O que para uma cultura ou pessoa é sexualmente satisfatório, para outra pode ser um problema. Nos casamentos atuais, em geral voltados para a realização amorosa e sexual, qualquer uma das situações abaixo tende a ser percebida de forma negativa. Talvez algumas se apliquem ao seu caso:
1. Falta desejo ou libido para procurar uma aproximação sexual;
2. Uma vez iniciada a aproximação sexual, não surge a excitação;
3. Dificuldade de manter a excitação nas preliminares ou durante o sexo;
4. Dificuldade de chegar ao orgasmo;
5. Tudo funciona, mas é mecânico e pouco emocional, mesmo o orgasmo é oco;
6. Um de vocês sofre de “distúrbios sexuais”, como ejaculação precoce, anorgasmia, vaginismo, impotência etc.;
7. A frequência de relações está abaixo do desejado por um dos parceiros, e não corresponde ao socialmente esperado na idade e no ciclo de casamento.
Qualquer uma dessas situações pode estar ligada diretamente a algum dos aspectos eróticos que já discutimos no capítulo sobre atração e vida sexual. Pode faltar química sexual entre você e seu parceiro, ou talvez vocês não se entendam nas preferências eróticas. Ou um de vocês não tem habilidade sexual. Ainda há outras possibilidades.
Algumas das sete dificuldades listadas podem derivar de inibições sexuais anteriores ao casamento, que pouco têm a ver com o parceiro.
Também é possível que você ou seu parceiro simplesmente queira mudar de cenário e trocar de objeto sexual. Ao menos por um tempo, você quer sentir outro corpo, outros cheiros, toques, ter a emoção do flerte, da conquista, sair do roteiro previsível, ter uma paixão! E por isso está sentindo menos desejo e prazer.
Os problemas sexuais podem derivar de áreas não diretamente eróticas. Por exemplo, brigas e ressentimentos fora da cama que acabam contaminando o sexo.
Há também os casos em que fatores orgânicos (disfunções hormonais, efeitos colaterais de medicação) interferem no desejo e no gozo.
Já falamos em outros capítulos de quais fatores indiretamente sexuais podem contaminar seu desejo. Neste capítulo, vamos nos concentrar nas possibilidades de atuar sobre os quatro aspectos diretamente eróticos da relação — química, habilidade, preferências e ambiente sexual. Para atuar sobre as dimensões sexuais é preciso que você se comunique sexualmente com seu parceiro. Portanto, cabe uma breve palavra sobre a comunicação na cama.
Comunicações sexuais
com ou sem palavras 1. Falando sobre sexo sem usar palavras Conversar sobre preferências sexuais de cada um ou sobre a eventual falta de habilidades sexuais do parceiro pode ser bastante difícil. Há pessoas muito tímidas ou desajeitadas — e há culturas que não favorecem esse tipo de diálogo. Na cultura norte-americana, falar sobre as preferências sexuais ou sobre habilidade nas manobras sexuais é mais fácil do que na brasileira, que enxerga esse tipo de conversa como pouco romântica ou como uma “fraqueza do macho” e “devassidão da mulher”. Na cultura tradicional japonesa ou muçulmana, esse tipo de conversa nem sequer tem espaço para ocorrer. Se para vocês for difícil falar de sexo, há formas de tentar se comunicar por vias não verbais.
Por exemplo, você pode ensinar seu parceiro não só sobre suas necessidades pessoais no sexo, como também sobre as necessidades sexuais de seu gênero, mostrando e fazendo coisas, em vez de falar a respeito delas. Para isso, tem de ser suficientemente desinibido para autorizar a si mesmo e ao parceiro a explorar a sexualidade, tateando, fazendo e observando as reações do outro. Você precisa aprender a observar sinais, iniciativas e respostas, e também a sinalizar de modo adequado o que o agrada ou não.
Se você for muito tímido, tente ir aos poucos, avance a cada semana. Pode experimentar conduzir as mãos, os genitais ou outras partes do corpo do parceiro, ou indicar um ritmo diferente. Para os tímidos, é mais fácil tentar fazê-lo de modo progressivo, ao longo de vários dias ou semanas. O pior que pode acontecer é que o parceiro diga “não” ou sinalize que não quer — nesse caso, você simplesmente volta ao padrão anterior.
O mesmo vale para a sinalização que você der ao parceiro a respeito de como está recebendo as ações dele. Se você não é desinibido, tente se comunicar por meio de sonorização sexual, ritmo ou colaborando e intensificando fisicamente a manobra do parceiro. Dessa forma você pode confirmar que a postura dele o está agradando ou, ao contrário, pode gentilmente se recolher. Mesmo que for tímido, tente ser suficientemente expressivo. Você pode afastar áreas de seu corpo ou do corpo do parceiro, alterar o ritmo ou até verbalizar um gentil “prefiro do outro modo” ou “assim está desconfortável para mim”.
Cuidado para não reprimir o parceiro com um ar escandalizado ou com uma atitude veemente ou brusca. Respeite as necessidades e fantasias de cada um, entre em conexão com a história dessa necessidade, com a intensidade dela, compreenda o desejo do corpo e da mente de seu parceiro. Respeite as diferenças e, se não quiser sequer experimentar, ao menos seja cuidadoso ao recusar.
Se quiser desenvolver sua habilidade sexual e introduzir eventuais fantasias e preferências sexuais, seu desafio será ter a coragem de testar essas novas possibilidades. Use seu bom gosto e senso de oportunidade para levar para a relação as novas práticas que você quer tentar, de forma a não ficar estranho ou bizarro. Mas não deixe de tentar!
Em minha experiência de vinte anos com casais, nunca vi uma tentativa de inovação sexual de um parceiro tímido causar problemas de relacionamento. Ao contrário, vejo — com frequência — cônjuges surpresos com a reação positiva de seu parceiro, que antes ele imaginava cheio de tabus, mas que, na verdade, estava havia anos só esperando que o outro tivesse coragem de ousar.
