrique de La Rocque (Casa Civil) e na residência de veraneio da governadora. Segundo o edital, todos os itens devem ser de “primeira qualidade”.
Aqui está tudo bem… o povo come lagosta e bebe o melhor vinho
Os pedidos foram feitos em meio ao caos do sistema penitenciário do estado. Na lista de alimentos perecíveis, que totaliza R$ 617.514,61, chamam atenção os pedidos de 500 kg de galinha caipira fresca (R$ 13.665,00); 850 kg de filé-mignon limpo (R$ 29.180,50); quase duas toneladas e meia de camarão, entre os tipos fresco grande e médio e seco torrado e graúdo (R$ 102.045,00); além de 180 kg de salmão fresco e defumado (R$ 9.760,00) e 80 kg de lagosta fresca (R$ R$ 6.373,60), 800 quilos de camarão fresco grande, 750 quilos de patinha de caranguejo, 100 unidades de barras de chocolate e 30 quilos de castanhas portuguesas “de primeira qualidade”.
Entre os alimentos não-perecíveis, que totalizam R$ 504.205,90, constam 1.500 vidros de azeite de oliva espanhol e português (R$ 30.715,00); 100 kg de castanha de caju (R$ 5.238,00); 80 kg de castanha do pará e castanha portuguesa (R$ 5.267,50); 60 vidros de geleia francesa de morango, pêssego e cassis (R$ 648,00), além de 1.200 fardos de ração para peixes (R$ 108.600,00). Somente de bebidas, entre refrigerantes e água mineral, serão 15.200 unidades (R$ 69.100,00).
Segundo os editais, os gêneros alimentícios devem ser de primeira qualidade e de marca conhecida nacionalmente”. O 1º Pregão estava marcada para esta quinta-feira (9) e o 2º Pregão (n° 071), está previsto para as 14,30, desta sexta-feira (10).
As encomendas devem ser entregues no Palácio dos Leões (sede do governo), no Palácio Henrique de La Rocque (Casa Civil) e na residência de veraneio da governadora, na Ponta do Farol, em São Luís.
Em face às inumeras manifestações a Governadora Roseane Sarney, filha de José Sarney, um dos politicos mais famosos e contestados do Brasil, suspendeu temporariamente parte da licitação de gêneros alimentícios “perecíveis” e “não perecíveis”, entre eles 80 quilos de lagosta fresca e 800 quilos de camarão fresco grande, mas a governadora do Maranhão manteve licitação destinada à contratação de empresa para fornecer whisky escocês de 12 anos, vinhos franceses, italianos, chilenos, espanhóis e portugueses, além de champanhe dos tipos brut e demi-sec. Segundo o edital, todos os itens devem ser de “primeira qualidade”.
A licitação, no modelo pregão, em que vencerá a empresa que apresentar o menor preço, está marcada para o próximo dia 17. A compra prevê a contratação de empresa para organização de eventos de interesse da Casa Civil, incluindo serviços de infraestrutura, logística e planejamento, em todo o estado. O governo maranhense estima gastar R$ 1.392.549,60.
Conforme o EDITAL, a empresa vencedora deverá oferecer cinco opções de cardápio para almoço e jantar. As recepções do governo maranhense preevem caldeirada de camarão grande, tagliatelli ao molho de lagosta, bacalhau à Gomes de Sá, além de carneiro ao molho de hortelã e cabrito ao vinho.
Ainda de acordo com o edital de licitação, a empresa vencedora deverá servir também duas opções de cardápio para coquetéis. Eles devem conter tábuas de frios e queijos, camarão ao molho golf à milanesa, cartuchos de lagosta e ovos de codorna ao molho golf.
Como opções para lanche, o governo maranhense prevê rocambole de bacalhau, trouxinha, croquete, quibe, esfirra, pastel russo, cartucho, empada, torta de sanduíche de metro (recheado de queijo e presunto, patê de frango, alface e tomate), bolo de chocolate em quadradinhos, sanduíche americano, biscoitos finos de polvilho e amanteigados, além de frutas “laminadas”.
(Graciano Coutinho - Jornalista)
Um homem é um homem, e não consta que um primeiro-ministro seja um bicho. E se é verdade que várias gerações de barba dura criaram e prolongaram o mito de que os homens não choram, parceira verdade é que os varões portugueses, quando se lhes aflora a corda sensível, lagrimejam como qualquer heroína de fotonovela ou soluçam profundamente como um herói camiliano. Fraquezas assim atacam-nos, no geral, entre quatro paredes, sem testemunhas, ou não outras além das que mereçam o privilégio. Posto o que o lenço ou as costas da mão apagam os vestígios, e a vida continua.
O pior é quando a objectiva fotográfica ou a câmara de filmar fixam o instante, registam a sequência: aí fica um primeiro-ministro desarmado, com o papel a tremer-lhe na mão, os óculos a escorregar para a ponta de um nariz que subitamente se congestiona, enquanto lá em cima os olhos procuram uma fresta na película da lágrima, os músculos se contraem para reter a comoção que ameaça desmanchar a fatigada composição do rosto, e a voz enrouquece e tem de suspender-se e dominar-se para que dois milhões de telespectadores não vejam um primeiro-ministro a chorar. Assim eu vi o Sr. Mário Soares há oito dias na televisão, quando era mostrada a entrega da casa de Manuel Mendes ao Estado, e uma parte (oh, tão pequena!) da intelectualidade portuguesa fazia cortejo e cercadura. Nesse momento, apesar de saber inconciliáveis aquilo que penso e aquilo que o primeiro-ministro faz, não pude eu deixar de enternecer-me. Ali estava um homem aflito, a tropeçar na lágrima, a tentar disfarçá-la como um menino, e eu a olhar, respeitosamente a olhar, e depois a pensar como é que a esquerda deste país chegou a isto, a procurar descobrir as culpas e a desesperar das soluções. Ponto este sobre que não vale a pena falar: o governo socialista vai tão longe no seu mercadejar e na sua alienação, que o melhor é não lhe mexer muito agora, não venha aí a náusea.