Claro que há práticas — como levar o parceiro para um swing de casais ou usar um vibrador — que dificilmente poderão ser tentadas em silêncio e paulatinamente. Nesse caso, você terá de conversar. Aos poucos, você pode ir explorando a visão do parceiro sobre o assunto, tateando as respostas e compartilhando suas fantasias
2. Comunicando-se — com palavras — sobre habilidades e preferências sexuais
Entraves típicos a uma conversa aberta sobre sexo são:
I. A inibição cultural em falar de sexo. Há diversos preconceitos, como considerar sexo algo “sujo” ou achar que falar de aspectos “técnicos” acaba com a graça e a magia.
II. Medo de que, ao falar de sexo, você abale a autoestima do parceiro. Será que, se você disser ao parceiro que ele não o está agradando, ele irá se ver como um amante incompetente?
Vencer esses dois entraves pode ser difícil para pessoas tímidas ou sexualmente inibidas, mas talvez você possa pensar que falar de sexo é necessário para a maioria dos casais que gostaria de se ajustar nessa área. Vocês provavelmente não são telepatas, e uma sintonia sexual mágica e natural é algo raro.
Pessoas mais tímidas preferem esperar por uma “ocasião natural” para falar sobre o assunto, mas isso pode levar semanas, meses ou anos. Em geral, em todas as áreas problemáticas do casamento, é melhor você aprender a abordar o assunto de modo proativo, sabendo escolher um momento adequado e uma forma respeitosa. Para falar de sexo vale o mesmo: escolha um momento calmo e íntimo para ativamente puxar o assunto, usando de tato e carinho. Crie você mesmo as ocasiões e empregue o diálogo em conexão (capítulo 13).
Nem sempre a conversa sobre sexo tem de ser profunda e se constituir como um diálogo extenso. Para falar de suas preferências e ajustar manobras “técnicas”, há casos em que se pode ser mais direto. Como a tímida Juliana experimentou.
Agora vou lhe mostrar algo André beijava Juliana de um modo que não a agradava. Para ela, o beijo era muito molhado, com uma língua muito invasiva, e demorado demais, sufocando-a. Em certa ocasião, antes de começarem a se beijar, ela experimentou ir sussurrando, de modo sensual e sedutor, algo como: “Hoje eu vou conduzi-lo, deixe-me mostrar como eu adoraria que você me beijasse”. Funcionou e evoluiu para diversas comunicações sexuais divertidas ao longo do mês a respeito de outras manobras sexuais. Para tratar de situações mais complexas, é melhor você seguir os cinco passos do diálogo em conexão. Juliana, por exemplo, se incomodava quando o marido, durante o ato sexual, lhe perguntava diversas vezes se ela estava gostando ou se tinha gozado. Ao “cobrá-la”, ele a deixava ansiosa. E pior: prolongava além do razoável o ato sexual, insistindo em extrair dela um orgasmo.
Ela decidiu ter um diálogo em conexão sobre o tema. No passo 1, elogiou o empenho dele em agradá-la. No passo 2, explorou como ele via essa questão do orgasmo dela. Depois, no passo 3, empatizou. Finalmente, no passo 4, compartilhou com ele algo como: “Adoro que você queira me dar prazer e que não seja egoísta, mas para nós, mulheres, chegar ao orgasmo tem outro significado do que para vocês. Uma minoria de mulheres tem orgasmo tão facilmente. Mas há atos sexuais sem orgasmo que são muito prazerosos. Fico aflita se você pensa que preciso sempre ter um orgasmo e que você tenha de me proporcionar isso. Sinto-me cobrada e vejo você se cobrando. Queria tranquilizá-lo e dizer que, quando eu achar que você deve me esperar, avisarei. Quando eu não disser nada, você pode seguir em frente e chegar você ao orgasmo. Isso para mim também é delicioso”.
Há muitos outros modos de iniciar e conduzir uma conversa sobre sexo. Você pode casualmente investigar o que seu parceiro sente sobre a vida sexual de vocês, ou ser mais direto e explicar que você sente que poderiam incrementar alguns aspectos e que gostaria de falar sobre isso. Pedro, o marido que se tornou dono de casa, tinha um problema oposto ao de Juliana. Ele não era nada tímido, ao contrário, insistia de modo invasivo e grosseiro em instruir a esposa, Silvana, sobre as manobras sexuais que desejava. Também ele aprendeu a falar de modo mais sintonizado sobre o fato de que queria mais sexo e sobre as fantasias que queria realizar. Em vez de acusá-la, queixar-se e dar-lhe “aulas”, ele mudou o padrão.
Pedro, o fofo “Notei que nossa frequência sexual de seis meses para cá tem sido menor e tenho pensado em como será que você se sente na cama comigo. Também tenho pensado se eu posso ser sexualmente mais instigante para você e gostaria de lhe dizer que tenho algumas necessidades sexuais que adoraria que você soubesse.” Silvana lhe contou que estava satisfeita, mas que as expectativas altas dele a deixavam aflita. Depois disso, puderam conversar mais calmamente sobre as necessidades e fantasias de cada um. Se for tímido ou agressivo demais, achar o tom certo exige que você aos poucos experimente qual o melhor estilo para abordar o assunto. Se tiver dificuldade, um terapeuta pode ajudá-lo a superar constrangimentos e a desenvolver seu modo de abordar e conduzir a conversa. Mas não deixe de se comunicar sexualmente com seu parceiro. Muitos casais passam a vida sem fazê-lo e perdem muitas possibilidades de entendimento e sintonia.
Uma vez que você tenha conseguido abordar claramente a existência de problemas nas questões “técnicas” e na falta de sintonia, vocês terão outro desafio: vencer o constrangimento de conversar sobre como instruirão o parceiro sobre as maneiras que apreciam fazer sexo.
Ao conseguir falar sobre suas necessidades, cabe a você e a seu parceiro combinarem como seria mais confortável um instruir o outro sobre como fazer sexo. Por exemplo, sugerindo que durante o sexo irão mostrar ao parceiro como determinadas manobras podem agradá-lo mais. Uma vez havendo essa abertura, você pode, durante o próprio momento sexual, conduzir o corpo do parceiro e mostrar didática e amorosamente como gostaria que as coisas fossem feitas. Sem pressão de tempo e sem pressa de logo conseguir mudar tudo.
Se não estiver muito à vontade, tente começar pelo mais fácil, que é falar sobre o que dói ou incomoda e como é mais agradável ser tocado. Depois que tiver instalado uma abertura para esse tipo de comunicação, você pode tentar um passo a mais: alinhar as preferências sexuais, ou seja, pedir ao parceiro para realizar certas fantasias, bem como dizer a ele que você está disposto a tentar fazer o que o agrada.
Ainda que isso possa ser difícil, lembre-se que não há como sintonizar ritmos e experimentar fantasias sem comunicação! Do contrário, você e seu parceiro correm o risco de passar toda uma vida sem usufruir do potencial sexual de vocês. Já foi mencionado que uma boa cumplicidade sexual pode indenizar a perda do frisson sexual da juventude, substituindo o sexo apaixonado pelo recreativo e divertido — além de prolongar a vida erótica até a idade avançada!
Falemos agora sobre como você pode incrementar os quatro aspectos da vida sexual: química, habilidades, fantasias e ambiente.
I. Sobre a falta de química sexual Como já discutido no capítulo 4, a química sexual se refere à atração por aspectos como pigmentação, cheiro, motricidade, textura, tônus, trejeitos e características psicológicas, aspectos que, em geral, são inconscientes.
Mas os aspectos da química não existem isoladamente; eles se mesclam com a habilidade sexual e com as preferências erótico-sexuais. Por exemplo, o prazer no beijar está ligado a aspectos sensoriais muito arraigados e pessoais: se os lábios são carnudos, finos, úmidos ou secos; o cheiro e a textura das mucosas orais; mas também à habilidade de beijar e às preferências de tipo de beijo (bruto, delicado, curto, longo etc.).
Ainda assim podemos tentar por um momento separar as coisas. Se você tem um problema de química sexual com o parceiro, talvez ocorram alguns dos seguintes sinais:
1. Você só faz sexo com o parceiro por necessidade de manter as aparências, não por atração;
2. Só quando você ovula ou acumula testosterona sente um tesão inerente e, por falta de opção, faz sexo com o parceiro;
3. Você só sente atração em ocasiões em que se comove ou fica grato ao parceiro, ou quando você se droga ou bebe;
4. Também é possível que você até sinta uma atração, mas muito pouca (incomparável à intensidade que sentiu com a maioria dos outros parceiros);
5. Ou a falta de química é tão contundente que você sente ojeriza física, tem repulsa ou nojo por certos aspectos do parceiro.
Esses cinco sinais indicam uma falta de química de pele importante.
Em alguns poucos casos, é possível amenizar a ojeriza ou a falta de atração de pele. Por exemplo, quando ocorreram traumas. Tive uma paciente que, na infância, sofreu abuso de um dentista careca. Nesse caso, uma vez tratado o trauma, ela conseguiu superar sua ojeriza e repulsa a carecas. O que ela tinha era mais uma fobia do que falta de química.
Também há casos em que um dos parceiros tem valores estéticos fúteis ligados à inexperiência. Há pessoas que sentem nojo de certas características, como pelos ou secreções sexuais, porque ainda são sexualmente infantis.
Finalmente, há casos de idealizações estéticas ingênuas. Seu parceiro pode ter se fixado em características sexuais de ídolos de cinema ou fotos de modelos em revistas que dificilmente encontrará na vida real. Esses três tópicos podem, em tese, ser trabalhados.
Mas, em geral, a falta de química não muda. Está ligada a fatores como sua biologia ou a impressões arcaicas, já arraigadas. De toda forma, vale ao menos testar as possibilidades de alterar essas sensações. É muito difícil fazê-lo sem a ajuda de um terapeuta.
Se você tiver problemas desse tipo, tente separar o que é da química de pele e o que está ligado aos outros três aspectos (habilidade, preferências e ambiente).
Juliana confundia ojeriza à pele com ojeriza ao jeito Ao se queixar do beijo de André, na verdade Juliana descobriu que o problema era o modo como ele a beijava — achava o beijo demorado demais, a língua dele a invadia de modo incômodo, a ela parecia uma “limpeza dentária”, o beijo era demasiado molhado, ela sentia-se cuspida. São aspectos que André poderia mudar, diferentemente das queixas de Jayme, que achava os lábios de Catarina muito finos, não gostava do cheiro dela e achava o gosto do beijo desagradável. Um terapeuta pode ajudá-lo a localizar exatamente o que o incomoda: a pele (a textura, a pigmentação, os pelos), o cheiro do corpo, o hálito, o cheiro da genitália, o cabelo, os trejeitos, isto é, os gestos, o andar, as expressões, a entonação de voz, o modo de olhá-lo, a maneira de gozar e assim por diante. Às vezes pode ser difícil destrinchar os elementos em jogo. Alguns aspectos são muito sutis, mas se quiser trabalhar o assunto é preciso fazê-lo. Não misture o jeito de o parceiro fazer sexo (habilidades e preferências) com características fisiológicas e psicomotoras. Muitas vezes, superados entraves nas outras três dimensões, a repulsa diminui e você descobre que não tinha uma falta de química de pele, havia apenas uma dissintonia sexual.
Quando se trata de uma genuína falta na química entre vocês, não há muito o que fazer a respeito. Não se condene. Mesmo que seu parceiro seja uma pessoa adorável e perfeita em todos os outros itens da Equação, uma ojeriza ou pobreza na química sexual pode ser insuperável. Se realmente não gosta de sabores amargos, há limites para o quanto você poderá se forçar a gostar ou a ignorar o amargo. O mesmo em relação ao sexo.
Na melhor das hipóteses, você pode procurar enfatizar outras qualidades do parceiro ou pode melhorar as condições afrodisíacas (ambientes estimulantes, drogas excitantes etc.), mas isso só funcionará a curto e médio prazo. A longo prazo, só se o sexo não for importante no casamento de vocês.
Na verdade, são raros os casamentos em que desde o início houve uma verdadeira repulsa ao corpo do parceiro, que o sujeito ignorou e suprimiu, forçando-se a aceitá-lo sexualmente — como no caso de Jayme, que desenvolveu uma severa alergia no pênis às secreções vaginais de Catarina.