Mas o diabo da imagem perturba-me, confunde esta minha ira semanária, esta indignação. Está ali a imagem do Sr. Mário Soares, primeiro-ministro por obra de votos que foram muitos e agora são muito menos, está ali um homem a recordar outro homem e a comover-se com isso, só porque o homem recordado foi um anti-fascista, um lutador, um democrata. E também um escritor, um homem da cultura. Até parece que Portugal de repente se reencontrou.
Porém, que lágrimas reprimidas são essas? Mera fadiga nervosa? Sensibili-dade fragilizada pelas tensões políticas, pelos acidentes da convergência, pelas negociações com o Fundo Monetário Internacional? Manejo político muito a frio para envolver os ossos de Manuel Mendes no regaço de um partido um pouco deserdado de intelectuais vivos? Ou, pelo contrário, emoção real, sentidíssima, de amigo? Decida quem puder, A mim só me cumpre reflectir sobre o acaso ou a fraqueza que fez comover-se o Sr. Mário Soares naquele momento, naquele lugar, ele tão prático, ele tão estadista internacional, ele, enfim, tão certo do seu lugar na História. Porque isso me dá pretexto para o convidar, se e enquanto tiver tempo para isso, a virar um pouco os seus agora nublados olhos cá para os lados onde se extenuam e já se vão extinguindo os artistas e os escritores desta terra, mal empregados e mal empregues, tão desdenhados como no tempo do fascismo, tão mal queridos como Manuel Mendes foi para os senhores que então governavam.
Deste lado de cá (é em meu nome que falo agora) admite-se a sinceridade da comoção, mas há razão para suspeitar do que ela realmente cobre.
Este governo tem uma secretaria de Estado da Cultura, dependente da presidência do Conselho de Ministros, unha com carne, plano e prática, flor e fruto. Que faz, porém, essa secretaria, essa presidência, esse conselho, esse ministério todo? Pela cultura, que se aproveite, nada. Inaugura um museu do trajo, vai à Venezuela, corta subsídios, quebra a espinha ao teatro independente, ri-se do teatro amador, não dá um suspiro sobre os problemas gravíssimos do livro português, ignora as traficâncias do papel e da pasta com que ele se faz ou que vem a render, despreza a imprensa progressista, promete os mundos e subtrai os fundos, repete, enfim, ponto por ponto, a costura cultural do marcelismo.
Assim sendo (porque assim é) de que serve receber o primeiro-ministro a casa que foi de Manuel Mendes, comover-se ao ler palavras que provavelmente não terá escrito - se a cultura viva, que neste País retoma o caminho das antigas e sabidas penas, lhe é estranha, alheia, tratada como inimiga? De que serve ter ficado eu próprio impressionado, quase a reconciliar-me com a imagem (só a imagem) do primeiro-ministro se tudo isso é, afinal, dramaturgia política sem consequências, modos de levar o caldo da cultura ao moinho da secretaria, fantasias de telejornal em que o mais certo é só eu ter reparado?
E além disso, se o Sr. Mário Soares já perdeu tantos amigos, tem a certeza de que o fala-direito que foi Manuel Mendes lhe estenderia hoje a mão?
(José Saramago - Folhas políticas)
O ex-presidente de Portugal, Mário Soares, em 9 de Janeiro de 2014, foi apanhado pelo radar do Destacamento de Trânsito de Leiria da GNR a circular a 199 km/hora na A8. Soares era conduzido pelo motorista, numa viatura oficial.
Os GNR apreenderam a carta do motorista porque perante a opção de pagar 300 euros de multa, logo na altura, ou o condutor ficar com a carta apreendida, segundo o Correio da Manhã, Mário Soares afirmou: “O Estado é que vai pagar a multa”.
O veículo, em nome da Direção-Geral do Tesouro e das Finanças foi mandado parar na área de serviço da zona de Leiria. Também de acordo com o Correio da Manhã, quando os guardas se aproximaram, Mário Soares terá sido “bastante mal educado”, segundo fonte da GNR.
A infração por excesso de velocidade de Mário Soares – apanhado ontem a cerca de 200km/h na A8, em Leiria – volta a levantar o problema do regime de exceção aplicado a viaturas oficiais. A lei não especifica o que considera ser “marcha urgente de interesse público e os políticos abusam”, acusa o porta-voz da Associação de Cidadãos Auto-Mobilizados.
Para o presidente da Automóvel Club de Portugal, Carlos Barbosa, o comportamento do ex-presidente da República foi “inaceitável” a vários níveis. “Não deu o exemplo e disse que seria o Estado a pagar, pelos vistos, em tom mal educado”.
Manuel João Ramos, da ACA-M, condena de forma veemente a conduta “anti-social de Mário Soares” e explica que é preciso legislar no sentido de tornar cúmplice o político, para que não recaia a culpa no motorista, como sucedeu no caso Mário Mendes. Soares também era conduzido por motorista. “Afinal, quando se pode considerar marcha urgente e colocar em risco a vida dos outros?”.
Utilizam o regime de exceção viaturas oficiais, ambulâncias, equipas de futebol, concretiza a ACAM. O princípio que o justifica – a segurança – baseia-se na ideia de que a alta velocidade pode evitar atentados. Não foi possível obter reação, em tempo útil, de Mário Soares e um esclarecimento da parte da Autoridade Nacional Segurança Rodoviária.
dn