O habitual é que as pessoas tenham uma química “média” que se deteriora com o desgaste da relação. Nesse caso, se a química sexual entre você e seu parceiro não for ruim, considere que é muito comum que pessoas com as quais tenhamos uma experiência de química excepcional, e que sejam sexualmente muito habilidosas e sensuais, não sirvam como parceiros de vida.
Como discutido no capítulo 4, é raro encontrar alguém que, além de ser excepcionalmente sensual e sexualmente carismático, também atenda a todas as nossas outras necessidades em cada uma das dimensões da Equação do Casamento. Por isso algumas pessoas, mesmo encontrando parceiros sexuais incrivelmente estimulantes, muitas vezes optam por outros parceiros para se casar. Ainda que eles sejam menos interessantes sexualmente, podem ser mais confiáveis, melhores provedores, pais mais vocacionados, mais cultos ou mais equilibrados.
Não quero desestimulá-lo a procurar alguém que, além de ser sua alma gêmea, consiga satisfazer suas expectativas de química sexual inebriante, mas isso não é só uma questão de competência e persistência. É também uma questão de sorte — e não precisa ser o único padrão de felicidade sexual.
Para muitas pessoas, é possível estar sexualmente satisfeito sem estar com sua alma gêmea e sem uma química sexual mágica (embora uma química ruim costume inviabilizar a relação). Se a química for ao menos razoável, as pessoas podem ir se ajustando no aspecto sexual, tornando o convívio extremamente prazeroso na cama e fora dela, sobretudo se ajustarem as preferências eróticas e trabalharem na habilidade sexual e no ambiente erótico-sensual, temas dos próximos tópicos.
II. Ajustando as preferências eróticas O QUE FAZER COM OS IMPASSES NAS PREFERÊNCIAS ERÓTICAS?
Muitas vezes, mesmo casais que conversam abertamente e sem constrangimento chegam a certos impasses sexuais sobre o que cada um prefere sexualmente. Alguns dos conflitos comuns são gostar ou não de manter preliminares mais longas, diferenças sobre a frequência sexual desejada, sobre a duração do ato, sobre gostar ou não de sexo anal, oral, de sexo a três ou em grupo, de aceitar ou não fazer sexo fora de hora ou em lugares ousados. Também fazer ou não sexo em casa, ter sexo mais bruto ou mais carinhoso são temas comuns.
Sobretudo para os homens, as frustrações nas preferências sexuais costumam minar ao longo do tempo toda a relação matrimonial. Mulheres, embora decepcionadas, geralmente têm mais tolerância nesse quesito, e menos para frustrações com o ambiente erótico e com a falta de habilidade sexual do parceiro. Se você for mulher, não subestime a importância de ajustar essa dimensão com seu parceiro!
Diferente da química, das habilidades e do ambiente, no âmbito das preferências há algum espaço para negociação. E como em qualquer negociação, também no sexo é importante entender a magnitude da resistência (o quanto um parceiro não quer) e da necessidade (o quanto o outro quer).
Abordarei a seguir os limites dos pedidos e das resistências sexuais. Comecemos pelos pedidos.
Os pedidos sexuais No campo dos pedidos, considere três graus de intensidade:
1. Uma preferência sexual — por exemplo, vontade de fazer sexo no mar;
2. Uma necessidade sexual — sempre precisar de preliminares mais longas;
3. Uma obsessão sexual, ou fetiche — por exemplo, o caso de Alfredo: ficar profundamente infeliz e às vezes brochar se não puder se travestir de mulher durante o ato sexual.
Chamo aqui de “preferência sexual” algo que enriquece sua vida sexual, mas que, se for insuportável para seu parceiro, você pode abrir mão. Em geral, é algo ocasional, variado e lúdico.
Utilizo o termo “necessidade sexual” para descrever uma vontade cujo não atendimento tornaria sua vida sexual tão esvaziada que, sem ela, há uma redução significativa de seu prazer e interesse (mas não a ponto de inviabilizar a relação). As necessidades sexuais masculinas mais comuns se referem a práticas e modalidades de sexo; as femininas, em geral se referem ao estilo, ritmo e atmosfera erótica. Por exemplo: Pedro gostaria de fazer — com frequência — sexo a três e, na ausência disso, pensa muito no tema e sente uma grande falta. Ainda assim, diferente de outros pacientes que já tive, consegue ter prazer com Silvana, mesmo sem terceiros na cama, e aceita viver sem essa dimensão.
Já a “obsessão sexual” refere-se a de uma condição essencial para o funcionamento sexual. Dependendo da intensidade e estranheza que cause, pode ser percebida como problemática e inviabilizar a vida do casal. Mulheres não costumam ter fetiches ou obsessões sexuais, mas têm preferências e necessidades sexuais que podem variar conforme o parceiro e a fase. Obsessões sexuais são mais frequentes em homens. O que para a mulher pode ser uma fantasia excitante com um parceiro, pode não ser com outro. Muitos homens têm fetiches, não apenas fantasias eróticas. Fetiches são comportamentos estereotipados, repetitivos e condição para o gozo. Se, nesse sentido, você é fetichista, é possível que a atividade ou o objeto sexual passe a ser mais importante que o parceiro. Até certo ponto, pouco lhe importa quem é o parceiro; o importante é que ele tope realizar o fetiche.
Nem sempre essas fronteiras são tão nítidas, mas servem de baliza para entrar em conexão com o parceiro e consigo mesmo.
Se o que você sente é mais do que uma preferência, é uma necessidade sexual, vale a pena abordar esse tema com o parceiro. Se ele tiver total clareza da importância que isso tem para você, talvez se disponha a acolher sua demanda. Mas é comum que, mesmo que você chegue a falar claramente tudo, o parceiro do sexo oposto simplesmente não consiga perceber quão importante seria atendê-lo. Como Ricardo, que não percebia a importância que Penélope dava às preliminares — para ele, “meras implicâncias”.
Se você tiver mais que uma necessidade, tiver uma obsessão sexual e ela não for aceita, terá escolhas difíceis pela frente: viver muito abaixo de seu potencial de prazer ou separar-se (a não ser que seja uma opção viver o fetiche fora do casamento, de modo consentido ou não). Fetiches dificilmente mudam ou são “tratáveis”. Na melhor das hipóteses, o sujeito aprende a suportar não vivenciá-los.
Seja uma preferência sexual, uma necessidade ou uma obsessão, nem sempre o parceiro tem coragem ou desinibição de lhe revelar seus desejos, ou às vezes o menciona marginalmente, não expressando com clareza a importância que isso tem para ele. Talvez você tenda a ignorar ou não valorizar as discretas insinuações do parceiro. Às vezes, mesmo que tais pedidos sejam mais insistentes ou repetitivos, podem lhe parecer ser só caprichos que não precisam ser acolhidos. Não despreze eventuais preferências sexuais e eróticas, sobretudo necessidades do parceiro. Isso rebaixa de modo relevante a qualidade do prazer e o interesse, vai tornando o casamento chocho e abre espaço para experiências extraconjugais (que, de qualquer modo, são uma tentação para a maioria das pessoas).
Quanto às obsessões sexuais, muitas vezes é difícil lidar com elas. Talvez vocês tenham sorte e os fetiches de seu parceiro coincidam com suas preferências. Ou você pode não apreciar o fetiche, mas aceitar praticá-lo porque se sente compensado em outros aspectos da sexualidade e do casamento. Mas fetiches tendem a ser mais problemáticos porque não são tão ocasionais, e talvez sejam muito repetitivos, rígidos ou chocantes. Uma vez que tenha clareza sobre o grau de relevância dos pedidos sexuais do parceiro (e dos seus próprios), é importante saber lidar com eventuais resistências.
A resistência aos pedidos sexuais Se você reage de modo alérgico, intolerante e nem sequer aceita ouvir a demanda do parceiro, tente entender o que se passa com você. Talvez estejam em jogo:
1. Inibições sexuais — por exemplo, envergonhar-se e não deixar que o outro faça sexo oral;
2. Tabus — como, por exemplo, não fazer sexo a três por achar moralmente errado;
3. Repulsa fisiológica — algum tipo de nojo sensorial;
4. Egoísmo ou Alienação — você não percebe a importância que o outro confere à lingerie sensual ou a preliminares mais longas porque não são sua preferência.
Também nesse caso as fronteiras entre as intensidades não são tão nítidas.
Como já foi dito, homens têm mais dificuldade de abdicar de suas necessidades sexuais do que mulheres. Por isso, é comum que ela imagine que, se está abrindo mão de certas necessidades ou preferências, o marido também pode perfeitamente fazê-lo. Às vezes, ela acha que ele deve abdicar dos desejos dele em nome de não forçar a barra e ferir a etiqueta, ou simplesmente por respeito. Ela pode se indignar com a incompreensível insistência dele. Na verdade, muitas mulheres interpretam todas as fantasias masculinas como meras preferências sexuais e se irritam se eles insistem demais no tema.
Mais tarde, muitas dessas mulheres se mostram surpresas e chocadas por nunca terem se dado conta da frustração e do grau de importância que seus maridos conferiam a certas atividades sexuais. O mesmo acontece com os homens, que se sentiam incomodados com os comentários e as insistências femininas sobre o ambiente, o ritmo e a importância em sair da rotina doméstica, e, mais tarde, se espantam com a real relevância e intensidade dos pedidos de sua esposa. Não se davam conta de que eram necessidades sexuais femininas.
Se perceber que está diante de uma preferência e sobretudo de uma necessidade ou obsessão sexual do parceiro, verifique até que ponto você quer e consegue superar suas resistências.
1. Explorando os limites de suas inibições sexuais
Se seu parceiro sugerir algo diferente e você sentir vergonha ou que é “demais” para você, talvez esteja diante de uma inibição. Ficar nu, adotar certas posições sexuais, tocar e ser tocado em certas partes do corpo, ultrapassar certo nível de intimidade, ser objeto de um olhar que o desnuda ou ser intensamente desejado pode inibi-lo. Há mulheres que não toleram que o marido faça sexo oral, por medo de que ele não goste do cheiro da vagina, ou sentem-se invadidas e desnudadas na intimidade, ou ficam aflitas pela intensidade do contato da boca e língua dele na genitália dela. Há homens que não toleram uma mulher com muita volúpia e iniciativa, entram em ansiedade de desempenho, chegando a ficar impotentes.
Se for de seu interesse explorar seus limites, um modo de tentar superar as suas inibições é ir aos poucos, tentar se acostumar por aproximação paulatina. Há diversos manuais e livros de autoajuda sobre esse tema. Se não puder discutir isso abertamente com seu parceiro, busque ajuda terapêutica. Existem inibições superficiais mais fáceis de superar, há diversas técnicas eficazes em psicoterapia, que trabalham com os princípios da aproximação gradual e da eliminação da ansiedade por desempenho.
Eliminar a obrigação de desempenho é importante, pois ela o livra de ter de cumprir uma meta sexual que o deixa tenso: não obrigar-se a ter uma ereção, não ter de penetrar, não ter de chegar a um orgasmo, não precisar ficar com a vagina umedecida. As metas de desempenho são substituídas pela atividade lúdica de explorar e conhecer melhor o corpo e as reações.
Mas há inibições mais complexas, que se enraízam em experiências psicológicas mais profundas — traumas, repressões. Por exemplo, se você não aguenta ser olhado com desejo e precisa fazer sexo no escuro, quem sabe tenha questões sérias de autoestima, uma história traumática na infância ou adolescência, ou tenha tido uma mãe cheia de tabus. Às vezes a superação de inibições não dispensa um trabalho terapêutico mais profundo. Mas mesmo inibições enraizadas em experiências traumáticas muitas vezes são superáveis.
Fantasmas do passado No caso de Juliana, algumas de suas inibições estavam enraizadas em experiências negativas com o olhar que seu padrasto lhe lançava quando era pequena e com uma primeira experiência negativa de sexo oral com o namorado de escola. Também havia questões quanto à aceitação da própria feminilidade. Apesar de conseguir se soltar em diversos aspectos sexuais, nem todas as inibições puderam ser superadas, como sua aflição com sexo oral. Essa questão também se ligava à sensação de desconforto com excesso de intimidade, aflição com questões de higiene, traumas infantis com manuseio de sua genitália e aparentemente a uma hipersensibilidade do clitóris. Mas além dos entraves psicológicos existe também o gosto de cada um, e talvez Juliana simplesmente não gostasse desse tipo de carícia. 2. Testando os limites de seus tabus e preconceitos
Há diversas inibições que se mesclam a tabus. Se seu parceiro gostar muito de fazer sexo a três e você sentir vergonha, é uma reação de inibição. Talvez você sinta também indignação moral, e nesse caso trata-se de preconceitos ou tabus que foram ativados — os desejos do parceiro, por exemplo, evocam fantasmas de uma homossexualidade que você condena ou teme.
O termo tabu, na acepção que estou usando aqui, refere-se ao “certo e errado” para você. Mas, desde os anos 1960, nosso discurso cultural vigente tem sido de que tudo que seja consensual e não afete a integridade física e a saúde deveria ser permitido! Nesse sentido, no casamento paritário atual você poderia sentir-se inibido, mas não precisaria ficar moralmente indignado. Como Letícia, que ao lidar com as obsessões sexuais de Alfredo, foi percebendo que nas relações atuais nada é proibido, tudo pode ser negociado e eventualmente aceito. Claro que mesmo que não tenha nem inibições nem tabus, você pode simplesmente não gostar de determinadas fantasias, mas deixemos a questão do gosto para mais adiante. Falemos ainda um pouco de tabus e preconceitos.
Bons costumes Letícia precisou rever suas inibições e tabus ao se confrontar com o fato de que Alfredo precisava praticar sexo travestido de mulher e queria ser penetrado por ela utilizando um consolo. Isso não era do gosto de Letícia, não lhe dava prazer nem era uma fantasia que a excitava, mas não havia por que ficar moralmente indignada e condenar eticamente o marido. Ao parar de condená-lo por isso e se debruçar sobre suas próprias inibições, nojos fisiológicos e sobre o quanto estava (ou não) sendo egoísta, ela pôde adquirir segurança a respeito de até onde podia ir e sobre o que simplesmente não lhe dava prazer. No final, concluiu que podia fazê-lo ocasionalmente. Mas ao longo da terapia de casal ficou claro para ela que essa fantasia tão vital para Alfredo se ligava a uma moderada transexualidade do marido. Durante um tempo isso a deixou insegura sobre ser desejada ou ser uma mera figurante no cenário sexual que ele fantasiava. Talvez você precise rever profundamente seus valores. Diversos casais conseguem avançar na sintonia sexual quando se despem de seus preconceitos moralistas. Experimentando a partir de exercícios mentais de visualização, assistindo a filmes ou conversando abertamente com pessoas que adotam tais práticas sexuais, você talvez se abra para considerar mais seriamente as demandas de seu parceiro. Alguns dos seus valores talvez sejam imutáveis, outros às vezes mudem surpreendentemente. Algumas pessoas bebem ou se drogam para se soltar e passar por novas experiências, mas se você se abrir para o novo, poderá experimentar avançar além dos seus horizontes sexuais habituais sem ter de se dopar.
3. Testando os limites da repulsa fisiológica e do nojo sensorial
Mas, além de ser um tabu, talvez a demanda de seu parceiro provoque uma repulsa fisiológica. Digamos que você seja mulher e além do nojo moral de praticar sexo oral no marido, sinta um nojo fisiológico do cheiro do sêmen ou nojo fisiológico de fazer sexo anal e lidar com as misturas de cheiros e secreções. Se você for homem, talvez tenha nojo do suor ou dos pelos púbicos da esposa.
O nojo é em parte genético, em parte aprendido. Na infância e adolescência, vinculamos certos cheiros, texturas, sensações táteis e aparências a algo agradável ou desagradável, e isso tende a ser impresso de modo bastante intenso em nossa memória sensorial, estética e afetiva. Existe plasticidade nessas memórias, mas não é fácil mudá-las. É possível que de fato determinada atividade sexual ou situação erótica lhe cause uma genuína repulsa fisiológica.
Em geral, repulsas fisiológicas só podem ser mudadas com ajuda profissional e, ainda assim, pode não funcionar. Uma vez tendo a repulsa fisiológica, a sua tendência será não de buscar ajuda para superá-la, mas de persuadir o parceiro a abdicar do desejo dele! Isso nos leva à questão de seu eventual egoísmo e até onde você deveria, em nome da parceria e cumplicidade, se forçar a tentar vencer suas resistências a atender a demandas que sejam realmente importantes para o parceiro.
4. Flexibilizando seu egoísmo ou alienação (uma questão de ética sexual)
Você não é obrigado a se aviltar e a fazer o que não quer ou não pode, mas isso é diferente de ser egoísta ou leviano. Inibições talvez possam ser superadas; o mesmo vale para tabus. Repulsas fisiológicas, mais raramente. Mas a recusa em se esforçar para tentar algo diferente pode se dever ao fato de você não ter percebido a importância que isso tem para seu parceiro. Você pode estar alienado, achando ingenuamente que se trata de mera preferência onde talvez haja necessidades ou obsessões sexuais.
Nem pedindo por favor Penélope precisa de preliminares mais prolongadas, mas, apesar de pedir sempre para Ricardo, ele não a atende. Assim como, por preguiça, Penélope não masturba Ricardo como ele solicita. Ignoram mutuamente as preferências e necessidades sexuais um do outro, empobrecendo o potencial erótico. Embora isso seja mais um tema para as eternas brigas entre eles, os dois têm uma vida sexual satisfatória porque sentem boa química e forte desejo, além de boa habilidade sexual e facilidade de se sintonizarem. Se seu desejo sexual for apenas um capricho, mas provocar em seu parceiro profundo incômodo, é fácil perceber quem deveria ceder. Mais difícil é decidir o que fazer quando há empate entre o profundo desejo de um (ou seja, uma necessidade ou uma obsessão sexual) e a resistência intensa do outro.
Alguns casais só se motivam a superar as resistências e a tocar nesses temas a partir de uma situação de dificuldades sexuais que ameaça o próprio casamento. Às vezes, pode ser tarde demais. Por isso o ideal é manter desde o início uma ética sexual e um canal aberto e amoroso sobre pedidos e resistências.
III. Melhorando sua habilidade sexual No capítulo 4, discutimos que a maioria dos homens até os quarenta anos depende menos da habilidade sexual feminina para se satisfazer. Para eles, as preferências erótico-sexuais e a excitação da parceira podem ser mais importantes. Já para as mulheres, desde sempre a habilidade sexual masculina costuma ser importante para a satisfação sexual.
Ambos os gêneros se beneficiam de parceiros com habilidade sexual. Portanto, certa educação sexual de gênero pode ser necessária. As questões “técnicas” ligadas a inabilidades e desajustes de ritmos são relativamente simples de aprender. Experiência com os modos de manobrar (velocidade, intensidade, profundidade, pressão, ângulos etc.) estão ao alcance das pessoas que desejam progredir nesse quesito.
Sobre as diferenças sexuais de gênero, pode valer a pena buscar apoio em livros ou em especialistas em sexualidade. Há também o recurso de buscar conhecimento sobre como realizar certas manobras sexuais e como agradar o sexo oposto em cursos, sites ou com terapeutas sexuais que podem ajudá-lo a encontrar alguns atalhos. Mas seu parceiro pode não corresponder aos estereótipos de homem e de mulher, por isso é preciso aprender a observar e a experimentar.
Em certos casos, paradoxalmente, experiências extraconjugais podem incrementar a qualidade da vida sexual, pois o parceiro “infiel” às vezes se desinibe, aprende muito com o amante e, ao retomar a relação, traz novos estilos e modos de lidar com sexo. Em nossa cultura, essa certamente não é uma maneira recomendável de incrementar sua vida sexual. De forma geral, é melhor não enveredar por esse caminho. Se perceber que não estão conseguindo se entender pela comunicação não verbal, e se aprender mais sobre técnicas sexuais não estiver funcionando, provavelmente será melhor se preparar para conversarem sobre a vida sexual de vocês.
IV. Trabalhando na construção de um
ambiente erótico-sensual Já sabemos que tudo no projeto de casamento conspira contra o erotismo: hábito, rotina, previsibilidade, filhos, envelhecimento, conflitos, frustrações, monogamia e ambiente doméstico.
Mulheres se queixam de homens monótonos, pouco criativos, pouco românticos, afeitos à rotina e que só se empenham romanticamente na iminência de levá-las para cama. Homens se queixam de mulheres que são pouco sexy, que se comportam como matronas cobradoras, obsessivamente concentradas na manutenção doméstica, que não sabem se divertir.
Nem todas as pessoas são sensuais por natureza; algumas são menos vitalizadas, mais acomodadas, menos criativas, gostam da rotina caseira. A outras falta autoestima, autoconfiança ou têm pouco desejo e necessidade de sexo. Muitas estão cansadas ou estressadas.
Se você e seu parceiro não estiverem desgastados por conflitos matrimoniais relevantes (dentro ou fora da esfera sexual) e se não estiverem enfrentando problemas externos graves, você pode conseguir bons avanços no ambiente erótico-sensual. Claro que há limites na sensualidade de cada um, e muitas vezes o desgaste do cotidiano não pode ser removido. Ainda assim, como sugiro a seguir, simples iniciativas e mudanças de hábito podem ajudar. Mas, antes disso, algumas palavras sobre conflitos matrimoniais e sobrecarga de trabalho.
Ressentimentos e conflitos Algumas pessoas têm dificuldade de se empenhar sexualmente por estarem ainda ressentidas com antigas mágoas. Se você de fato quer incrementar o relacionamento, reveja seu lado emburrado, ressentido e justiceiro. O capítulo 8, sobre como explorar e desativar botões vermelhos, pode lhe ser útil. Também o capítulo 13, sobre o resgate do casamento. Para trabalhar na melhora do ambiente erótico, é preciso que você esteja genuinamente disposto a investir na relação.
Sobrecargas de obrigações Às vezes, em determinado momento, é impossível se dedicar a cultivar o romance e o prazer. Homens tendem a alegar a sobrecarga de tarefas e estresse do trabalho; mulheres incluem nessa lista também as zeladorias domésticas e os filhos. Tente, por dois ou três meses, avaliar realisticamente se isso é mesmo provisório ou se é uma situação mais prolongada.
Se for algo que irá demorar, considere que mais de quatro meses, em geral, é um período excessivamente longo para o sistema nervoso lidar com o estresse. Portanto, sobrecargas assim não deveriam ser tratadas como se fossem algo “só por mais um tempinho”.
Talvez você tenha estruturado sua vida em função de projetos de longo prazo, que lhe exigem um fôlego intenso que só se suporta por um curto prazo. E talvez seu parceiro não aguente.
Talvez você precise recalibrar o ritmo, pois se a atmosfera sensual de seu casamento estiver destroçada e a vida de casal tiver se transformado em uma maratona forçada, na qual tudo se submete ao tour de force profissional ou a cuidar de filhos, é possível que seu parceiro não resista e comece a se distanciar de você. Muitos casamentos acabam por essa via.
Na iminência de perder o parceiro, mesmo os mais viciados em trabalho (em geral homens) podem começar a enxergar o descaso com que estavam tratando a relação.
POR ONDE COMEÇAR?
Se você por anos ficou sem cultivar a dimensão erótica, talvez se sinta inibido para iniciar a mudança. Tem medo que seu parceiro estranhe, o ache bobo ou desajeitado. Você teme ser rejeitado e se decepcionar com as respostas desanimadoras dele.
No caso de Rogério, cuja esposa Marcela se queixava da mesmice e da indiferença do marido, havia uma dificuldade em começar a mudar as coisas. Sobretudo porque ele era tímido e tinha pouco traquejo social. Mas a não ser que você faça algo bizarro, exagerado, vai descobrir que pequenas melhorias e ousadias no grau de atenção e investimento no ambiente erótico tendem a agradar. E ainda que seu parceiro se espante com essas mudanças ou zombe um pouco delas, nada impede que você lhe explique que, mesmo que ele ache estranho, você agiu assim simplesmente porque sentiu vontade de fazer algo diferente.
Trocar o pijamão pela sunga? Durante dez anos, Rogério e Marcela falaram de problemas domésticos e viviam entre irritados e ocupados, mal se lembrando de que eram também homem e mulher. Ele não se cuidava fisicamente, não se arrumava para ela e não cultivava nenhuma dimensão sensual. Ela, aos poucos, foi se transformando numa “Rogéria”, sem empenho algum em cultivar o prazer a dois. Até mesmo quando queria sexo, Rogério era incapaz de criar um clima. Deitado na cama, roçava desajeitadamente com o dedão do pé a nádega da esposa.
Ao se dar conta de que Marcela não suportava mais essa tumba matrimonial e que cabia sobretudo a ele mudar, Rogério não fazia ideia de como começar. Poderia ser realmente estranho ele passar a recebê-la no quarto de sunga sensual e levá-la nos braços à banheira cheia de espuma. Antes de tudo, ele se achava gordo e peludo demais para usar roupas mais sensuais. Também achava que seria esquisito enviar mensagens de texto eróticos durante o dia, ou elogiá-la e agradá-la de forma mais galante, trazendo-lhe uma lembrancinha. Também convidá-la semanalmente para um jantar em um restaurante romântico seria excêntrico (e caro).
Ele decidiu então que poderia, uma vez por semana, comprar queijos e um bom vinho para apreciarem em casa, e sugerir que jantassem com a mesa bem-posta. Empenhou-se em mudar o padrão de conversa habitual e contar de modo mais interessante algo pitoresco que ocorrera no seu dia, perguntar sobre o dela e evitar falar de cortes de despesas domésticas. Também conseguiu comprar um pijama mais elegante e, em vez de sinalizar que queria sexo roçando o dedão nas nádegas, passou a beijá-la no pescoço. No dia a dia, passou a se comunicar mais com ela, compartilhando algo que leu ou dizendo que se lembrou dela ao ver ou ouvir tal coisa. Passou também a elogiar mais os aspectos femininos dela e tentou ser mais cavalheiro. Não se transformou num fulgurante amante latino, mas sua esposa notou a diferença, e a vida sexual do casal se reacendeu.
No início, Marcela zombava dele, alegava que ele estava cumprindo ordens do terapeuta. Ele aprendeu logo a não se constranger com isso e a seguir em frente. Ela estava claramente apreciando e aceitando as mudanças. Durante alguns anos a vida sexual foi retomada e mais tarde, quando se separaram, essas aquisições de conexão sensual serviram a Rogério para novos relacionamentos. Se na sua Equação do Casamento o ambiente erótico-sensual for pobre, mas os outros fatores estiverem razoavelmente satisfatórios, há ao menos algumas coisas que você pode introduzir no seu dia a dia para beneficiar a atmosfera geral.
Há cônjuges que, em diferentes momentos, praticam gestos que adoçam o convívio: pequenas “provocações eróticas” (elogios eróticos, manifestações de atração, toques), manifestações de desejo e algumas surpresas, como surpreender o outro com pequenas lembrancinhas, flores, doces, sugestões de programas inesperados.
O mesmo pode ocorrer com a agenda semanal. Alguns incluem uma “noite do casal”, na qual farão algo de que gostem, como ir ao cinema, jantar, frequentar o teatro ou fazer sexo. Esse momento da semana fica como um espaço sagrado em que celulares, filhos, familiares, trabalho, amigos etc. não terão espaço — a não ser que filhos ou amigos sejam o programa que o casal queira genuinamente fazer. Outros criam no mês um espaço tal como um fim de semana só do casal. No semestre ou no ano, pode-se também abrir um espaço de semanas para ficar junto fazendo coisas de que gostam e tendo o prazer do convívio de um com o outro.
Para que essas atividades não sejam protocolares, é preciso que cada um mostre estar interessado, que haja alguma intensidade nessas demonstrações, que está conectado com o parceiro. Pouco ajudará ter esses momentos especiais e, em seguida, voltar à rotina massacrante. Você anulará todo o efeito dessas ocasiões mensais e semestrais se não mantiver o compromisso. Portanto, trata-se de mudar profundamente de atitude. De entender que cultivar a relação é dedicar-se a ela. E que isso custa empenho, tempo, dinheiro, boa vontade, paciência — e que pode ser muito gratificante. Relações de grande amizade, atração pelo charme, gratidão, sintonia, são benesses na vida, mas não acontecem de graça ou por magia.
Se tiver pouco tempo para tanto investimento no ambiente sensual e tiver de optar, prefira os pequenos momentos diários e semanais aos grandes gestos mensais e semestrais. É ótimo viajar a dois, reeditar uma lua de mel, mas é o cotidiano que sustenta a vida real. De pouco adianta vez por outra ter grandes gestos românticos de “reconexão” para posteriormente voltar à mesmice do cotidiano.
Mas não há receitas prontas. Há muitos modos de entrar em conexão com o outro, de mostrar interesse e entrar em sintonia. Se você se empenhar, encontrará seu estilo.
Uma palavra final Como foi discutido ao longo de todo o livro, no casamento atual temos elevadas ambições de fruição e prazer. Em parte é preciso diminuí-las, “cair na real” e cobrar menos do parceiro, da vida e de si mesmo. Mas essas ambições de fruição fazem parte de nossa mentalidade atual. Por isso, neste e no capítulo anterior, sugeri modos de tentar atender às expectativas mais diretamente ligadas à vibração de estar junto com seu parceiro. Espero que tenha ficado claro que — moderadamente — podemos incrementar esses aspectos, desde que não se transforme num ônus de “ser feliz e gozar” a todo custo.
(Luiz Hanns - A Equação do Casamento, O que pode (ou não) ser mudado na sua relação)